Demanda pelo Auxílio Brasil explode e fila já tem 2,78 milhões de famílias

Fila mais que dobrou entre março e abril, com um crescimento de mais de 1,48 milhão de famílias à espera do benefício

Estadão Conteúdo

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Os municípios de todo o Brasil contabilizam uma demanda reprimida de 2,78 milhões de famílias para ter acesso ao Auxílio Brasil, programa social do governo Jair Bolsonaro (PL) que substituiu o Bolsa Família. São 5,3 milhões de pessoas que têm o perfil para receber o benefício e estavam na fila em abril, segundo o mapeamento mais recente da Confederação Nacional de Municípios (CNM).

A velocidade do crescimento da demanda reprimida vem surpreendendo e preocupando os prefeitos, que na ponta sentem as cobranças da população devido ao aumento da pobreza (pois é nos municípios que as famílias fazem o cadastro para entrar no programa).

A fila mais que dobrou entre março e abril, com um crescimento de mais de 1,480 milhão de famílias à espera do benefício: ela foi de 1,307 milhões de famílias (2,1 milhões de pessoas) para 2,788 milhões de famílias (5,3 milhões de pessoas) em apenas um mês, e o número já se aproxima da quantidade de famílias que estavam na fila na época que o Bolsa Família foi extinto (3,1 milhões de famílias).

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O mapeamento da CNM, antecipado ao jornal O Estado de S. Paulo, é divulgado dias após o resultado do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19, que mostrou que a fome no Brasil voltou ao nível dos anos 1990. Atualmente 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer no país (14 milhões a mais do que no ano anterior).

A CNM diz que a previsão orçamentária para o Auxílio Brasil deste ano (R$ 89 bilhões) não é mais suficiente para zerar a fila. Segundo a entidade, mais de 25 milhões de famílias estavam registradas no Cadastro Único em 2021 (cerca de 75 milhões de pessoas), mas esse número cresceu para mais de 33 milhões de famílias em 2022 (83 milhões de pessoas).

Enquanto as prefeituras alertam para a necessidade de se reforçar o Auxílio Brasil, especialistas defendem uma grande mobilização para enfrentar o aumento da fome. Eles apontam falhas no desenho dos benefícios do programa e alertam para a necessidade de direcionar recursos ao Alimenta Brasil, programa de aquisição de alimentos de agricultores familiares e doação para famílias em situação de insegurança alimentar.

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Governo federal não se pronuncia

O Estadão procurou o governo federal para obter os números oficiais e comentar como estão sendo distribuídos os diversos benefícios previstos no programa, entre eles o de Inclusão Produtiva Rural (parcelas mensais de R$ 200 para famílias que têm agricultores familiares), mas mais uma vez não obteve resposta. Em outras reportagens publicadas, o procedimento foi o mesmo.

O clima entre os técnicos experientes do ministério da Cidadania, responsável pela gestão do Auxílio Brasil, é de indignação com a falta de transparência de informações (que deveriam ser públicas). A menos de quatro meses para as eleições, os dados detalhados do benefício, que garante um pagamento mínimo de R$ 400, são tratados como sensíveis nos bastidores do governo pelo seu potencial eleitoral.

Com a falta de dados do governo federal, a CNM resolveu seguir com um acompanhamento próprio da situação nos 5.570 municípios. O presidente da confederação, Paulo Ziulkoski, atribui a ausência de dados amplos à conjuntura eleitoral. “Dentro do possível, eles [o governo] vão escondendo, mas nós na ponta podemos levantar e mostrar. E vai piorar ainda mais até a eleição”.

Ziulkoski diz que o quadro preocupa porque a fila, que tinha diminuído no início do ano, já se aproxima do patamar anterior e o problema “estoura” nas prefeituras e nas escolas municipais, que acabam se transformando em refúgio para as crianças que chegam com fome e precisam de reforço alimentar antes das aulas.

Problemas no Auxílio Brasil

As mudanças feitas no desenho do programa têm contribuído para acentuar os problemas. Entre elas, a decisão de garantir um benefício mínimo de R$ 400 por mês para cada família. Essa regra tem feito com que um beneficiário que mora sozinho acabe recebendo o mesmo valor que uma mãe com dois filhos pequenos, por exemplo. Na prática, esse modelo funciona como um incentivo para pessoas que moram juntas se cadastrem como se morassem separadas, para receber R$ 800, e esse quadro pode acabar deixando de fora do programa famílias que mais precisam.

“Além do desenho nada equitativo, o piso de R$ 400 gera incentivos para que pessoas que moram juntas se cadastrem separadamente. É uma espécie de desmembramento de famílias, que prejudica enormemente a qualidade dos dados do Cadastro Único — e, com isso, sua capacidade de direcionar as políticas públicas à população mais vulnerável”, diz Leticia Bartholo, socióloga e especialista em políticas públicas e gestão governamental. Ela é ex-secretária nacional adjunta de Renda de Cidadania.

Olivânio Dantas Remígio, prefeito de Picuí (cidade da Paraíba no sertão do Seridó), diz que, com a criação do Auxílio Brasil, perde-se o que ele chama de “princípio da territorialidade”. “Nós tínhamos um mapeamento da pobreza no município. Sabíamos direitinho onde estavam as famílias com maior grau de vulnerabilidade social”, relata. “Ficou difícil para o município ter um marco de acompanhamento sem ter informação concreta.”

O prefeito paraibano cita outro problema colateral: o aumento da demanda por auxílios eventuais, como cesta básica, aluguel social e auxílio energia. Remígio conta que o cadastramento continua sendo feito pelas prefeituras, mas as condicionantes que haviam para o acompanhamento das famílias não são mais cobrados (como a vacinação de crianças e o peso e a avaliação se elas estão se alimentando bem). “Essa rede de saúde, assistência social e educação, fica quebrada”.

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