Corporações travam ajuste mais profundo e que daria melhor perspectiva ao País, diz analista

Mesmo com a expectativa de que Michel Temer possa ter mais forças para realizar o ajuste fiscal depois do impeachment, muitos analistas ainda contestam a capacidade do peemedebista de realizar tal plano de austeridade

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Ninguém previa que seria fácil, mas o cenário que se desenha para a realização do ajuste fiscal esbarra em novas complicações a cada dia, conforme destacam economistas. Mesmo com a expectativa de muitos especialistas de mercado de que o governo Michel Temer possa ter mais forças para realizar o ajuste fiscal depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff, muitos analistas ainda contestam a capacidade do peemedebista de realizar tal plano de austeridade. 

Além das concessões para os estados na proposta de renegociação de dívidas, outras notícias reforçou que o quadro para a realização do ajuste é bastante desafiador, conforme ressalta o diretor técnico da Wagner Investimentos José Faria Júnior. 

Faria Júnior ressalta duas matérias do jornal Valor Econômico sobre o assunto. A primeira, chamada “um aumento ‘secreto’ para o Judiciário” ressalta que um aumento de salário em 2003 de cada funcionário público da União em R$ 59,87 suscitou a busca por um reajuste que pode ter efeito bilionário para os cofres públicos.

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Isso porque diversos órgãos do Judiciário e do Ministério Público argumentaram que aumentar o salário em um valor igual para todas as categorias fere o princípio da isonomia salarial. Assim, isso determina um reajuste percentualmente maior para salários menores. O valor foi, então, comparado à menor remuneração do serviço público naquela época, chegando-se a um reajuste adicional de 13,23%, com o aumento sendo concedido, por exemplo, a servidores de STJ, STM e TST. O Ministério do Planejamento só soube dessa prática quando os órgãos pediram crédito suplementar. 

Nos últimos meses, o STF, de maneira unânime, considerou inconstitucionais esses reajustes e já não existe o risco de que esse impacto ocorra e a AGU tem orientado os advogados a pedir decisões liminares para barrar reajustes e recuperar os valores já pagos. Em diversos tribunais, os pagamentos vinham sendo realizados desde janeiro de 2015 e só foram interrompidos em abril de 2016, devido a uma decisão liminar do ministro Gilmar Mendes, a primeira a interromper a sangria.

Enquanto isso, outra notícia do jornal destaca que o presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cláudio Lamachia, pediu à Comissão de Direito Constitucional da entidade avaliar a constitucionalidade da PEC do teto de gastos e prepara uma intensa agenda de encontros políticos para tentar retirar ou ao menos alterar as regras para saúde e educação. O estudo levará cerca de 30 dias. 

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Tendo em vista o cenário de disputa, o Ministério da Fazenda já reforça os argumentos em defesa do texto, alegando que se trata do melhor caminho para ampliar o atendimento à saúde e investimentos na educação. Já o presidente da OAB diz que a medida vai gerar um congelamento no financiamento das áreas, o que poderia comprometer o investimento em um momento de envelhecimento da população, quando os gastos se fariam ainda mais necessários. A argumentação que a OAB poderia encampar seria de que a proposta violaria o princípio de que saúde seria um dever do Estado e direito dos cidadãos. 

E o que isso significa? De acordo com o diretor técnico da Wagner Investimentos, essas notícias mostram que “as corporações estão travando um ajuste mais profundo e que daria ao país uma melhor perspectiva para o futuro”.  

Ele cita ainda o artigo do presidente do Insper Marcos Lisboa e da economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, escrito em 2013, em que destaca que o Brasil se transformou numa espécie de democracia da meia entrada, ao afirmar que a concessão indiscriminada de privilégios a diversos grupos sociais e empresariais freia o crescimento sustentado da economia. O artigo se centra na ideia de que o Brasil é um país onde é particularmente forte o “rent-seeking”, ou seja, “o processo pelo qual grupos especiais conseguem obter privilégios e benefícios de agências do governo”.

E, conforme já ressaltado algumas vezes, não é só com as “corporações” que o governo está enfrentando problemas. Em relatório semanal, a Rosenberg Consultores & Associados ressalta que ainda que o núcleo econômico e o político estão “batendo cabeça”. Eles reforçam que aprovação da renegociação da dívida dos Estados na Câmara, ainda sem a votação dos destaques que podem alterar o texto, contendo como contrapartida apenas o teto do gasto e eliminando a proibição para reajuste ou nova contratação de servidores, ficou desidratada e aquém do ideal. “Ainda, pouco tem se falado sobre a validade do teto, de apenas dois anos, ao passo que o governo federal concedeu uma extensão de 20 anos para o pagamento da dívida, com uma renúncia estimada de R$ 50 bilhões”. 

De acordo com a consultoria, a sensação é que o governo cedeu muito em troca de muito pouco. Além disso, a base parlamentar está sem coesão e sem grande comprometimento com as investidas do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.”Certamente, com um teto de despesa de apenas dois anos, não será possível fazer qualquer ajuste estrutural nos Estados e esse tema voltará novamente à pauta em questão de alguns anos. Se o governo mostrou dificuldade em aprovar um projeto de lei complementar, que necessita de 257 votos, coloca grande suspeita se conseguirá aprovar as PECs, que demandam 308 votos, da maneira desejada pela equipe econômica, em temas mais espinhosos”, avalia a consultoria. “ Os ventos
vindos de Brasília não estão muito favoráveis”, avaliam os economistas da consultoria.

Porém, também há notícias positivas que podem animar a perspectiva de ajuste fiscal. Após reunião com analistas do mercado financeiro na sede da XP Investimentos em São Paulo, Meirelles afirmou que será divulgada até o final do mês a nova projeção do governo para o crescimento do PIB no ano que vem. Segundo técnicos da Fazenda, se a nova expectativa saltar da atual 1,1% para 1,5%, automaticamente a arrecadação crescerá em 2017, não sendo necessário aumentar impostos. O ministro disse, no entanto, não descartou essa possibilidade, dizendo que se necessário haverá aumento de impostos.

Conforme destacou o economista Felipe Salto em entrevista ao portal InfoMoney, Temer deve promover um ajuste fiscal contundente após o impeachment; contudo, um aumento da carga tributária parece inevitável. Porém, um aumento de imposto deve ocorrer depois de medidas de corte de gastos. Assim, Temer terá muitos desafios a enfrentar caso se confirme a saída definitiva de Dilma: de um lado, ele terá que equilibrar os interesses corporativos e do Congresso para então realizar o ajuste fiscal e, por outro, enfrentar a opinião pública que já se ressente da alta carga tributária.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.