“É um pecado o que o PMDB está fazendo com a própria história”, diz senador desfiliado

Em entrevista ao InfoMoney, Ricardo Ferraço diz que o partido troca a oportunidade "de andar de braços dados com aquilo que pensa a sociedade" por um governo "que não tem nenhuma chance de dar certo"

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O PMDB perde uma grande oportunidade de desembarcar da base do governo e se preocupar em um melhor alinhamento aos anseios populares. A leitura é do senador Ricardo Ferraço (ES), que anunciou sua desfiliação do partido duas semanas atrás, em meio a tentativas frustradas de convencer correligionários a votarem pela ruptura da sigla com a gestão Dilma Rousseff. O parlamentar é autor do projeto que propõe ajustes na regulamentação dos chamados acordos de leniência, segundo ele “atropelado” por medida provisória editada no apagar das luzes do ano passado.

“Acho um pecado o que o PMDB está fazendo com sua própria história. Em lugar de andar de braços dados com aquilo que pensa a sociedade, está andando lado a lado com um governo que não tem nenhuma chance de dar certo, porque fracassou em todos os segmentos”, afirmou Ferraço em entrevista ao InfoMoney. “O grande defeito disso é que não há a construção de uma aliança em razão da identidade de um projeto. O que está movendo isso são interesses de sobrevivência, salvação e manutenção de espaços no poder”.

O atual momento da relação do partido com o governo pode ser simbolizado pela trégua entre Dilma e o vice Michel Temer, após um período de tensões quando a discussão do impeachment encontrava-se em temperaturas mais elevadas. Na avaliação do senador, trata-se de um “abraço de afogados”, na medida em que Temer busca manter-se na presidência do partido — o que é dado como cada vez mais seguro enquanto se costuram as pazes com Renan Calheiros (PMDB-AL) para o horizonte de curto prazo.

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Durante a conversa, o parlamentar explicou o contexto em que apresentou um projeto de lei que visa maior segurança jurídica aos acordos de leniência feitos entre empresas investigadas e o Estado e criticou as alterações propostas pelo governo via MP. Segundo ele, o sentido seria trazer as principais instituições que representam o Estado brasileiro para que elas possam participar do processo de negociação dos acordos.

 “O acordo de leniência não é nenhuma novidade; já é uma ferramenta utilizada no âmbito do direito econômico. A novidade foi que introduzimos o acordo para além do direito econômico, no âmbito penal na lei anticorrupção. Meu projeto, aprovado no Senado, tinha por objetivo trazer o Ministério Público para essa mesa, porque há problemas administrativos que se resolvem na CGU, mas os problemas penais resolvem-se com quem é o titular da ação penal — o MP. Imagine você fazer um acordo de leniência em que assume o pecado, paga a multa e ainda assim pode ser punido por improbidade? Isso estava produzindo um ambiente de insegurança jurídica”, explicou.

Para Ferraço, o acordo de leniência é importante, mas não no formato que o governo propôs. Em primeiro lugar, ele critica o fato de ter sido enviada uma MP ao Legislativo — que já entra em vigor no momento da publicação no Diário Oficial da União, impedindo discussões prévias mais aprofundadas em outras esferas públicas, e não pode tratar de questões penais –, e não um projeto de lei em regime de urgência. “O governo fez uma coisa apressada, precipitada e improvisada, visando apenas uma coisa: tentar a qualquer custo reabilitar as empresas que estão investigadas no âmbito da Lava Jato. A conclusão que chego é que ele editou essa MP pura e simplesmente para passar a mão na cabeça dessas empresas”, observou.

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Com as alterações propostas, ele destacou ainda a perda da “concorrência pela leniência”, com a ampliação de benefícios não somente à primeira companhia que aderir ao acordo, mas a outras — que poderiam contar com redução de até 2/3 na multa. Somado a isso, o fato de a obrigatoriedade da participação de órgãos como o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União no processo de negociação faz com que o parlamentar veja incentivos à perpetuação da corrupção, com empresas acostumadas a cometerem ilícitos apenas embutindo as possíveis multas dos acordos em futuros contratos firmados. “Eles geraram um ambiente de estímulo à impunidade. O governo está se lambuzando na prática desse critério [a leniência], banalizando a utilização do mecanismo”, criticou o parlamentar durante a conversa. Nesse aspecto, o parlamentar não exclui a possibilidade de a iniciativa se tratar de retaliação ao TCU, que rejeitou no ano passado as contas da presidência referentes ao exercício de 2014.

Por fim, o deputado diz que o argumento usado pelo governo de que as pessoas responsáveis respondam pelas contravenções cometidas, poupando as empresas e os empregos gerados “é uma desfaçatez” que tenta “distorcer e tornar sem efeito” o que está previsto na lei anticorrupção, de 2013. “A inovação da lei anticorrupção consiste no fato de que, até então, quem era punido eram os agentes, os executivos. Com ela, não apenas eles são punidos, mas também a empresa. Com a MP, o governo peca, distorce e produz um retrocesso em torno da matéria”, concluiu.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.