Barroso assume presidência do STF e pede que corte tenha “olhos abertos para o mundo”

Entre as autoridades presentes, estiveram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e os líderes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco

Luís Filipe Pereira

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O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi empossado na tarde desta quinta-feira (28) como novo presidente da corte. Seguindo o protocolo, o início da sessão foi conduzido pela presidente anterior do Supremo, a ministra Rosa Weber, que vai se aposentar na próxima semana ao completar 75 anos.

Em seguida, Barroso leu o termo de compromisso e assinou o termo de posse. Depois disso, o magistrado passou a presidir a sessão para empossar o vice-presidente, ministro Edson Fachin.

Em seu discurso, o novo presidente do Supremo defendeu o diálogo entre os Poderes e afirmou que trabalhará pela “sólida unidade em defesa da democracia”. Ao afirmar que “nenhum tribunal do mundo decide tantas questões divisivas da sociedade”, o magistrado se posicionou a favor dos direitos das minorias e o aumento na participação das mulheres no Judiciário. Barroso também destacou que questões de direitos humanos vão além do posicionamento ideológico dos indivíduos, e disse que o Judiciário, sob sua gestão, estará de olhos abertos para o mundo, “com capacidade de olhar para os outros, e não somente a si mesmo”.

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“O Supremo Tribunal Federal é o tribunal da Constituição. Cabe a ele interpretá-la e, como consequência, preservar a democracia e promover os direitos fundamentais. Todas as Constituições democráticas fazem isso, a brasileira inclusive. Porém, a nossa Constituição vai bem além. Ela contempla também o sistema econômico, o sistema tributário, o sistema previdenciário, o sistema de educação, o sistema de preservação ambiental, da cultura, dos meios de comunicação. Da proteção às comunidades indígenas, da família, da criança, do adolescente, do idoso, em meio a muitos outros temas. Incluir uma matéria na Constituição é em larga medida retirá-la da política e trazê-la para o direito”, prosseguiu.

“Estamos todos no mesmo barco. Se ele naufragar, o fracasso é de todos, independentemente da posição política”, frisou.

Barroso também fez um agradecimento à ex-presidente Dilma Rousseff (PT), responsável pela sua indicação em 2013, e saudou todos os professores que estiveram na sua trajetória, desde a infância até o doutorado.

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Entre as autoridades presentes na cerimônia, estiveram o presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e os líderes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Aproximadamente mil pessoas foram convidadas para a solenidade, no plenário do STF, que teve o hino nacional cantado por Maria Bethânia.

Como decano da Corte, o ministro Gilmar Mendes discursou durante a cerimônia, e disse que a cerimônia de transmissão de cargo assume um “colorido novo” após os episódios de vandalismo na capital federal, ocorridos em janeiro.

“Esta Corte suportou, durante um par de anos, as ameaças de um populismo autoritário, desprovido de qualquer decoro democrático. Quem o confirma são os fatos: a sorte das ofensas e mentiras disparadas contra os membros desta casa, não raro covardemente endereçadas aparentes de cada um de nós, as inúmeras tentativas de interferência no resultado das últimas eleições gerais, as conspirações elucubradas para prender membros do Supremo Tribunal Federal, os atos de terrorismo consubstanciados em explosões”, disse.

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Barroso também assume a direção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Nesta semana, durante participação na Fides – maior evento da área de seguros da América Latina – o novo presidente da Corte disse que “a principal preocupação é o aprimoramento do sistema de Justiça do país com segurança jurídica, democrática e humana. É enfrentar a pobreza, as desigualdades injustas, enfrentar o crime organizado também. Há muitos capítulos que nós precisamos colocar energia”.

Caberá a Barroso estabelecer um canal de comunicação com o Parlamento para arrefecer o cenário atual e tornar menos tensa a relação do Judiciário com o Legislativo. Na quarta-feira, deputados fizeram um ato conjunto para repudiar julgamentos recentes do STF, finalizados ou em andamento, em temas como drogas, aborto e direito à propriedade. Segundo os parlamentares, tais decisões invadem a competência do Congresso Nacional de legislar sobre esses assuntos.

Nascido em Vassouras (RJ), Barroso é doutor em direito público pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Antes de chegar ao Supremo, em 2013, atuou como advogado e defendeu diversas causas na Corte, entre elas a interrupção da gravidez nos casos de fetos anencéfalos, pesquisas com células-tronco, união homoafetiva e a defesa do ex-ativista Cesare Battisti.

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Diferentemente da antecessora, o novo presidente da Corte é conhecido por uma postura mais comunicativa junto à imprensa e entidades de classe para expressar opiniões acerca de diferentes temas, deixando evidente sua “personalidade progressista”, o que já lhe rendeu críticas de representantes da classe política, como o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores.

Ano passado, durante evento em Nova York, o ministro respondeu a uma provocação de um manifestante bolsonarista com a frase “Perdeu, mané, não amola”. Em outro episódio polêmico, já neste ano, Barroso fez um discurso durante congresso realizado pela União Nacional dos Estudantes dizendo que o país havia “derrotado” o bolsonarismo.

Entre outros pontos, a sociedade aguarda qual será a sinalização da Corte sob a presidência de Barroso em relação à responsabilização de militares de alta patente pelos atos golpistas ocorridos em 8 de janeiro em Brasília. Segundo o jornalista Merval Pereira, da rádio CBN, nesta semana Barroso e o ministro Edson Fachin, que passa a assumir a vice-presidência do STF, se encontraram com o presidente do Superior Tribunal Militar, brigadeiro Joseli Camelo, que tem se colocado de maneira contrária a qualquer tipo de anistia a militares que tenham participado do episódio golpista.