Parcelamento de dívidas do governo pode abrir espaço para Bolsa Família “turbinado”

Ideia criticada no passado, parcelamento de precatórios pode liberar espaço orçamentário para novo programa social

Equipe InfoMoney

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes (Foto: Marcos Corrêa/PR)

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SÃO PAULO – Pressionado pela perda recente de popularidade e de olho na corrida eleitoral de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) intensificou as movimentações para viabilizar a reformulação do programa Bolsa Família.

A ideia é criar um benefício social, ampliando o número de famílias atendidas e a média dos valores repassados. A construção de espaço orçamentário para as novas despesas está em discussão e deve vir, ao menos em parte, de uma mudança nas regras para o pagamento de dívidas da União.

Os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil) e Flávia Arruda (Secretaria de Governo) entregaram, nesta segunda-feira (2), aos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que busca estabelecer novas regras de parcelamento dos chamados precatórios − dívidas judiciais do governo federal com pessoas físicas e jurídicas por derrotas definitivas na Justiça.

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Pela versão do texto em elaboração do Ministério da Economia, a PEC alongaria apenas o pagamento das maiores contas, superiores a R$ 66 milhões, que representam 3% da quantidade total de débitos, mas liberaria cerca de R$ 34 bilhões para novas despesas em 2022.

A ideia da equipe econômica é que a PEC não trate do programa em si, mas apenas do parcelamento dos precatórios. O texto deve citar decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou que seja implementado o pagamento do programa de renda básica de cidadania para os brasileiros em situação de extrema pobreza e pobreza, com renda per capita inferior a R$ 89 e R$ 178, e apontar para a necessidade do movimento para abrir espaço no Orçamento.

Pelo Twitter, o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse foram discutidas “alternativas para se compatibilizar a obrigação de pagamento de precatórios pela União, um programa social que atenda a população vulnerável e a responsabilidade fiscal necessária”.

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“Envidaremos os esforços para essa solução, com especial destaque ao fato de que a população carente precisa ser assistida com uma renda mínima que minimize a fome e a miséria no Brasil”, afirmou.

Com a mudança, seria possível reduzir o espaço orçamentário destinado a gastos obrigatórios e abrir caminho para o desenho do novo benefício, que pode ser batizado de Auxílio Brasil. De acordo com a CNN Brasil e o G1, o valor das parcelas do programa pode chegar a R$ 400 – valor que, se confirmado, superaria indicações feitas pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, que defendia que o repasse médio saísse dos atuais R$ 192 para R$ 300.

Chamado de “meteoro” pelo ministro Paulo Guedes (Economia), o valor dos precatórios chega a quase R$ 90 bilhões – volume muito maior do que os R$ 54,75 bilhões previstos no Orçamento deste ano, o que poderia consumir boa parte da “sobra” esperada no teto de gastos de 2022 (regra que limita o crescimento de despesas de um ano à inflação do período anterior) e ameaçar os planos para o Bolsa Família “turbinado”.

O IPCA acumulado em 12 meses até junho (índice que define o ajuste da regra fiscal) fechou em 8,35%, o que permitirá um crescimento de R$ 124,1 bilhões no teto, que passará de R$ 1,49 trilhões em 2021 para R$ 1,61 trilhões no ano seguinte. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), com grande impacto no reajuste das quatro despesas que perfazem a maior parte dos gastos públicos obrigatórios, poderá ficar abaixo de 6% no acumulado do ano.

A diferença entre os índices geraria espaço orçamentário para o novo programa social, mas que correm riscos de acabarem usados para o pagamento dos precatórios (que são despesas obrigatórias), caso as mudanças em discussão não sejam implementadas. Além disso, a inflação mais elevada no segundo semestre pode reduzir a “gordura” e reduzir tal possibilidade, o que tem feito agentes econômicos elevarem a preocupação com ameaças ao teto de gastos.

Nesse sentido, um dos caminhos discutidos por parte da ala política do governo seria o encaminhamento do novo Bolsa Família por PEC, retirando o programa das limitações impostas pela regra fiscal – movimento fortemente rechaçado pela equipe econômica.

Outro seria criar o benefício por medida provisória e vincular as novas despesas com medidas como o imposto sobre dividendos, previsto na nova reforma do IR.

A polêmica envolvendo os precatórios voltou à mesa nos últimos dias. Integrantes da equipe econômica argumentam que as mudanças atingem apenas “superprecatórios” e não podem ser interpretados como “calote”. Na prática, seria uma forma de abrir espaço no Orçamento respeitando o teto de gastos e aplicando pagamento escalonado, já permitido por lei.

Hoje, contudo, o parcelamento acaba sendo aplicado apenas para contas bilionárias. Isso porque a Constituição permite que, caso o valor de um precatório exceda 15% dos precatórios somados para aquele mesmo ano, o pagamento dessa despesa seja feito ao longo dos seis anos seguintes.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com a bilionária conta de precatórios para a Copersucar, montante parcelado desde 2018 e que terminará de ser pago em 2024.

Segundo uma fonte graduada do Ministério da Economia, os precatórios que são despesa recorrente, inclusive todos os de pequeno valor, estão orçados para 2022. Já os “superprecatórios”, pela PEC, poderão ser parcelados em até nove anos.

Com isso, a PEC atingiria os precatórios considerados extraordinários e não recorrentes, muitos dos quais oriundos de esqueletos do passado, pontuou a fonte. “Exatamente para respeitar o teto estamos fazendo a PEC dos precatórios”, disse.

A regra do teto limita o crescimento das despesas públicas à inflação do ano anterior. Com estreita margem de manobra para gastos adicionais, o governo só pode fazer novas despesas de peso se cortar outras.

A ideia do governo de mudar regras para os pagamentos de precatórios tem sido encarada por parte de analistas como uma nova tentativa de driblar a regra do teto, mirando a ampliação de gastos em ano eleitoral, o que potencialmente renderá dividendos políticos para o presidente.

No ano passado, o governo discutiu uma mudança mais abrangente nesses pagamentos. O senador Marcio Bittar (MDB-AC), que era relator do Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2021 no Congresso e da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo, afirmou ter recebido sinal verde do Planalto para o novo Bolsa Família ser custeado com a limitação do pagamento de precatórios a 2% das receitas correntes líquidas e com o uso de parte de recursos do novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Bittar anunciou sua proposta à imprensa no Palácio do Alvorada, ao lado de líderes do governo e do ministro Guedes.

A proposta foi duramente criticada por agentes econômicos, que viram na solução uma saída artificial para uma despesa que, na verdade, seria apenas postergada.

Desta vez, a PEC dos Precatórios elaborada pela Economia também prevê uma espécie de encontro de contas, para que devedores possam quitar dívidas junto à União com valores que têm a receber a título de precatórios. Incluídos num cadastro, imóveis da União também poderiam ser utilizados nesse movimento.

Contra o tempo

Vale lembrar, ainda, que, qualquer que seja a saída costurada, para que o Bolsa Família turbinado possa valer ainda durante o mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), as novas regras precisam entrar em vigor em 2021.

Isso porque a Lei das Eleições (Lei 9.504/1997) veda, no ano da realização do pleito, “a distribuição de bens, valores ou benefícios, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior”.

(com Reuters)

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