Desistência do Renda Brasil surpreende, mas não significa que Bolsonaro abriu mão de programa turbinado

Analistas falam em "mudança abrupta", mas cenário é nebuloso e presidente ainda pode apostar em caminhos similares ao programa de renda mínima

Marcos Mortari

(Marcos Corrêa/PR)

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SÃO PAULO – O vídeo publicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas redes sociais, desautorizando membros do governo a tratar do Renda Brasil, provocou surpresa entre analistas políticos e agentes do mercado financeiro.

O programa, que vinha sendo planejado para substituir o Bolsa Família, era considerado uma das prioridades do governo federal para o ano que vem, mas enfrentava dificuldades em gerar espaço fiscal para sua execução.

“É uma mudança abrupta em relação à abordagem que o próprio presidente adotou sobre o tema. O Renda Brasil estava esbarrando em um impasse de que não há verba, mas tem um apelo político-eleitoral muito forte”, diz o analista político Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores.

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O programa era visto politicamente como uma das principais apostas de Bolsonaro para se consolidar entre eleitores com menor renda e pavimentar caminho para uma campanha pela reeleição daqui a dois anos.

Nos últimos meses, Bolsonaro experimentou uma melhora em seus índices de popularidade – movimento que foi atribuído por analistas políticos, em parte, aos efeitos do auxílio emergencial concedido a trabalhadores informais e a famílias de baixa renda, em função dos efeitos provocados pela pandemia do novo coronavírus.

O anúncio desta manhã, no entanto, não necessariamente representa uma pá de cal sobre o olhar para programas sociais desenvolvido pela atual gestão durante a pandemia de Covid-19. Para analistas políticos consultados por esta reportagem, há outros caminhos possíveis na mesma direção.

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“Temos que aguardar para ver se essa desistência é para valer. Quando ele diz que não vai fazer o Renda Brasil, não necessariamente significa que ele não possa engordar o Bolsa Família”, pontua.

Do ponto de vista das contas públicas, há uma avaliação de que a fala de Bolsonaro poderia diminuir riscos fiscais, já que o novo programa de renda mínima era visto como um dos principais desafios para o cumprimento do teto de gastos no ano que vem.

Por outro lado, o nível de incerteza permanece elevado. “A fala foi nebulosa. O fato de não criar o Renda Brasil não significa que não poderá eventualmente fortalecer o Bolsa Familia – seria um ajuste endógeno ao programa ao invés de sair criando outros, mudando Farmácia Popular etc.”, diz Thiago Vidal, analista da Prospectiva Consultoria.

“Claro que para isso ele não escaparia ao Teto. Então, mesmo que eventualmente mude o Bolsa Família por dentro, no sentido de incrementá-lo (seja o valor do benefício e/ou a quantidade de pessoas beneficiadas), a questão fiscal precisará ser endereçada. Ou seja, novos gastos no final do dia”, complementa.

O impasse, diz o analista, não foi encerrado, ainda que Bolsonaro tenha tentado dar um ponto final na discussão a partir da divulgação do vídeo nas redes sociais. “Bolsonaro certamente não vai querer descontinuar o auxílio emergencial”, aposta.

“Se quiser insistir na tese de ‘criação de empregos’, ao invés de mudanças nos programas sociais, a decisão jogará muito peso para cima da desoneração e, consequentemente, para uma eventual CPMF que dê conta dessa renúncia fiscal num cenário de queda da arrecadação em função da pandemia”, exemplifica.

Outra possibilidade, na avaliação de Vidal, seria a partir da agenda social em construção pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP). Para ele, o programa “pode servir de locomotiva para uma discussão que desague em um pacote de continuidade do auxílio”.

A fala de Bolsonaro também gera novos questionamentos sobre a posição da equipe econômica no governo federal. No vídeo, o presidente chegou a ameaçar de demissão quem propusesse o congelamento de salários e aposentadorias ou cortes em programas como o BPC.

“Quem, por ventura, vier a propor para mim uma medida como essa, eu só posso dar um cartão vermelho para essa pessoa. É gente que não tem o mínimo de coração, não tem o mínimo de entendimento [de] como vivem os aposentados no Brasil”, disse Bolsonaro.

“Por um lado, a fala do presidente tira graus de liberdade da equipe econômica para encontrar espaço no teto de gastos para acomodar novas despesas e a expressão ‘cartão vermelho’ pode dar combustível às dúvidas sobre a composição da equipe econômica. Por outro, ao dizer que não haverá Renda Brasil, Bolsonaro diminui a pressão sobre o fiscal”, avalia Victor Scalet, estrategista macro da XP Investimentos.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.