Em meio à “guerra de versões”, qual é a real chance de Dilma voltar à presidência?

As controvérsias entre a nova oposição e o novo governo sobre o impeachment já começaram, com indicação de que muitos senadores estariam reavaliando votos - porém, para analistas, chance de Dilma voltar não é desprezível, apesar de improvável

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A batalha de versões sobre qual é o apoio verdadeiro ao impeachment ou à volta da presidente afastada Dilma Rousseff (no caso, até uma defesa de novas eleições) parece ter ganhado força nos últimos dias. 

Esta semana foi recheada de notícias sobre algumas indicações de que senadores poderiam “mudar” o seu voto: se eles votaram a favor da admissibilidade do processo em 12 de maio, quando Dilma Rousseff foi afastada por 55 votos a 22, o voto definitivo pela cassação pode ser diferente. O jornal O Globo informou na segunda que Acir Gurgacz (PDT-RO), poderia reavaliar o seu voto, mas ele destacou que em nenhum momento havia se manifestado sobre qual será a sua decisão na fase de julgamento; Romário (PSB-RJ) também foi citado na matéria e, pelo Facebook, afirmou que o “segundo e definitivo voto será para julgar o crime de responsabilidade” da presidente afastada. Em seu post, o senador pelo PSB também fez críticas ao governo interino de Michel Temer: “os primeiros dias do governo interino não foram como deveriam ser”.

Ao jornal Valor Econômico, parlamentares petistas afirmaram calcular que Temer tem hoje 50 votos, insuficientes para a cassação. Já segundo o jornal Folha de S. Paulo, as turbulências do governo interino Michel Temer enfraqueceram o apoio ao impeachment de Dilma e, pelo placar da publicação – atualizado pela última vez no sábado, 28 de maio – 42 parlamentares se posicionam a favor da saída da presidente, ante os 54 necessários para a saída dela. 19 são contra, 14 não declararam e 6 estão indecisos.  Por outro lado, em contraposição, o ex-ministro do Planejamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), afirmou à jornalista Andréia Sadi, da GloboNews, estimativa de ter 60 votos a favor do processo de impeachment, seis acima do necessário para aprovar o impeachment. 

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Mas em meio a essas guerras de versões, quais conclusões podemos tirar desse conturbado cenário político?

De acordo com o analista político da Tendências Consultoria, Rafael Cortez, um ponto importante a ser avaliado é que o impeachment não é algo natural e que o risco da presidente afastar, embora não seja o cenário mais provável, não é desprezível. Cortez ressalta que o processo de impeachment não foi consensual, havendo questionamentos tanto à legitimidade quanto à legalidade do processo: “essa chance de Dilma voltar deve ser mapeada e não é por acaso que a primeira manifestação de Aloysio Nunes (PSDB-SP) como líder do governo Temer no Senado fez menção ao ‘risco de Dilma retornar'”. 

Porém, o analista ressalta que a Tendências mantém a probabilidade de 80% de Temer continuar no cargo de presidente até 2018. O principal ponto de manter essa visão é de que o “plano B”, de retorno da presidente Dilma, não deve levar a um ganho político para os responsáveis por alçá-la novamente ao poder.

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Além disso, não há incentivo agora para a convocação de novas eleições, uma vez que a maioria dos políticos prefere levar a disputa para 2018, em um cenário de maior estabilidade. Ele afirma que, exceto Lula (PT) e Marina Silva (Rede), que apareceram nas últimas pesquisas como os nomes como mais força em uma eventual disputa, não há muitos quadros em outros partidos. Assim, as chances de convocação de novas eleições pelo Congresso é baixa, ainda mais porque a proposta precisará de 49 votos em cada um dos dois turnos de votação a que será submetida no Senado. Depois, ela seguirá para a Câmara dos Deputados, onde também será submetida a dois turnos de votação e precisará ser aprovada por três quintos dos deputados. 

Para Cortez, contudo, não é necessária “nenhuma revolução” para que o impeachment não seja aprovado. A Tendências prevê que o impeachment tenha 56 votos a favor – avaliação esta de antes dos áudios revelados pela Operação Lava Jato, o maior escândalo neste início do governo Temer. Com isso, alguns senadores tentarão aumentar o seu poder de barganha, outros analisarão como se dará o processo. Desta forma, ainda vão aguardar pelos próximos passos tanto da condução do impeachment da condução do governo interino de Michel Temer. Por outro lado, há outros votos pró-impeachment que não votaram na primeira etapa, caso de Edison Lobão (PMDB-MA) e o suplente de Delcídio Amaral, Pedro Chaves (PSC-MS), que podem contar pontos a favor para Temer. 

Neste cenário, afirma Cortez, não é por acaso que o presidente da Comissão do Impeachment, Raimundo Lira (PMDB-MA) aceitou a questão de ordem para encurtar o processo de impeachment; porém, ainda não houve votação do cronograma, que será levado primeiramente para o presidente do STF, Ricardo Lewandowski. Isso porque, diz o analista, o governo afastado usará os áudios para reforçar a tese de tentativa de ruptura institucional e da intenção dos aliados do governo interino de tirar Dilma para parar a Lava Jato, o que pode reverter em votos contra o impeachment. Além disso, o governo interino se mostra mais frágil enquanto não há um desfecho para o processo. 

Hoje, por exemplo, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que o governo tem “muita preocupação” com o risco de alguns votos de senadores serem revertidos contrariamente à atual administração. “Muita preocupação. Agora este é o placar que nós só vamos conhecer 24 horas antes. Eu falei que na Câmara seriam 368 votos, e deu 367. Falei que no Senado seriam 55, e deu 55. Mas isso a gente diz 24 horas antes. Tem muitas variáveis que ainda estão sendo consideradas”, acrescentou Padilha. 

Sobre os áudios da Lava Jato, a consultoria de risco político Eurasia destaca que não há um risco real para Temer. Isso porque o apoio do setor privado e do Congresso assegura que será necessário muito mais para desestabilizar governo de Michel Temer. A consultoria avalia que a saída de dois ministros não aumenta a probabilidade de o Senado não confirmar o impeachment de Dilma Rousseff (20%) ou de Temer não conseguir encerrar sua gestão se houver o afastamento (25%. “A Lava Jato é uma investigação altamente independente que não vai parar se Dilma for forçada a sair. Os destinos de Eduardo Cunha e Marcelo Odebrecht, no entanto, representam riscos maiores para Temer do que as recentes alegações”, afirmam os analistas políticos em relatório. 

A consultoria Arko Advice, de Brasília, também vê como “muito provável” o cenário de confirmação do impeachment de Dilma na votação final do Senado, prevista para agosto. “Os senadores sofreram muito com a falta de capacidade do governo anterior e não querem a Dilma de volta”, diz Lucas de Aragão, sócio da Arko, em entrevista à Bloomberg. Aragão relata que, em seus contatos com senadores, não sente qualquer clima para a volta da presidente afastada. O consultor reconhece que a Lava Jato deve continuar representando riscos para o governo, mas lembra que isso também ocorreu no governo Dilma. “Para os senadores, a Lava Jato é um risco tanto para os ministros de Temer quanto foi para os de Dilma, mas o governo Temer tem maior capacidade de diálogo.”

O mercado está contando com essa possibilidade?
O operador da Daycoval Renan Alpiste afirma que o mercado ainda não está comprando a ideia de que o impeachment será barrado; contudo, uma vez que estas especulações ganhem corpo, podem aumentar a instabilidade dos mercados, ainda mais levando em conta as alternativas se o impeachment não vingar. Se o impeachment não passar, o cenário que se desenha é de convocação de eleições antecipadamente, afirma ele. Com o ex-presidente Lula bem cotado nas últimas pesquisas de intenção de voto, ele passaria a ser um nome forte, o que geraria um período de estresse para o mercado. “Como isso é ainda muito especulativo, o mercado está de olho mais nas reformas a serem aprovadas pelo Congresso. Mas, conforme o noticiário se intensifique neste sentido, a tensão deverá voltar. Os investidores estrangeiros, hoje, não veem mais Dilma como presidente por conta da falta de credibilidade dela em meio às informações econômicas. Porém, ainda é muito cedo para dizer o que virá”, destaca o operador.

Para a economista da ARX, Solange Srour, o risco de Dilma voltar existe, mas o mercado ainda não coloca isso no preço. Além disso, as novas delações, também atinge a “nova oposição” (ou seja, o governo afastado). Para Solange Srour, o cenário com novas eleições também será marcado por grandes incertezas. Caso Dilma volte e faça essa proposta, o cenário seguirá de incerteza na política, por conta da dificuldade de tramitação do processo.

(Com Bloomberg)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.