Como Lula continua subindo nas pesquisas se a maioria acha que ele deveria ser preso?

Índices de aprovação de ex-presidente melhoram em todas as faixas de renda e regiões do País mesmo com noticiário negativo e rejeição à esquerda

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O crescimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e as sucessivas quedas em sua taxa de rejeição desafiam um intenso noticiário negativo, que vai do depoimento de antigos aliados, sendo o caso mais contundente o do ex-ministro Antonio Palocci, até a condenação do petista em primeira instância no âmbito da operação Lava Jato. Nos últimos dias, diversos institutos especializados divulgaram pesquisas para o quadro eleitoral de 2018. O que há em comum entre os levantamentos de MDA, Ipsos e Datafolha: a melhora das condições de Lula para o pleito, embora ele corra sérios riscos de ser impedido de disputar pela Lei da Ficha Limpa, caso o TRF-4 confirme a decisão do juiz federal Sergio Moro. O magistrado condenou o petista a nove anos e meio pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso envolvendo um tríplex no Guarujá (SP).

Mesmo com as recentes provas de força do petista, não é incomum ouvir de políticos e analistas a frase “Lula está politicamente morto”. Tais avaliações poderão se mostrar corretas no futuro, mas uma leitura mais cautelosa é recomendável neste momento. Com uma taxa de reprovação desta magnitude, será difícil o petista sair vitorioso do pleito em 2018, caso não seja impedido de disputar ou desista da candidatura. Contudo, se tal indicador mantiver a trajetória de queda vista nas últimas pesquisas, Lula pode ampliar suas chances de derrotar seus adversários caso participe do pleito. Conforme mostram os dados abertos do último levantamento da Ipsos Public Affairs, a desaprovação ao ex-presidente caiu em todas as faixas de renda e em quase todas as regiões do País.

Abaixo, os dados de aprovação de Lula, de acordo com a Ipsos:

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Abaixo, os dados de reprovação de Lula, de acordo com a Ipsos:

O ex-presidente alimenta extremos, com difícil possibilidade de reversão de eleitores de ambos os lados. Neste caso, piso e teto estariam bastante consolidados, o que tornaria mais complicado qualquer movimento mais consistente. Seria necessário aguardar mais pesquisas para avaliar se tal hipótese se confirmaria. “Nesses últimos dois anos de monitoramento, Lula teve uma aprovação na casa dos 30/35% e uma desaprovação de 60/65%. Isso flutua um pouco, mas não muda. Neste ano especificamente, em campanha, ele teve picos de aprovação e o deste mês foi o maior deles. É bom explicar que isso não significa que ele é o mais aprovado. O nome mais aprovado é ainda de Sergio Moro, com 48%. O ponto é que o magistrado já teve mais de 60% de aprovação. Isso vem caindo, fruto de maior exposição na mídia, do desgaste do Judiciário, do desgaste da própria Lava Jato”, observou o cientista político Danilo Cersosimo, diretor da Ipsos, em entrevista ao programa Conexão Brasília, do InfoMoney. Para o especialista, a aprovação do ex-presidente cresce em função de um discurso alinhado aos anseios de seu público e, principalmente, do legado de sua gestão.

Mas o que poderia explicar a melhora nos indicadores do petista?

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1. Resistência a fatos negativos: Há uma percepção de que os grupos que aprovam ou desaprovam Lula não mudam suas opiniões facilmente a respeito do ex-presidente. Sendo assim, o petista tende a enfrentar maiores dificuldades para continuar elevando seu piso de apoiadores e reduzindo a taxa de rejeição. Neste caso, a trajetória observada pode não ser sustentável, o que minaria as chances reais de Lula vencer, embora conte com favoritismo para embarcar em uma disputa de segundo turno.

2. Rejeição a Temer: O elevado nível de reprovação do governo de Michel Temer tem gerado dividendos políticos ao ex-presidente, que também conta com uma comparação entre as gestões no imaginário popular. A forte aprovação de Lula ao final de seu mandato foi capaz de se traduzir na eleição e reeleição de Dilma Rousseff. Embora muitos acreditem que parte dessa força tenha se perdido, ela ainda existe em parte.

Fonte: Ipsos

3. Campanha antecipada: O ex-presidente também deve estar colhendo os frutos da intensa campanha antecipada que tem feito. Não é possível dimensionar os efeitos das caravanas feitas na região Nordeste, mas os resultados do petista podem ter melhorado com as viagens, entrevistas e discursos que ele tem feito.

4. Vitimização: O embate com o juiz federal Sérgio Moro, responsável por julgamentos na primeira instância da operação Lava Jato em Curitiba (PR) pode gerar algum efeito positivo ao ex-presidente, a despeito de todo o noticiário negativo. Na primeira vez em que os dois estiveram frente a frente na capital paranaense, no processo que culminou na condenação do petista a nove anos e meio de prisão, a socióloga e professora Esther Solano chamou atenção para a narrativa dos apoiadores presentes nas ruas. Na ocasião, ela vislumbrou um forte discurso de luta de classes, que associa o ex-presidente a uma liderança representativa e responsável por mudanças importantes na vida desses grupos de menor renda. Neste caso, a luta vai além da defesa ao próprio petista, para a representação de uma camada da sociedade, que se vê ameaçada pelo avanço da exclusão. “Todo mundo [deste grupo manifestante] falava: ‘Lula foi o único que mudou um pouco nossa vida’. Há uma grande identidade com ele”, afirmou.

Na avaliação dela, contribui para um acirramento dessas posições o receio de percepção de piora de vida da base da sociedade com o governo Temer e sua agenda de reformas. A especialista vê uma situação de desespero e conta que chegou a ouvir de alguns manifestantes o questionamento: “Se eles prenderem Lula e continuarem com Temer, o que nos sobra?”. As agendas se misturam e é nesse caldo de cultura que também se encontra a narrativa de que Lula e o PT seriam vítimas de uma perseguição do Judiciário. “Essa narrativa do vitimismo está muito forte. As pessoas falavam comigo: ‘Lula está sendo perseguido porque ele representa o povo. Moro e o Judiciário representam a elite, a Globo’. ‘O Moro é a elite e a elite nos odeia’. ‘Se prender Lula, seria uma ofensa. Vamos entrar em guerra'”, contou Solano.

A luta de classes se faz muito presente neste lado da disputa e caminha em conjunto com a crença de inocência do ex-presidente. Para esse grupo de manifestantes, sequer se cogita a hipótese da apresentação de uma prova incontestável contra Lula. Tal crença na inocência do ex-presidente pode ser, juntamente com a sensação de gratidão por uma melhora nas condições de vida, um dos elementos que sustentam a resiliência de Lula nas pesquisas eleitorais, a despeito das denúncias feitas e da exposição negativa diária na imprensa.

Piso alto, teto baixo
A pesquisa CNT/MDA, realizada de 13 a 16 de setembro de 2017, mostrou um fortalecimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na pesquisa de intenção de voto espontânea, o petista passou de 16,6% em fevereiro para 20,2% em setembro, ao passo que na estimulada conseguiu ficar acima dos 30% em todos os cenários. Do ponto de vista da aprovação ou rejeitção, Lula é o único em que 23,4% dos eleitores votariam e um candidato em que 24,3% poderiam votar; 50,5% não votariam nele de jeito nenhum.

[A pesquisa] mostra que Lula continua competitivo. Apesar de todo esse noticiário negativo e dos possíveis desdobramentos que podem acontecer na Justiça, Lula ainda é competitivo”, observou o analista político Erich Decat, da XP Invesimentos em entrevista à InfoMoneyTV. “Ele ainda está nessa faixa de 30% e parece que ainda tem aquele efeito teflon que aconteceu nas outras campanhas, de que nada negativo tem pego nele. Apesar de que, puxando por outro lado, ele hoje tem uma rejeição elevada. Então, ao longo dessa caminhada dos próximos meses e até o início do próximo ano, teremos que verificar em que patamar estará essa questão da rejeição. Se ele permanecer entre os 30% [de intenção de voto], mas a rejeição também se estabilizar com 50%, isso dá margem para outros candidatos crescerem”, concluiu.

Rejeição à esquerda

Segundo a mais recente pesquisa Datafolha, uma fatia relevante do eleitorado brasileiro se distanciou da esquerda e hoje se identifica mais com o centro do espectro político. Isso tem sido apontado como um impeditivo ao crescimento de Lula, mas tal constatação precisa ser relativizada. Os conceitos de direita e esquerda estão embaralhados no imaginário dos eleitores e nem sempre podem ser compeendidos da mesma forma por todos, sobretudo em um momento em que ambos os termos têm sido pejorativamente atacados. Ou seja, não seria espantoso se algum eleitor, em tese, de esquerda não se classificasse desta forma e dissesse que não votaria em um candidato de tal espectro político — o mesmo vale para o oposto. Além disso, a percepção do legado positivo ou negativo de Lula para alguns brasileiros pode ser mais importante na decisão de votar ou não nele do que uma questão mais abstrata.

Ainda de acordo com o levantamento do Datafolha, 87% dos entrevistados disseram achar muito importante na hora de escolher um candidato que ele nunca tenha se envolvido em casos de corrupção. Este é outro exemplo que precisa ser observado de maneira cuidadosa sobre os efeitos na candidatura do ex-presidente Lula. Como pontuado anteriormente, a associação entre a imagem do petista e escândalos de corrupção não está na cabeça de todos os eleitores. Dito isso, é preciso destacar que a mesma pesquisa mostra que 54% dos brasileiros acredita que, considerando o que foi revelado pelas investigações, o ex-presidente deveria ser preso. Tal fator revela como será difícil para Lula sair vitorioso da disputa, caso não sua candidatura não seja barrada pela Lei da Ficha Limpa.

O ‘rouba mas faz’ voltou?

Em outra perspectiva, o cientista político Danilo Cersosimo, diretor da Ipsos, questiona o real compromisso do eleitorado em votar de acordo com o critério de rejeição a envolvidos em casos de corrupção. “É possível que a corrupção, ainda que seja uma pauta importante da agenda brasileira, seja relativizada em nome de outras benfeitorias e questões em torno do nome dele e de outros. Este é um fenômeno que vamos ter que olhar daqui para frente. Há um ano ou dois, a gente talvez estivesse falando do fim do ‘rouba mas faz’. Será que isso não vai voltar com força em um cenário de pobreza de debate, como estamos vivendo?”. Para ele, a polarização voltou à cena da política brasileira para ficar.

Para assistir à íntegra do último programa Conexão Brasília, clique aqui.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.