Flávio Bolsonaro: o que se sabe até agora sobre as suspeitas do Coaf e como isso impacta o governo?

Apesar de os casos estarem sob sigilo, algumas informações já foram reveladas pela imprensa e geraram reações. No Planalto, os esforços são para evitar que a crise se alastre e contamine a ida de Bolsonaro a Davos e até mesmo as relações com o novo Congresso

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Uma série de revelações envolvendo o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) ocuparam posição de destaque no noticiário do fim de semana e desta segunda-feira (21), às vésperas de momentos importantes para o governo, com a ida do presidente Jair Bolsonaro (pai do parlamentar) ao Fórum Econômico Mundial em Davos (Suíça), e a menos de duas semanas das eleições para as mesas diretoras da Câmara e do Senado.

No Planalto, os esforços são para evitar que a crise se alastre. Em poucos dias, o que antes era uma apuração muito mais atenta às movimentações de um ex-assessor do parlamentar agora avançou com a identificação de atividades suspeitas do filho de Bolsonaro antes mesmo de tomar posse no Senado Federal. O episódio deixa exposto o governo em um momento em que capital político não pode ser desperdiçado, tendo em vista os desafios políticos a serem enfrentados.

Apesar de os casos estarem sob sigilo, algumas informações já foram reveladas pela imprensa e geraram reações de Flávio Bolsonaro e de figuras relevantes do governo e base aliada. No meio político, impactos já são estimados entre correligionários e o próprio governo. As expectativas são de desgaste adicional no início dos trabalhos no parlamento.

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O que se sabe sobre o caso

Um relatório produzido pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em uma conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. Uma das transações apontadas foi a de um cheque de R$ 24 mil destinado à primeira dama Michelle Bolsonaro. O presidente alega que a transferência foi a devolução de parte de um empréstimo feito por ele ao ex-motorista.

O documento foi anexado pelo Ministério Público Federal à investigação que deu origem à operação Furna da Onça e apontava movimentações atípicas em contas bancárias de assessores de 22 deputados estaduais do Rio. Posteriormente, revelou-se outro conjunto de movimentações financeiras em uma das contas de Queiroz que somava R$ 5,8 milhões nos dois anos anteriores: entre 2014 e 2015. Nesse período, Queiroz trabalhava no gabinete de Flávio com salário de R$ 23 mil.

Na última sexta-feira, o Jornal Nacional, da TV Globo, revelou o trecho de um novo relatório do Coaf sobre movimentações bancárias suspeitas de Flávio Bolsonaro. Segundo a reportagem, o parlamentar recebeu em sua conta bancária 48 depósitos feitos em dinheiro, todos no autoatendimento de uma agência bancária entro da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), sempre no valor de R$ 2 mil, de junho a julho de 2017. O valor soma R$ 96 mil, depositados em cinco dias.

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O Coaf diz que não foi possível identificar o autor ou os autores dos depósitos, mas observa que o fracionamento traz suspeitas de tentativa de ocultação da origem dos recursos. O documento foi pedido pelo Ministério Público do Rio em 14 de dezembro e entregue no dia 17, um dia antes da diplomação do senador eleito, e veio em complemento ao primeiro, focado nas atividades de assessores parlamentares da Alerj. O levantamento foi ampliado, sob a suspeita de devolução de parte dos salários por funcionários de gabinetes – operação conhecida como “rachadinha”.

O senador eleito questionou ao STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a legalidade da produção do relatório e pediu a nulidade das provas. Seus advogados argumentam que os investigadores requereram ao Coaf seus dados bancários depois de confirmada a vitória nas eleições, o que já implicaria as exigências do foro especial, e sem autorização judicial. Eles alegam que houve quebra de sigilo sem aval do foro competente. O MP do Rio nega. Na última quinta-feira, o ministro Luiz Fux, do STF, mandou suspender a investigação até que o relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, decida, na volta do recesso, sobre qual instância analisará o caso e se concede habeas corpus considerando ilegais as provas.

O Coaf também identificou um pagamento de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa Econômica Federal em 2017. Não foram revelados detalhes como o favorecido pelo pagamento e a data em que foi efetuado. Em entrevista à TV Record, Flávio Bolsonaro disse que, após a quitação com a Caixa, o imóvel comprado na planta foi vendido. “Foi vendido em seguida esse apartamento”, disse. “Acabou que houve atraso na entrega do imóvel e eu precisei vender”. Na entrevista, ele mostra uma folha que diz ser a cópia da escritura do apartamento que vendeu, por R$ 2.400.000. Ele pediu reserva na divulgação do documento, que ainda deve ser apresentado às autoridades competentes “no momento oportuno”.

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De acordo com reportagem do jornal Folha de S.Paulo, informações cartoriais mostram que Flávio comprou o imóvel na planta, por valor declarado de R$ 1,753 milhão. Ele se desfez do bem em 2017, quando fez uma permuta, recebendo em troca uma sala comercial na Barra da Tijuca e um apartamento na Urca, além de R$ 600 mil em dinheiro (sendo R$ 50 mil em cheque e o restante sem descrição da forma de pagamento).

Segundo o mesmo jornal, documentos obtidos em cartórios mostram que o então deputado estadual registrou, de 2014 a 2017, a aquisição de dois apartamentos em bairros nobres do Rio de Janeiro, ao custo informado de R$ 4,2 milhões. Em parte das transações, o valor declarado pelos compradores e vendedores é menor do que o usado pela prefeitura para cobrança de impostos. O período é o mesmo que o Coaf detectou movimentação de R$ 7 milhões nas contas de Fabrício Queiroz.

Impactos políticos

No momento em que o governo busca atrair a simpatia do empresariado e de investidores internacionais com a ida do presidente Jair Bolsonaro e os ministros Paulo Guedes (Economia) e Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, as notícias têm forte potencial de contágio. Por mais que busque desviar do tema, o mandatário será cobrado por explicações.

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O entendimento é que o governo terá uma única chance para indicar o novo perfil liberal do país, o compromisso com uma agenda de reformas econômicas e a construção de um ambiente de segurança jurídica. Para isso, será fundamental evitar que o fantasma das investigações contra o filho ganhe maior relevância nas conversas sobre Brasil – o que não será tarefa simples.

O caso também tende a trazer impactos em um prazo mais longo, podendo afetar as relações entre governo e parlamento em um momento de necessária construção de apoio às reformas que serão enviadas. “É um caso que não vai se esgotar por agora, é uma pedra no sapato do presidente que vai se manter por um tempo”, observa Paulo Gama, analista político da XP Investimentos. Segundo o jornal O Globo, no último sábado, Flávio Bolsonaro esteve no Palácio da Alvorada. Pai e filho ficaram reunidos durante toda a manhã.

O fato de o senador eleito ter ingressado com pedido junto ao STF, que culminou na suspensão provisória do processo, ampliou o desgaste provocado pelo caso. “Foi muito mal interpretado por aliados e opositores, como um sinal de alguém que precisa tomar uma atitude mais drástica em relação ao que estava acontecendo”, pontua Gama. Para ele, também há uma contradição no discurso contrário ao foro privilegiado. “Foi dado um passo que pareceu açodado por alguns, a não ser que haja um motivo muito sério para tomar essa decisão”. Nos bastidores, figuras altas no governo classificaram o pedido como erro estratégico.

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Em uma das entrevistas concedidas a redes de televisão no fim de semana, Flávio Bolsonaro negou estar se “escondendo atrás de foro [privilegiado]“. Ele alega que a iniciativa visava o cumprimento de uma obrigação legal, de definição de qual seria o foro competente para ficar com o caso – no qual ele deveria prestar esclarecimentos. “O Ministério Público deveria, ao tomar conhecimento que fui eleito senador, ter informado ao STF, que é o órgão competente para dizer se tem que ficar no Rio de Janeiro, Brasília, para aí sim dar prosseguimento aos demais atos da investigação”, disse o parlamentar eleito à TV Record.

“Os sinais que isso deixa não são bons. Pela estrutura do caso, vai se arrastar por um tempo. Na volta do recesso, o ministro Marco Aurélio (relator) vai tomar uma decisão. Seja qual for, isso produz notícia negativa de novo. Os parlamentares voltam do recesso, você dá munição para que, no meio de uma discussão que pode não ter nada a ver com o tema, a oposição suba na tribuna para usar isso como argumento para atrasar a discussão, irritar a base”, analista Gama.

“O discurso era tão forte na campanha, de limpeza e mudança, que qualquer deslise de qualquer membro do governo no passado vai acabar sendo usado. O governo não tem muito como fugir dessa realidade”, concluiu o analista político da XP Investimentos. Apesar de o Planalto se esforçar em se distanciar do caso, a vinculação é inevitável. Bolsonaro terá de lidar com esse pesadelo ainda durante a “lua de mel” .

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.