STF adia decisão sobre uso de dados do Coaf e da Receita em definição que impacta caso Queiroz

Ministros analisam decisão de Dias Toffoli que suspendeu ações em que houve compartilhamento de dados financeiros sem autorização judicial

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quarta-feira (20), julgamento que trata da necessidade ou não de autorização judicial para que instituições fiscais compartilhem dados com o Ministério Público em investigações.

A sessão começou de manhã e foi suspensa no fim da tarde. Apenas o presidente do STF, Dias Toffoli, votou. O voto dele foi favorável ao compartilhamento de dados entre órgãos de controle, mas com restrição.

Ele é contra o compartilhamento de informações detalhadas com o Ministério Público, sem autorização judicial, mas é a favor que somente valores globais, como o total do patrimônio, a renda total e a movimentação financeira por ano sejam compartilhados.

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Segundo Toffoli, sem autorização judicial, há o risco de “haver abusos”. Os demais ministros vão votar na sessão de amanhã, que vai começar às 14h (de Brasília).

Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), a decisão a ser tomada pelos ministros tem potencial de afetar pelo menos 935 inquéritos, investigações criminais e ações penais que estão parados há cerca de quatro meses.

Os processos foram suspensos por decisão liminar proferida pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em julho, atendendo a pedido feito pela defesa do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro. O parlamentar é alvo de investigação em que tal expediente foi utilizado.

Além do caso do senador, também foram atingidos pela decisão inquéritos de todas as instâncias baseados em informações de órgãos de controle, como o antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) – atual UIF (Unidade de Inteligência Financeira) –, a Receita Federal e o Banco Central.

Flávio Bolsonaro é investigado por suspeita de prática da chamada “rachadinha” durante o mandato de deputado estadual na Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) no caso que tem como pivô o policial militar aposentado Fabrício Queiroz, que trabalhou como seu motorista e assessor.

A investigação tem como origem um relatório do antigo Coaf, produzido no âmbito da Operação Furo da Onça, em julho de 2018. O documento fala em movimentações financeiras suspeitas observadas nas contas de 27 deputados estaduais e ex-legisladores da Alerj.

No caso de Queiroz, foi verificada movimentação de R$ 7 milhões em três anos, sendo R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. Entre as operações monitoradas estavam transferências para a conta de Flávio.

Trechos de um relatório do Coaf, revelados pela TV Globo, mostraram que o atual senador recebeu 48 depósitos de R$ 2 mil feitos entre junho e julho de 2017 em um caixa eletrônico da Alerj, totalizando R$ 96 mil.

O órgão também identificou um cheque de R$ 24 mil depositado na conta da hoje primeira-dama Michelle Bolsonaro.

O termo “rachadinha” é usado no meio político em referência a uma suposta coação de funcionários a repassarem parte dos salários aos políticos que os empregaram. Flávio e Queiroz negam a prática de qualquer irregularidade.

Reviravolta

A decisão neste julgamento do Supremo pode comprometer a mais avançada investigação contra o clã Bolsonaro. A depender do entendimento do colegiado, o inquérito contra Flávio pode ser anulado.

Mas também há investigações contra outro filho do presidente. Depois de notícias sobre funcionários fantasmas no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro, o Ministério Público do Rio de Janeiro abriu dois procedimentos de apuração sobre o caso e a suposta prática de “rachadinha”.

A investigação não corre o risco de ser suspensa ou anulada por qualquer decisão a ser tomada pelos ministros do Supremo nesta quarta-feira. Isso porque até o momento não há relatórios do Coaf nos autos.

Conforme lembra reportagem do jornal Folha de S.Paulo, no gabinete de Carlos Bolsonaro também trabalhou uma pessoa ligada a Queiroz: Márcio Gerbatim, ex-marido da mulher do policial militar aposentado.

Isso abre uma brecha para que a apuração possa voltar ao antigo gabinete de Flávio, independentemente do caminho escolhido pelo STF.

Desdobramentos políticos

Dias antes da sessão do plenário para julgar a decisão que acabou beneficiando o senador Flávio Bolsonaro, o presidente do STF, Dias Toffoli, assumiu outra posição que causou barulho no meio político.

O jornal Folha de S.Paulo informou, na última quinta-feira (14), que o magistrado havia determinado que o antigo Coaf enviasse cópia de todos os relatórios de inteligência financeira produzidos nos últimos três anos. Isso havia possibilitado o acesso do ministro a dados sigilosos de 600 mil pessoas.

Em resposta, o órgão informou de ofício que havia “um número considerável de pessoas expostas politicamente e de pessoas com prerrogativa de foro por função” entre os citados.

Toffoli alegara necessidade de entender de forma mais aprofundada como o material era feito e transmitido às autoridades de investigação. A posição sofreu críticas na sociedade, mas o ministro recebeu uma chave de acesso aos documentos.

Na última sexta-feira (15), o procurador-geral da República, Augusto Aras, havia pedido que o magistrado revogasse da decisão. Toffoli não só negou a solicitação como pediu à UIF que informasse à corte quais de seus membros teriam acesso aos relatórios financeiros sigilosos.

Três dias depois, e de posse das informações, o magistrado recuou e tornou sem efeito a solicitação dos documentos. O movimento do presidente da corte, porém, não esfriou os ânimos às vésperas do julgamento.

Na terça-feira (19), Augusto Aras enviou ao STF um parecer para defender o repasse de informações financeiras entre órgãos de fiscalização sem autorização judicial.

Para ele, o compartilhamento não compromete a privacidade e confidencialidade do sigilo dos dados e é fundamental na persecução de crimes relacionados à lavagem de dinheiro.

No último fim de semana, manifestantes se reuniram em diversas cidades do país para pedir o impeachment de Dias Toffoli e do ministro Gilmar Mendes. Os nomes da dupla também foram lembrados nas redes sociais e figuraram na lista dos termos mais comentados nos últimos dias.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.