Julgamento de ações no STF deve influenciar debate sobre PL das Fake News e manter alta tensão entre governo e big techs

Recursos a serem analisados tratam da responsabilização das plataformas por conteúdo publicado por terceiros no ambiente virtual

Luís Filipe Pereira

(Adrian Ace Williams/Archive Photos/Getty Images)

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No momento em que o debate sobre a proposta de regulação de conteúdo publicado na internet prevista no  PL 2630/2020 (PL das Fake News) tem causado disputas entre governo brasileiro e big techs, o julgamento de duas ações relacionadas ao Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) no Supremo Tribunal Federal (STF), na quarta-feira (17), deve movimentar os bastidores do Congresso Nacional e pautar novas discussões sobre o tema.

Uma das ações em que será analisada a constitucionalidade de pontos da legislação atual é um recurso de relatoria do ministro Luiz Fux, sobre a responsabilização de empresas que hospedam conteúdo no ambiente virtual. O caso chegou ao Supremo depois que uma professora de Minas Gerais entrou na justiça contra o Google para reivindicar que fosse retirada do ar uma comunidade virtual, vinculada a uma rede social, criada contra ela há mais de dez anos.

Em outro processo, cuja relatoria é de responsabilidade do ministro Dias Toffoli, os ministros vão analisar a necessidade de ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedores de internet e redes sociais por crimes cometidos por terceiros no ambiente virtual.

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Entre advogados, há um consenso de que o entendimento a ser proferido pela Corte sobre o dever das empresas de tecnologia de fiscalizar conteúdo ofensivo publicado por terceiros, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário, poderá pautar decisões envolvendo temas similares no futuro. Desta forma, a repercussão de tais ações pode impactar no modelo de negócios vigente.

Especialistas ouvidos pelo InfoMoney acreditam que, em ambos os casos, a decisão do STF deverá influenciar o debate no âmbito da regulação de conteúdo na internet e responsabilização das empresas por publicações ofensivas feitas por usuários ou anunciantes, um dos pontos fundamentais do PL das Fake News, em tramitação na Câmara dos Deputados.

Leia também: PL das Fake News: o que está em jogo com o polêmico projeto em discussão no Congresso?

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Para Pedro Iorio, especialista em Proteção de Dados, do Artese Advogados, apesar de haver pontos próximos entre as matérias pautadas pela Suprema Corte, o foco das discussões não é necessariamente o mesmo, e o STF não estará, em tese, julgando a propagação sistemática de desinformação.

“São conflitos que, ainda que possam ter alguma repercussão pública, têm o fundo e seus principais danos centrados na esfera particular. É importante notar que essa dinâmica, pautada no contexto de interação de indivíduos por meio de aplicações de internet, é a que balizou os debates do Marco Civil da Internet e que guiaram a opção legislativa pela atual redação do artigo 19”, afirmou.

Considerado um dos alicerces da Lei nº 12.965/2014 e criticado por especialistas por um possível anacronismo na comparação com o momento atual, esse trecho citado por Iorio aponta que: “Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário”.

Para João Victor Archegas, pesquisador sênior do ITS Rio, o julgamento vai indicar as possíveis interpretações à luz da Constituição, excluindo outras linhas de raciocínio pelo ordenamento jurídico. Na avaliação do especialista, que destaca a proteção concedida à inovação e à liberdade por este ponto da legislação, uma eventual decisão de tornar inconstitucional o artigo 19 poderia poderia implicar em um “incentivo nefasto de remoção em massa de conteúdos que são problemáticos ou que não geram consenso”.

“O artigo 19 protege e liberdade de expressão e foi desenhado para essa finalidade específica. Isso não significa que ele resolva todos os problemas e as distorções que a gente tem enfrentado na internet. Não resolve. A gente precisa atualizar essa moldura regulatória. O artigo 19 deve ser o ponto de partida, e a gente deve pensar em outros instrumentos, como é o caso dos relatórios de transparência e da análise de riscos sistêmicos que estão sendo estruturados no PL 2630”, destacou.

Na esfera política, a tendência é que o julgamento influencie as discussões e o jogo de bastidores envolvendo a redação do PL das Fake News (PL 2630/2020). Fontes ouvidas na produção desta reportagem não descartam que a votação de um novo substitutivo de autoria do relator, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), seja levada a plenário já na terça-feira (16), como forma de os parlamentares se anteciparem a uma possível decisão do Supremo.

Se a pressão recente das big techs surtiu efeito e provocou o adiamento de uma decisão definitiva sobre o tema no Legislativo, há indicação de que representantes de segmentos evangélicos e da bancada da bala possam revisar seu posicionamento sobre o texto a partir de emendas sobre a redação do projeto, como a supressão do trecho que trata sobre a remuneração sobre conteúdo jornalístico e alterações análise de risco sistêmico. Tais pontos não ferem diretamente o mérito da questão. Por outro lado, o engajamento de deputados alinhados ao bolsonarismo ainda dificulta uma articulação maior pela aprovação do tema.

“Entre parlamentares favoráveis ou contrários ao projeto, existe a percepção de que é melhor buscar o entendimento de pontos sensíveis do tema do que deixar para o Judiciário, que vai tomar uma decisão, teoricamente, segundo aquilo que rege a Constituição, e pode não conseguir contemplar as nuances e as especificidades que o momento sugere”, ponderou o cientista político e CEO da Metapolítica Consultoria, Jorge R. Mizael.

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