Lula defende expansão do BRICS com critérios e moeda comum para comércio exterior

Em live semanal, presidente diz que grupo de países pode ajudar a mudar sistema internacional e reduzir dependência global ao dólar

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é entrevistado por Marcos Uchoa no programa Conversa com o Presidente, no Palácio do Alvorada, em Brasília (DF), em 27 de junho de 2023 (Imagem: TV Brasil)

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu, nesta terça-feira (22), que o BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) não deve ser um “clube fechado” e admita novos países membros, desde que com regras claras.

Em mais uma edição da sua live semanal “Conversa com o Presidente”, transmitida pelo YouTube e pelas redes sociais, Lula disse que o grupo de países têm demonstrado sua importância política e econômica para o mundo e defendeu que ele seja vetor para mudanças em estruturas e instituições da geopolítica atual.

“Os BRICS começam a se colocar como uma coisa muito importante no planeta. As pessoas começam a perceber que os BRICS não são pouca coisa. A junção de África do Sul, Brasil, Índia e China são metade da população mundial. São economias grandes que estão crescendo e podem crescer muito mais e que querem criar instituições democráticas”, destacou.

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Segundo o presidente, atualmente todos os países que integram o BRICS concordam com o ingresso de novos membros, mas ele defendeu que critérios sejam estabelecidos para evitar que futuramente seja admitido um país que depois se mostre contra o grupo.

“Os BRICS não podem ser um clube fechado. O G7 é um clube fechado. Mesmo quando o Brasil chegou à sexta economia do mundo, ainda era convidado, e não participante. O G7 é o clube dos ricos, em que a Rússia entrava por causa das armas nucleares que tinha, não pelo dinheiro. Nós não queremos isso. Queremos criar uma instituição multilateral e que possamos ter algo diferente”, disse.

“Para possibilitar a entrada de novos países, a gente tem que limitar certa coisa que todo mundo concorde. Se não tiver um grau de compromisso dos países que entram nos BRICS, vira uma torre de babel. Estamos construindo isso. Penso que deste encontro deve sair uma coisa muito importante sobre a entrada de novos países”, pontuou.

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Nos bastidores há uma preocupação de integrantes do BRICS de que a entrada de outras economias emergentes dilua o peso dos fundadores, além de aumentar o risco de o bloco se tornar uma espécie de zona de influência da China em meio à disputa geopolítica e comercial com os Estados Unidos.

Lula, porém, defendeu novamente a possibilidade de a Argentina fazer parte do grupo ‒ caminho que se tornou mais nebuloso com o bom desempenho do candidato libertário Javier Milei nas eleições primárias para a presidência do país-vizinho. Durante a campanha, Milei tem defendido o fim do Banco Central argentino, a dolarização da economia local, a saída do Mercosul e hostilizado a China.

Durante o programa transmitido pelas redes sociais, desta vez de Johanesburgo, na África do Sul, onde é realizada a 15ª cúpula do BRICS, Lula negou que o BRICS tenha o objetivo de fazer um contraponto a estruturas como o G7, o G20 ou mesmo aos Estados Unidos.

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“A gente quer se organizar. A gente quer criar uma coisa que nunca existiu: o sul global. Nós sempre fomos tratados como se fôssemos a parte pobre do planeta, como se não existíssemos. Nós sempre fomos tratados como se fôssemos de segunda categoria. De repente, estamos percebendo que podemos nos transformar em países importantes. E todos esses países são importantes”, afirmou.

“Estamos apenas dizendo: nós existimos, estamos nos organizando e queremos sentar numa mesa de negociação em igualdade de condições com a União Europeia, com os Estados Unidos e com todo país. O que queremos é criar novos mecanismos que tornem o mundo mais igual, do ponto de vista das decisões políticas”, prosseguiu.

“Os BRICS não significam tirar nada de ninguém. Significam uma organização de um polo muito forte que congrega muita gente”, defendeu. “Nós podemos fazer com que se mudem os costumes e hábitos políticos que até agora prevaleceram na conjuntura internacional”.

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No programa, Lula voltou a defender uma reforma no funcionamento de instituições multilaterais, especialmente a Organização das Nações Unidas (ONU), com o ingresso de novos membros com status permanente no Conselho de Segurança e o fim do direito ao veto a um país no colegiado.

“Hoje a ONU tem pouca representatividade. Ela não consegue cumprir quase que nenhuma tarefa. Hoje, o Conselho de Segurança não decide mais nada, porque existe o direito de veto e os membros do Conselho de Segurança fazem o que querem”, argumentou.

“Nós precisamos utilizar a ONU para tentar encontrar paz no mundo. A ONU precisa ser muito forte. Se a ONU não tiver poder de governança, a gente não resolve a questão climática”, salientou.

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“Se nós, que somos democratas e acreditamos na democracia como o melhor modelo de governança, precisamos garantir que tenhamos instituições fortes para garantir, inclusive, essa democracia”, pontuou o presidente, que alertou para a emergência de grupos extremistas e antidemocráticos mundo afora.

Do lado econômico, Lula defendeu o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, da sigla em inglês), conhecido como “banco do BRICS” ‒ instituição atualmente chefiada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Segundo ele, a ideia é que ele funcione sob uma lógica completamente distinta à do Fundo Monetário Internacional (FMI) na concessão de empréstimos.

“Eu sou favorável à entrada de vários países. E a gente vai se tornar forte, a gente quer criar um banco muito forte, que seja maior que o FMI, mas que tenha outro critério de emprestar dinheiro para os países. Não de sufocar, mas de emprestar na perspectiva de que o país vai criar condições de investir o dinheiro, se desenvolver e pagar, sem que o pagamento atrofie as finanças”, comparou.

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O presidente brasileiro também advogou pela criação de uma moeda comum para comércio exterior entre os países integrantes do BRICS, de modo a reduzir a dependência em relação ao dólar. “Por que eu faço negócio com a China e preciso de dólar? O Brasil e a China têm tamanho suficiente para fazer negócios nas suas moedas ou em outra unidade de conta, sem desvalorizar a nossa moeda e sem negar – ela continua existindo. Mas a gente cria uma moeda de comércio exterior”, sugeriu.

“O que é importante é que a gente não pode depender de um único país que tem o dólar, e nós somos obrigados a ficar vivendo da flutuação desta moeda. Não é correto”, disse.

Lula disse, no entanto, que o uso de outra moeda para transações comerciais não seria “negar o dólar”, nem desvalorizar divisas locais. “O dólar vai continuar com o valor que ele tem, sendo moeda importante”, ponderou.

Entre os possíveis beneficiários do novo sistema, o presidente citou a Argentina, que tem enfrentado dificuldades em obter dólares.

“Há países, como a Argentina, que não podem comprar dólar agora, estão em uma situação muito difícil, porque não têm dólar. Ora, para vender para o Brasil, não deveria precisar de dólar. Vamos trocar nossas moedas, e os Bancos Centrais fazem os acertos no final do mês”, sugeriu.

Segundo Lula, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), estaria em tratativas com Buenos Aires para o uso da moeda chinesa, o yuan, como instrumento para trocas comerciais entre Brasil e Argentina.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.