Brasil chegou à sua “tempestade mais que perfeita” com uma conta explosiva nas mãos

Em entrevista InfoMoney Especial 2016, o especialista em contas públicas Fabio Giambiagi lamenta o inevitável agravamento da situação econômica do País em 2016 e a necessidade urgente de reformas: "estamos chegando a um ponto da canibalização dos gastos sociais"

Paula Barra

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SÃO PAULO – Especialista em contas públicas, o economista Fabio Giambiagi dá voz à terceira entrevista do “Especial Cenários para 2016” do InfoMoney. Ferrenho defensor de uma reforma previdenciária no Brasil, Giambiagi – que lançou recentemente o livro “Capitalismo: Modo de usar” – se junta ao coro de economistas que não conseguem se animar com a virada do ano. Estão faltando termos para definir o quadro que se construirá em 2016: “antes se falava em tempestade perfeita, mas ela já está mais que perfeita”.

Para ele, o País está chegando a um ponto da “canibalização dos gastos sociais”, isto é: quando um gasto social passa a comer o espaço de outro. O Brasil precisa enfrentar o problema e encaminhar para o Congresso uma agenda previdenciária enquanto é tempo ou terá que se defrontar com escolhas verdadeiramente dramáticas, como a aprovação de uma idade mínima súbita para aposentadoria, defende. 

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O problema, segundo o economista, é que essa questão precisaria ser levantada pelo Executivo, mas o Brasil vive hoje uma profunda crise de liderança política. “Foi essa capacidade de ação no Congresso que distinguiram as reformas feitas durante o governo de FHC e, inclusive, a própria reforma previdenciária, mesmo que limitada no funcionalismo, no governo Lula, em 2003”, lembra. 

Confira abaixo a entrevista com Fabio Giambiagi:

InfoMoney – Não bastasse os atuais problemas econômicos, o Brasil terá que lidar nos próximos meses com grandes questões, que passam pelo cenário político interno, possibilidade de perda de grau de investimento e alta de juros nos Estados Unidos. O que podemos esperar para o começo de 2016?
Fabio Giambiagi – Estão faltando termos para definir o que esperar. Antes se falava em “tempestade perfeita”, mas já está mais que perfeita. Realmente é uma combinação infeliz que torna praticamente inevitável um agravamento da situação econômica no começo do ano que vem. A partir daí é chover no molhado e dizer tudo aquilo que já vem sendo discutido. Os fundamentos da economia vão depender da evolução da crise politica. Mas sobre isso, nós, economistas, não temos muito a dizer, a não ser trivialidades. Eu prefiro me cercar sobre aquilo que tenho defendido há anos e agora se acentua, que é a questão da agenda previdenciária.

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O agravamento da crise está encurtando dramaticamente o espaço de manobra. O que eu sempre defendi foi uma transição longa no sistema previdenciário, mas isso está ficando cada vez mais difícil.

IM – Por que esse tempo está se encurtando?
FG – Para você ter uma ideia, no ano passado tivemos um déficit primário de 0,63% do PIB (Produto Interno Bruto). A meta, pelo menos por enquanto, é de um primário de 2% do PIB até 2018. Então se você compara ano passado com o objetivo de médio prazo, a necessidade de ajustamento é de 2,6% do PIB. Só que, enquanto a despesa previdenciária foi de 6,9% do PIB no ano passado, ela deverá ser da ordem de cerca de 7,8% do PIB no ano que vem.

Note bem o seguinte: você precisa fazer um ajustamento primário de 2,6% do PIB, em um contexto em que a principal rubrica da despesa se desajusta em 0,9% do PIB, ou seja, todo o resto precisa se ajustar em 3,5% do PIB. Uma coisa é defender o gradualismo quando a economia esta crescendo 3% ao ano, outra bem diferente é quando você está ficando sem tempo, diante de um PIB em retração. Temos que encaminhar uma agenda previdenciária enquanto ainda há tempo. 

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IM – Como deveria ser feita essa mudança?
FG – Eu defendia uma regra de transição em que, quanto maior o tempo de contribuição que a pessoa tivesse, mais próxima da regra atual ela estaria, assim como quanto menos tempo mais próxima a regra nova ela se enquadraria. Só que a premissa disso é que você tenha pelo menos de 10 a 20 anos para acomodar essas questões. Mas se o crescimento da conta fica muito dramático, eventualmente você pode chegar em uma situação onde se aprova uma idade mínima nos termos em que foram aprovados no âmbito do funcionalismo e que só passou porque afetava apenas 1 milhão de pessoas. Agora, diante de um quadro de urgência, você fica em uma situação de ‘escolha de Sofia’ [expressão que invoca a imposição de se tomar uma decisão difícil sob pressão e enorme sacrifício pessoal].

IM – As projeções para os gastos públicos não são nada animadoras, diante de um ajuste fiscal que não sai. Como o senhor definiria o quadro atual dos gastos públicos?
FG – Estamos chegando a um ponto de canibalização dos gastos sociais, dado que o esforço do ajustamento não foi empreendido anteriormente. Isso significa dizer que um gasto social passa a “comer” o outro: é o que estamos assistindo esse ano, com perspectivas de cortes na saúde dado o aumento desenfreado do gasto público, fundamentalmente o da Previdência. Esse é o primeiro estágio da canibalização.

IM – O que mais teremos pela frente?
FG – Vamos chegar a um segundo estágio, pelo andar da carruagem, que é onde se diz o seguinte: ou você aprova uma idade mínima imediatamente ou vamos ter que chegar a uma situação de ter que cortar ou adiar pagamento de aposentadorias acima de valor “x”, por exemplo. 

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No Brasil, mexer nas aposentadorias iria provocar uma revolução. Uma coisa absolutamente impensável, mas se continuarmos permitindo esse absurdo, pessoas se aposentando entre 50 a 52 anos, vamos chegar a uma situação absolutamente esquizofrênica, onde pessoas vão se aposentar com essa faixa de idade, enquanto aposentadorias são ameaçadas.

IM – O ministro Joaquim Levy luta para colocar em prática o ajuste fiscal, que não mexeria na questão estrutural, mas ainda assim segue emperrado no Congresso. O senhor acha que um processo como esse seria possível agora? Teria como colocarmos em pauta uma reforma previdenciária?
FG – Uma reforma previdenciária precisa de os seguintes requisitos: diagnóstico para explicar a razão e entender o que se quer fazer; energia, já que é uma coisa extremamente cansativa; tremenda capacidade de persuasão e um País com grande capacidade de articulação política. O governo atual não tem nenhuma dessas características, mas elas terão que aparecer ou essa conta vai ficar explosiva.

IM – O senhor acredita que um impeachment agora poderia trazer alguma reversão nesse quadro?
FG – Temos que entender o seguinte: o papel da liderança política, como o próprio nome diz, é liderar. Uma reforma não vai surgir emanada das ruas ou do poder legislativo. Quem faz a agenda de reformas é o executivo. Agora, nessa questão, em específico, da reforma previdenciária, isso tem que ser algo que tenha começo, meio e fim e que seja defendido em conjunto pelo governo.

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Não adianta o ministro da Fazenda dizer que a sociedade tem que discutir a reforma sem que se apresente uma proposta concreta. Foi esse diagnóstico e essa capacidade de ação no Congresso que distinguiram as reformas feitas no governo de FHC e, inclusive, a própria reforma previdenciária, mesmo que limitada especificamente no âmbito do funcionalismo, no governo Lula em 2003.

Isso terá que ser encarado, porque sem essa liderança política, essa capacidade de comunicação e articulação, as coisas não avançam. 

IM – Essa questão então poderia ser destravada com uma aprovação do impeachment?
FG – Passaria por uma mudança de postura política e capacidade de articulação no Congresso. Um cenário mais dramático para o País seria o que a presidente conseguisse derrubar o impeachment, mas por poucos votos. A oposição precisa ter 342 dos votos para aprovar o impeachment. Digamos que consiga 320: o impeachment não passa, mas o governo fica com pouco espaço de manobra, o que não permite aprovar nada. Isso é uma situação que, de certa forma, beira uma anarquia, onde o governo não consegue governar.

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IM – E o melhor cenário?
FG – Se houver uma mudança de governo, ainda vai depender de quem assumirá a área econômica. Está tudo muito nebuloso. A outra situação é o governo rejeitar o impeachment por larga maioria. Certamente as condições de governabilidade melhorariam para a presidente. Mas vamos aguardar as votações de fevereiro ou março.

IM – O senhor acha que 2015 deixará saudade diante das projeções cada vez mais pessimistas para 2016?
FG – Talvez não tenhamos uma queda do PIB tão pronunciada quanto desse ano. Mas vai ser um ano de nível de atividade pior e desemprego muito maior. O sapato vai apertar muito mais o calo das pessoas.

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