Brasil passa por 2 grandes transformações, mas há riscos no radar: como fazer para que mudanças se perpetuem?

Em evento realizado pela Thomson Reuters, Carlos Kawall, João Augusto Castro Neves e Jorge Arbache destacaram o que esperar para o Brasil em meio ao processo de reforma econômica e deflagração de operações contra corrupção

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A Operação Lava Jato (assim como os seus tentáculos) e o avanço da agenda de reformas estruturais para reduzir o endividamento público e melhorar a competitividade da economia apontam que o Brasil passa por dois grandes processos de transformação, na visão de João Augusto de Castro Neves, diretor de América Latina da consultoria de risco Eurasia Group.

No evento Brazil Risk Summit realizado na manhã desta quinta-feira pela Thomson Reuters, o analista político destacou a importância desse processo para a economia e para a política no Brasil no longo prazo, mas também apontou para as turbulências em um prazo mais curto. E, neste cenário de grandes transformações, uma das perguntas passou a ser: até onde estes processos vão e qual a influência de um sobre o outro?

“O processo da Lava Jato e os seus desdobramentos são positivos no longo prazo, mas há muitas incertezas empresariais e políticas no prazo mais curto”, aponta Castro Neves. Ele destaca que, enquanto as investigações levam a um cenário de melhores práticas de governança corporativa e de elevação da competitividade no longo prazo, ao mesmo tempo elas afetam a agenda do Congresso e o capital político do governo no cenário atual, gerando mais instabilidade e diminuindo o poder de fogo para as mudanças estruturais tão importantes para o Brasil que precisam de aprovação do Legislativo.

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Neste sentido, o economista-chefe do Banco Safra Carlos Kawall, também ressaltou o impacto de curto prazo na agenda econômica, uma vez que a rotina de operações deflagradas pela Polícia Federal levou a uma incerteza no cenário de investimentos e  minou pilares importantes de setores da economia, o que já está cobrando um “preço alto”. 

Gigantismo estatal e corrupção

O economista destaca o gigantismo do estado como um instrumento para o aumento de corrupção ao apontar que, “quanto maior o estado, mais fácil ter corrupção” e ressalta que, para resolver esse problema, além das punições, é preciso pensar em formas de reduzir o tamanho do Estado na sociedade. 

Entre um dos exemplos citados por Kawall, está a Petrobras: “por que não pensar na sua privatização?”, questiona o economista. Ele ressalta que, quando deflagrados os escândalos, tentam se estabelecer modelos de governança para que ela vire um empresa privada mas que, uma vez que ela segue estatal, nunca seria os mesmos padrões de uma companhia não controlada pelo governo.

Outro ponto apontado pelo economista do Safra refere-se ao gigantismo do BNDES e os R$ 500 bilhões que foram injetados pelo Tesouro Nacional no banco de fomento durante os governos petistas, algo sem precedentes na história de um banco de fomento e que contribuiu para a forte alta da dívida pública. Recentemente, o BNDES também virou alvo de investigações por suspeitas de fraudes e favorecimentos ilícitos na concessão de empréstimos.

“A questão é: vale ter essas empresas no poder público? O Brasil precisava de um banco de desenvolvimento nestes termos?”, ressalta o economista, apontando que o gigantismo e o excesso de recursos do BNDES acabou gerando uma espécie de “vício” do setor empresarial pelos aportes do BNDES. De acordo com ele, a Petrobras pode ser saneada. Mas, se “voltar a cair na mão das pessoas erradas, tudo voltará como antes e ela terá que passar pelo longo processo de mudanças novamente”.

Neste sentido, lembra Castro Neves, não é por acaso que a Petrobras e o BNDES vêm sendo o cerne das operações. O diretor da Eurasia aponta ainda que o maior fechamento da economia e os subsídios do BNDES levam a uma desmobilização dos empresários, que deveriam estar na linha de frente para a mudança no estado, um aumento da competitividade e uma melhora na eficiência. 

“O gigantismo estatal é um lado da moeda para a alta corrupção”, ressalta Castro Neves, que também aponta os fatores de demanda para essa alta corrupção. “Nosso sistema político é caro, grande e pessoa. Desta forma, é preciso alimentar recursos para ganhar eleições e, depois, para que o governo eleito mantenha a maioria no Congresso. Grande parte dos escândalos e do gigantismo estatal tem a ver com esses dois fatores”, aponta.

Neste sentido, Castro Neves ressalta ser necessário tornar o sistema político mais eficiente e mais barato, que não consuma tantos recursos, além de reformas eleitorais.

O secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento Jorge Arbache, destacou ainda que o estado gigantesco cria uma forte percepção ruim para a confiança na relação entre os indivíduos com o governo, o que também afeta o modo como as pessoas atuam, “ao esperar privilégios e não direitos”. 

Arbache aponta que, se há algo que pode ser feito com potencial transformador, é o cumprimento da PEC que estabelece um teto para os gastos públicos pelos próximos 20 anos (aprovada em dezembro do ano passado). “Ela faz algo que nunca fizemos antes, que é colocar o bode na sela. Teremos que olhar mais para o orçamento e nos perguntar com o que gastamos, como e por que e, deste modo, aprimorar o estado e identificar as ineficiências”, ressalta ele. 

Avanços institucionais e percepção de mercado

Com um cenário tão conturbado, como os investidores estão vendo o Brasil e quais as diferenças frente os outros países?

Castro Neves destaca, numa perspectiva comparada com outros países da América Latina, o Brasil aponta para fortes avanços institucionais, que permitiram que as investigações se estendessem e fossem menos passíveis de serem controladas por políticos, como a maior independência da Polícia Federal e do Ministério Público, este último considerado quase um “quarto poder” no Brasil.  

“Antes falava-se que o Brasil era o País da impunidade e agora fala-se que é um País policial, passando assim de um extremo ao outro sem passar pelo meio termo, que é o estado de direito. De qualquer forma, estamos vendo algo sem precedentes que é a punição de pessoas muito poderosas”, aponta Castro Neves. Para o diretor da Eurasia, as mudanças são consistentes: “não vamos dar um passo para frente e dois para trás, no máximo dois para frente e um para trás”, avalia.

Com relação às reformas econômicas, Castro Neves aponta que a chance de aprovação de uma reforma da Previdência mais robusta certamente se reduziu, mas ele segue otimista com mudanças na agenda microeconômica, trabalhista e de reformas setoriais. 

Isso ajuda na percepção de investidores em termos de aportar capital no Brasil. Segundo Arbache, há uma preocupação forte com a crise política, mas também uma percepção de que os problemas estão sendo enfrentados e que o País possui instituições fortes, além de ter o “costume” de sobreviver às crises, levando a um aumento do investimento estrangeiro em um cenário de ativos baratos. 

Por outro lado, Kawall pondera que boa parte da atratividade vem de um cenário de alta liquidez nos mercados internacionais, mas que isso pode mudar em um ambiente de alta de juros nos EUA e de alta de inflação nos países desenvolvidos. Contudo, há mudanças de regulação importantes, aumentando atratividade como em leilões de aeroportos, trazendo investidores que antes não entrariam nos projetos do governo, aponta o economista.

De qualquer forma, há um outro fator de instabilidade, segundo Kawall: as eleições presidenciais de 2018 estão aí – e o que está por vir é bastante incerto. 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.