Decisão do STF abre “avenida” para Lula, mas quais são as reais chances de condenação ser anulada?

Segunda Turma abre caminho para defesa do ex-presidente questionar competência de Sérgio Moro

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Desde que a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por três votos a dois, tirar das mãos do juiz federal Sérgio Moro os trechos das delações da Odebrecht que tratam de investigações referentes ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cresceram no meio jurídico e na imprensa especulações sobre o possível alcance deste fato novo. A posição dos magistrados abriu um novo caminho de atuação à defesa, que ganha armas para tentar reverter condenação no caso do tríplex, modificar o andamento de outros processos o líder petista e libertá-lo da prisão.

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Conforme pontua Conrado Gontijo, professor do curso de pós-graduação de Direito Penal do IDP-SP, a decisão da Segunda Turma do STF no caso específico das delações da Odebrecht contra Lula reforça posição do Tribunal no sentido de limitar a atuação do juiz federal Sérgio Moro a questões diretamente vinculadas à Petrobras.

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No entendimento do especialista, o julgamento de ontem carrega similaridades com o caso do tríplex do Guarujá (SP), pelo qual Lula foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisão, por unanimidade, pelos membros da 8ª Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Antes Moro havia determinado sentenciado prisão de 9 anos e 6 meses ao líder petista.

“É possível que o raciocínio adotado ontem seja alargado para o caso tríplex. A decisão abre caminho para que a defesa insista na abordagem que vem fazendo há algum tempo. Tecnicamente, existe um caminho para a defesa questionar a competência de Sérgio Moro. Mas isso depende de uma verificação detalhada dos autos”, observou Gontijo.

O professor explica que caso seja confirmada a ausência de vínculos com a Petrobras, mesmo que Sérgio Moro tenha conduzido boa parte do processo, ele não poderia dar continuidade ao julgamento. “Ele não pode condenar afirmando não ter a ver com a Petrobras. Se se reconhece que não existe a vinculação, será necessário o reconhecimento da incompetência do juiz que julgou o caso e o encaminhamento ao juízo competente”.

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No entendimento de Rubens Glezer, professor de Direito Constitucional da FGV-SP e coordenador do Supremo em Pauta, havia uma “ponta solta” na sentença de Moro que condenou Lula a 9 anos e 6 meses de prisão. Ele lembra que vinculações com a Petrobras foram apresentadas na denúncia, mas questões específicas sobre esse aspecto ficaram de fora da decisão do magistrado. “Não existe, na decisão, uma vinculação clara com o uso da Petrobras para o favorecimento das empreiteiras, apenas uma relação muito indireta e reduzida”, afirmou. Em seu acórdão, o TRF-4 teria buscado ajustar este ponto.

A decisão da Segunda Turma só tem efeitos sobre as delações da Odebrecht que tratam da refinaria de Abreu e Lima, do terreno do Instituto Lula e do sítio de Atibaia. Segundo a equipe de análise política da XP Investimentos, em tese, não há previsão de recurso ao plenário do Supremo. Cabem embargos de declaração à Procuradoria-Geral da República, mas estes seriam julgados pela própria Turma, o que limitaria sua eficácia. Contudo, há avaliações de que o ministro relator Edson Fachin encaminhe o recurso ao pleno, com o intuito de esclarecer a mudança na decisão da turma, que desde 2016 reconhecia a competência agora negada a Moro.

Para que o STF discuta os limites da competência de Moro para julgar determinados processos, sobretudo o caso do tríplex, são necessários novos recursos da defesa de Lula. Nesta semana, os advogados apresentaram ao TRF-4 recursos especial e extraordinário para serem apreciados pelas instâncias superiores. Nas peças, eles insistem no questionamento da competência de Moro para julgar o caso e reclamam de restrições ao direito da ampla defesa.

Além destes recursos com tramitação mais lenta, é possível que os advogados apresentem questionamento via habeas corpus. Embora o STF tenha adotado postura mais restritiva quando ao uso deste instrumento, esta pode ser uma estratégia dos advogados, visto que o réu já está cumprindo pena e HCs têm tramitação mais célere no Judiciário.

Diante de uma nova provocação da defesa de Lula, o ministro relator dos casos da Lava Jato no STF, Edson Fachin, pode optar por levar a questão à mesma Segunda Turma ou ao plenário da Corte. As chances de manutenção da competência de Moro seriam maiores na segunda opção.

“Quando a Segunda Turma [do STF] diz que, para manter [um processo] na Lava Jato, é preciso que haja relação com a Petrobras, abre-se uma brecha para a defesa”, avaliou Glezer. Por outro lado, ele espera espaço reduzido para vitória dos advogados de Lula com recursos neste sentido na Corte. “Pelo que se pode observar do comportamento estratégico dos ministros, é possível imaginar que, caso isso ocorra, Fachin encaminhe para o pleno a questão e ela não vingue. Por mais que abra espaço para que a defesa possa reforçar sua tese de nulidade por incompetência de Moro, muito provavelmente isso seria jogado para o plenário, onde o posicionamento pró-Lava Jato tem maioria por enquanto”.

Caso o Supremo seja provocado e decida pela incompetência de Moro no caso tríplex, a sentença é anulada e o processo volta ao início em outra jurisdição. Para Gontijo, tal situação explicitaria os riscos provocados pela atual jurisprudência que permite o início do cumprimento da pena após o esgotamento de recursos na segunda instância. “Se se verificar isso, terá sido a prova mais concreta possível de que antecipar o cumprimento da pena é absolutamente grave e causa danos”, opinou.

No entendimento da equipe de análise política da XP Investimentos, é possível a anulação da condenação de Lula no caso do tríplex. Contudo, esta seria uma hipótese menos provável neste momento. Na avaliação da advogada Karina Kufa, professora e coordenadora do curso de especialização em direito eleitoral do IDP-SP (Instituto de Direito Público de São Paulo), o ex-presidente poderia ter condições de disputar as eleições se tivesse pedido de HC aceito pelo STF, mesmo que este trate fundamentalmente de questão criminal.

“Se for concedido HC com este entendimento, facilmente ele consegue cautelar para ser candidato. Se houver qualquer indício de que a decisão foi tomada com vício, é fácil conseguir cautelar. Seria aberta uma oportunidade grande para ele conseguir eventualmente sair candidato e obter o registro de candidatura”, observou a especialista. Além disso, se houver entendimento de incompetência (do ponto de vista jurídico) de Moro para julgar o caso do tríplex, os prazos para prescrição seguem correndo na Justiça.

Para os analistas da consultoria Arko Advice, se o STF ou o STJ (Superior Tribunal de Justiça) reformarem o acórdão do TRF-4, o cenário mais provável é que isso ocorra parcialmente. Eles acreditam que o crime de corrupção, diferentemente do de lavagem de dinheiro, provavelmente será mantido nos tribunais superiores, o que manteria Lula inelegível. Na avaliação dos especialistas, o episódio pode ser entendido como vitória política do ex-presidente, mas permanecem baixas as chances de conquistas mais expressivas.

“Politicamente, a decisão do STF em relação ao sítio de Atibaia enfraquece o juiz Sérgio Moro e dá impulso à narrativa de Lula de que estaria sendo perseguido pelo juiz. Por outro lado, apenas situação exepcional ou fora do contexto da decisão ora comentada iria retirar Lula da prisão ou promover, rapidamente, a revisão da decisão adotada em relação ao tríplex”, concluíram os analistas da Arko Advice.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.