Bolsonaro mantém silêncio sobre resultado da eleição 16 horas após confirmação de vitória de Lula

Postura destoa do padrão em disputas majoritárias, em que derrotados declaram aceitar o resultado das urnas e cumprimentam os vitoriosos

Marcos Mortari

(Isac Nóbrega/PR)

Publicidade

Cerca de 16 horas após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) confirmar a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais, o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição derrotado no pleito, ainda não se manifestou sobre o pleito.

Em eleições majoritárias, como ocorre para o Palácio do Planalto, é tradição na política que candidatos derrotados declarem aceitar o resultado das urnas e cumprimentem os vitoriosos. E as manifestações não costumam tardar a acontecer.

O resultado do processo foi matematicamente definido às 19h55. Ao final da apuração, Lula recebeu 60.345.999 votos (o equivalente a 50,90% dos votos válidos), e Bolsonaro, 58.206.354 votos (49,10%), na disputa mais apertada da história da Nova República.

Continua depois da publicidade

Na agenda pública de Bolsonaro desta segunda-feira (31), não constam compromissos oficiais. Pela manhã, foram ao Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República, o ajudante de ordens do mandatário, tenente-coronel Cid, e o general Walter Braga Netto, que concorreu como vice na chapa derrotada. Mais tarde, Bolsonaro se dirigiu ao Palácio do Planalto.

Apesar da postura, aliados avaliam não haver clima para contestações contundentes ao resultado do processo, embora Bolsonaro tenha sinalizado tal possibilidade por diversas vezes durante o mandato ao questionar o processo eleitoral – sobretudo a confiabilidade do sistema eletrônico de votação, adotado há décadas pelo país.

Um dos elementos que reduzem tal risco consiste no comportamento de figuras mais próximas de Bolsonaro com peso institucional. Caso de Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, que foi muito rápido em reconhecer o resultado do pleito.

Continua depois da publicidade

Em discurso acompanhado do líder do governo na casa − o deputado Ricardo Barros (PP-PR) −, Lira disse que “o Brasil deu mais uma demonstração da vitalidade da sua democracia” e afirmou que “a vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada”.

Também no domingo (30), o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, disse que Bolsonaro o atendeu com “extrema educação e agradeceu” a ligação para anunciar o resultado da eleição para o Palácio do Planalto.

O silêncio de Bolsonaro também contrasta com a manifestação de diversos líderes mundiais, que reconheceram a vitória de Lula. Foi o caso de Joe Biden (Estados Unidos), Rishi Sunak (Reino Unido), Alberto Fernández (Argentina), Vladimir Putin (Rússia), Marcelo Rebelo de Sousa (Portugal), Olaf Scholz (Alemanha) e Volodymyr Zelensky (Ucrânia).

Continua depois da publicidade

A postura do adversário incomodou Lula, que, em discurso a apoiadores na Avenida Paulista, em São Paulo, logo após a confirmação da vitória, chamou atenção para o fato. “Vocês sabem que a gente vai ter que ter um governo para conversar com muita gente que está com raiva. Em qualquer lugar do mundo, o presidente derrotado já teria ligado para mim reconhecendo a derrota. Ele, até agora, não ligou, não sei se vai ligar e não sei se vai reconhecer”, disse.

Embora o resultado por margem apertada (de apenas 2,1 milhões de votos) isoladamente seja fator a facilitar movimentos de contestação do lado derrotado, há uma avaliação majoritária no meio político de que não existe ambiente para movimentos drásticos.

Legalmente, os caminhos para questionamentos teriam que vir através de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime) ou Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije), apresentadas junto à Justiça Eleitoral por partidos políticos, coligações, candidatos ou pelo Ministério Público. Mas nenhum deles é visto com capacidade de impedir a diplomação do eleito e sua posse, em 1º de janeiro de 2023, já que os processos precisariam ter provas contundentes e, neste caso, levariam tempo para serem analisados.

Continua depois da publicidade

O último exemplo de contestação de eleição presencial ocorreu em 2014 – até ontem o pleito mais apertado desde a redemocratização no país, quando a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) derrotou Aécio Neves (PSDB) por menos de 3,5 milhões de votos (51,6% a 48,4%).

Na ocasião, o tucano acusou a campanha vencedora de abuso de poder. A ação passou por um longo processo de apuração de provas e instrução após ser julgada improcedente em 2017, um ano após o vice da chapa vencedora, Michel Temer (MDB), assumir em meio ao impeachment da titular.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.