Lula critica Campos Neto e diz que presidente do BC “não entende nada de país”

Presidente diz que não há explicação para Selic a 13,75% e diz que BC está "cuidando pouco" de suas outras responsabilidades

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é entrevistado por Marcos Uchoa no programa Conversa com o Presidente, no Palácio do Alvorada, em Brasília (DF), em 27 de junho de 2023 (Imagem: TV Brasil)

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Mesmo após o tom mais ameno do Comitê de Política Monetária (Copom) na ata da última reunião e o aceno para um possível corte na taxa básica de juros (a Selic) em agosto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a fazer críticas contundentes ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e sua postura à frente da autarquia.

Em entrevista concedida à Rádio Gaúcha na manhã desta quinta-feira (29), Lula disse não haver motivo para a Selic continuar a 13,75% ao ano e disse que o Banco Central “está cuidando pouco” dos compromissos que vão além do combate à inflação ‒ como observar o nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego, conforme prevê a lei complementar que conferiu autonomia à instituição.

“O Senado, quando aprovou a autonomia do Banco Central, estabeleceu alguns critérios para que o Banco Central seja autônomo. Um deles é cuidar da inflação. Outro é cuidar do crescimento e cuidar do emprego. Ele, até agora, tem cuidado pouco, porque ele estabeleceu uma meta que, pelo fato de não atingir, ele aumentou o juro de forma exagerada”, disse.

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“Não existe hoje nenhuma explicação ‒ econômica, sociológica, filosófica, o que você quiser pensar ‒ para que a taxa de juros esteja a 13,75%, porque nós não temos inflação de demanda. Aumentava-se os juros quando havia uma demanda crescendo e precisava reduzi-la”, prosseguiu.

Durante a entrevista, Lula disse que “não há um setor da economia, a não ser o setor financeiro” que apoie a política monetária que vem sendo conduzida pelo Banco Central sob a gestão de Campos Neto ‒ a quem o presidente mais uma vez se referiu como “esse cidadão”.

“Todo mundo contra esse absurdo da taxa de juros, que ninguém pode captar dinheiro para investir a 14%, 15%, 16% de juros. As pessoas vão quebrar”, afirmou.

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“É preciso reduzir a taxa de juros para que ela fique compatível, inclusive, com a inflação. A inflação em 12 meses está menos que 5%, porque a taxa de juros tem que estar nesse nível? Qual é a explicação? Não existe explicação”, pontuou.

“Lembro que o Fernando Henrique Cardoso tirou dois ou três presidentes do Banco Central. Outros presidentes tiravam. Agora você tem um cidadão, que me parece que não entende absolutamente nada de país, nada de povo, não tem sentimento com o sofrimento do povo, e mantém uma taxa de juros para atender os interesses de quem? A quem esse cidadão está servindo neste momento?”, questionou.

Na conversa, Lula disse “pouco se importar” se o Banco Central é autônomo, desde que, na sua avaliação, “funcione”. “Esse cidadão vai ter que pensar e o Senado vai ter que saber como lida com ele”, disse.

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Confrontado pelo fato de Henrique Meirelles, que presidiu o Banco Central durante seus mandatos anteriores, concordar com a postura adotada por Campos Neto até aqui, ele rebateu: “Meirelles diz o que quiser, ele é livre. Ele tem 70 anos de idade, pode dizer e achar o que quiser. No tempo em que ele era meu ministro, ele sabe qual era a discussão que fazíamos. Ele sabe que, cada vez que aumentava 0,5% da taxa de juros, eu abaixava 0,5% na TJLP para que o BNDES tivesse dinheiro para investir no setor produtivo. E ele sabe que, quando pegamos o governo, a taxa de juros estava em 26%. Nós reduzimos a 10%, com a economia crescendo a 7,5% em 2010 e o varejo crescendo acima de 13%”.

Lula também disse que voltará a utilizar bancos públicos, como a Caixa Econômica Federal, o BNB e o Banco do Brasil para impulsionar investimentos públicos. “O dinheiro tem que circular para a economia crescer. Você não pode dizer que é um país capitalista sem capital. O capital circulando na mão de meia dúzia de pessoas. O dinheiro tem que funcionar e girar na mão de muitos milhões de brasileiros para que a economia possa crescer. É isso que esse cidadão do Banco Central tem que entender. O dinheiro tem que circular, e para o dinheiro circular o juro tem que ser baixo”, disse.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.