Esqueça Dilma: disputa pela presidência é travada entre Lula e Temer

No momento, não se sabe quem sairá vencedor da batalha. A impressão que se tem, no entanto, é que Dilma tornou-se coadjuvante do próprio processo de impeachment

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O recente tiroteio entre o ex-presidente e atual articulador político informal do governo Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Michel Temer evidencia o eixo central da discussão do impeachment da presidente Dilma Rousseff, colocando-a em posição de afastamento em detrimento ao protagonismo que lhe seria natural. Enquanto o peemedebista tenta compor sua base para fazer do impeachment presidencial um processo exitoso, o líder petista infiltra-se nos rachas abertos pelo rompimento formal do PMDB e costura acordos com outros partidos para evitar uma debandada da base.

De um lado, apresenta-se o discurso de que a presidente Dilma Rousseff perdeu a capacidade de governar e que teria cometido crime de responsabilidade pelas chamadas “pedaladas fiscais” (ou seja, o atraso nos repasses de recursos a bancos públicos pelo pagamento de políticas públicas, o que configuraria para alguns em operação irregular de crédito), enquanto do outro defende-se que faltam argumentos jurídicos que justifiquem o processo de impeachment, que seria enquadrado como um “golpe à Constituição”.

Nesta linha, Lula tem personificado a orquestração do suposto golpe, pela avaliação governista, na imagem de Temer e do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), quem acatou o pedido e determinou a abertura da discussão na casa legislativa e conta com imagem negativa por conta de envolvimento em denúncias de corrupção ligadas ao petrolão. “Temer é um constitucionalista, ele é professor de direito, ele sabe que o que estão fazendo é golpe. E isso, ele sabe, que vão cobrar é pra o filho dele, para o neto dele amanhã, porque a forma mais vergonhosa de chegar ao poder é tentar imputar o mandato, dar o golpe numa mulher da qualidade e seriedade da presidenta Dilma Rousseff”, provocou em discurso feito durante manifestação em Fortaleza (CE).

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A resposta do vice veio em nota através de sua assessoria de imprensa. O texto dizia que, exatamente por ser constitucionalista, Temer podia afirmar que não há um golpe em curso no Brasil. Nesta semana, porém, Lula deu sequência à estratégia ao sugerir que o peemedebista deveria disputar votos em uma eleição se quer ser presidente da República. O clima entre os dois tensionou e revela a temperatura do embate político no país.

Desde o acirramento com a pauta do impeachment e a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil — suspensa até que o Supremo Tribunal Federal decida sobre o caso –, a disputa tem se fechado entre o petista e o peemedebista, em torno da qual o restante gravita. Isso porque, caso Dilma caia, Temer é o novo presidente. No outro cenário, com Lula ganhando força no governo e se colocando como fiador (e até o próprio executor) da gestão em caso de fracasso do impedimento, espera-se na prática um terceiro mandato do ex-presidente. Dificilmente espera-se que Dilma tenha o papel que teve durante seu primeiro mandato. Na prática, seu impeachment pode já ter ocorrido, a depender de quem comandará o país: nessa análise, se Lula ou se Temer, com ou sem condições políticas para tal.

O mais recente episódio dessa disputa envolve a saída do PMDB da base do governo, oficializada após curta reunião ocorrida em um dos plenários da Câmara dos Deputados após decisão por aclamação. A percepção de muitos parlamentares — alguns inclusive representantes do próprio partido — é que, no afã de acenar para o restante da base aliada para promover efeito-dominó pela queda do governo, a sigla se precipitou e não foi capaz de esconder as dissidências internas. Por ter sido movimento precoce, permitiu ao governo contra-ataque. Para muitos, encheu a caneta de Dilma para a negociação de cargos com os postos antes sob posse de nomeados da principal sigla da base.

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A estratégia de Temer nesse momento é desqualificar ao máximo as negociações do governo de cargos em troca de apoio contra o impeachment, expondo as imagens dos parlamentares que aceitarem o acordo. Também joga a favor do vice a imponderável Operação Lava Jato, que pode trazer novos indícios que prejudiquem na batalha do governo pela sobrevivência política, além da própria pressão das ruas.

Do outro lado, o governo procura se apoiar em aspectos frágeis da peça analisada pela comissão especial do impeachment, e se aproveitar das fissuras expostas pelo PMDB e da possibilidade de negociar com o centrão. O plano de Lula tem sido focar em regiões que detém maior capital político e conversar com parlamentares menos expostos à pressão da sociedade contra um eventual voto em defesa do governo. O petista usa de sua habilidade política e entrada nos mais diversos grupos para seduzir deputados a compor uma nova formação de governo, a ser comandada por ele mesmo.

A defesa apresentada pelo advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, contra o impeachment ontem, na Câmara dos Deputados, também indicou uma ofensiva do Planalto para judicializar ainda mais a disputa, ampliando o peso do Supremo Tribunal Federal sobre o processo. Além disso, os argumentos por ele apresentados podem ajudar deputados que flertam com o governo a terem argumentos para eventual posição favorável.

No momento, não se sabe quem sairá vencedor dessa disputa. A impressão que se tem, no entanto, é que Dilma tornou-se coadjuvante do próprio processo de impeachment. Não será surpreendente que ela saia menor do que em outros momentos de sua gestão, mesmo se derrotar o impeachment.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.