“A conta chegou”: Verde traz mais perguntas que respostas sobre o Brasil e faz desabafo

Em relatório comentando o desempenho de novembro, a equipe da gestora comandada por Luis Stuhlberger destaca que "voltamos ao mundo binário de 2014" e comenta sobre os efeitos da Lava Jato e o impeachment sobre o País

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Em relatório comentando o desempenho do fundo no mês de novembro, a equipe de gestão da Verde Asset Management fez uma breve retrospectiva do ano de 2015 para o Brasil, destacando a crise econômica, a grande perplexidade com o desenrolar da Operação Lava Jato, além de traçar um panorama sobre o processo de impeachment que foi deflagrado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), além do problema de alocação de capital no quadro atual. Os gestores do fundo, comandado por Luis Stuhlberger, fazem um relatório traçando ainda mais perguntas sobre o futuro do Brasil do que respostas para ele. 

O primeiro ponto fala sobre o ano de 2015, ressaltando que a realidade econômica se desenrolou de acordo com o previsto pela Verde há algum tempo, já com uma crise em gestação, cujas consequências sérias sobre o PIB e o fiscal caíram como uma bomba no colo dos brasileiros e do Governo neste ano. Enquanto isso, a demanda doméstica e o investimento, que vinham sendo sustentados por várias formas de artificialismo, despencaram para níveis mais baixos. A Verde avalia que as margens de lucro extremamente baixas, pressionadas por custos do “combo” trabalhista, impostos altos e de má qualidade e custo de capital, enquanto o investimento demorará muito a ser retomado.

A queda da arrecadação dos impostos é destacada, levando o resultado fiscal foi para níveis desastrosos, e sem qualquer sinalização de recuperação no futuro. “Não há no mundo hoje países minimamente sérios com déficit nominal semelhante ao do Brasil”. Enquanto isso, novamente, a inflação pagou boa parte da conta dos desajustes do passado: “a conta chegou”. 

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Por outro lado, ressalta a Verde, “os estrangeiros continuam com uma grande confiança e, por que não dizer, esperança no Brasil e com isso os fluxos de capital continuam bastante positivos. E não é apenas devido à taxa Selic nos níveis atuais e ao juro real elevado, pois o FDI continua vindo em níveis altos”. 

Lava Jato: a grande perplexidade
A gestora ainda comenta sobre os desdobramentos da Operação Lava Jato: “se no dia 31/12/2014 uma cartomante previsse os desdobramentos da Lava Jato, diriam certamente que ela era uma charlatã…. Para a perplexidade da sociedade brasileira, o ano se provou extremamente surpreendente no que toca ao avanço dessa investigação”.

A Verde Asset ainda questiona: “será que o risco da corrupção endêmica que assola a sociedade brasileira aumentou a ponto de que o futuro seja melhor?”. Para a gestora, não se sabe ainda se teremos algo mais duradouro, ou se os escândalos de hoje são apenas passageiros. “Parece cedo para cravar”, afirma.

“O Brasil sempre foi um lugar onde há um viés muito negativo contra o empresário”, afirma a gestora, destacando que ele sofre de todos os lados, com tributos, legislação, regulação, autuações, juros escorchantes, problemas trabalhistas de toda sorte, achaques, morosidade de licenças — uma ampla gama de problemas — e a despeito de tudo, investe seu capital contra todos os riscos. Para a Verde, o “sistema” é aquele em que toda a lógica da interface do setor público com o privado é a da criação de dificuldades e posterior venda de facilidades; “o ‘sistema’ se alimenta disso”. A gestora avalia que a lei nunca havia chegado aos que escolhem esse caminho de facilidades como hoje e, agora, a questão que fica é se a lei ficará apenas do lado dos que “compram”, ou se chegará também aos que “vendem”.

“De novo se repete a sina de que no Brasil, a vida do empresário é sempre mais dura, mesmo para o antiético. Ou seja, a corda roerá somente do lado mais fraco, dos empresários, ou estaremos entrando num mundo inteiramente novo, tal como o experimentado pela Itália no começo dos anos 90?”, questiona a gestora. 

O impeachment
A Verde também fala sobre o processo de impeachment: “quem poderia imaginar que com menos de 1 ano de 2º mandato, se acolheria um pedido de impeachment, por pedaladas fiscais, que a rigor, vinham ocorrendo há anos, desde pelo menos o início da Nova Matriz Econômica?”

A gestora avalia que as motivações “não aparentes” do impeachment são o desejo de parte do sistema político de “administrar melhor a Lava Jato”, aproveitando-se da baixa popularidade do Governo. Para a Verde, e parte da sociedade brasileira apoia o impeachment por não suportar mais paralisia, incompetência e recessão e os “articuladores do impeachment sabem bem disso”.

“Curiosamente, o PMDB está no poder indiretamente há 30 anos e é sócio do PT no que tem aparecido de ruim, menos na questão ideológica. Seu único mérito, então, foi não ter permitido que nos tornássemos um misto de Argentina com Venezuela, o que não é pouco..”, afirma.

De acordo com os gestores, é difícil ter convicção de qualquer lado e a definição estará dada na véspera, de acordo com o que os parlamentares entendem sobre o que será mais provável. “Sem manifestações populares maciças, com uma base pós-reforma ministerial renovada (como citou um político: “camarote no Titanic”), Dilma parece ter mais chances, mas o tempo trabalha contra, com o aprofundamento da recessão e do desemprego. Há nuances, e muito mais perguntas do que respostas”.

Para a gestora, não há espaço para qualquer medida impopular no curso do impeachment e o que o Governo precisa agora é de uma base unida, e não dividida pela defesa de alguma tese fiscal impopular. “Isso durará até o final do processo, dure o quanto durar. Atenção: esse ponto é bem negativo para o fiscal”.

As perguntas continuam se Michel Temer assumir o governo, afirma o Verde: como ficam as reformas? Poderá um governo não-eleito aprovar medidas extremamente impopulares e necessárias (como a desindexação do salário mínimo e a reforma da previdência), com uma economia em frangalhos e o desemprego na lua, tendo o PT na oposição e a Lava Jato em pleno funcionamento, eventualmente se abastecendo de informações novas colhidas dentre potenciais petistas enfurecidos, supostamente com conhecimento de causa? Para a gestora, é possível que a CPMF seja aprovada, ganhando um certo tempo para não mexer nos problemas estruturais e fazendo uma ponte até 2018, ano das eleições presidenciais. 

Para a Verde, com um novo governo, as expectativas dos agentes econômicos deverão ser positivas por algum tempo, pois eles entenderão que é o fim do PT “como conhecemos”. Porém, os gestores avaliam que essa interpretação pode estar equivocada. Isso porque, até 2018, o PT pode renascer das cinzas eventualmente reencontrando um discurso com apelo eleitoral, “dado que haverá um certo cheiro de golpe no ar e a economia demorará para se recuperar, de modo que todo o processo poderá ser um tiro pela culatra”.

Mais questões também sobre se o PMDB conseguiria fazer um governo de União Nacional, ressaltando ainda o papel do PSDB no processo. “Como se dará a aliança? Qual será o papel do PSDB? Como colocar um político como o Serra para tocar o governo (Fazenda ou Casa Civil), sem que isso signifique necessariamente que o sucessor já esteja escolhido? Como chamar outras alianças, se a sucessão está definida? Consideramos um risco significativo para o PSDB embarcar num governo PMDB e perder, com isso, a substância eleitoral fortíssima que o partido tem hoje como oposição e colocar em risco a percepção de seus princípios”, sendo algo que os tucanos devem desvendar.

O fundo lembra que Marina Silva, da Rede, se “posicionou claramente” e, para eles, muito bem, apoiando a impugnação da chapa Dilma-Temer, “o que lhe dará uma enorme consistência eleitoral para 2018”. 

E fazem uma previsão bastante negativa: “de um jeito ou de outro, parece que os problemas fiscais brasileiros devem ficar muito piores antes que possam ser solucionados”.

Problema de alocação
A Verde vê a taxa de câmbio no Brasil, com o dólar a R$ 3,70, como um dos ativos com preço mais errado no país dado o quadro fiscal, mas avalia que ainda não chegou o momento de voltar a aumentar a exposição à moeda norte-americana dado o posicionamento de investidores estrangeiros. 

Para a equipe da gestora, os fundamentos econômicos mantêm o país em uma situação muito delicada, e que provavelmente não melhorará facilmente. Mas a visão de estrangeiros da situação, em meio ao ambiente global ainda favorável e juros baixíssimos ou negativos no mundo, é o que predomina, avaliam. Apesar do viés bastante negativo com o Brasil pelo fundamento, o time da Verde, gestora comandada por Luis Stuhlberger, pondera que o seu portfólio não está tão pessimista.

Entre as razões para tal posicionamento, eles citam que já existe muita coisa nos preços atuais dos ativos; que há risco de alta no mercado, ainda que não sustentável, se o impeachment contra a presidente Dilma Rousseff acontecer; e que os estrangeiros estão com visão e posição construtivas para Brasil. “Dados os fundamentos econômicos no Brasil, não resta dúvida de que ainda estamos numa situação muito delicada, e que provavelmente não melhorará facilmente. De certa maneira, voltamos ao mundo binário de 2014, com a indefinição eleitoral”

As principais posições do fundo em reais incluem grande alocação em NTN-Bs de duração entre três e quatro anos e pequena posição montada recentemente em prefixado de ano. Também há uma aplicação modesta em ações brasileiras. “Uma variedade de hedges catástrofe, posições estas bastante antigas, e algumas estruturas de derivativos compradas em dólar e vendidas em euro, iene e moeda chinesa também compõem a carteira”, mostrou o relatório. O fundo teve rendimento de 2,48 por cento no mês passado, ante alta de 1,06% do CDI. No ano até novembro, o Verde FIC FIM exibe alta de 27,35 por cento, contra 11,93% do CDI.

Por fim, um desabafo
O Verde faz um “desabafo” no final do relatório. Eles lembram que as pessoas físicas e jurídicas têm o direito de direcionar 2% de seus IRs devidos para projetos de Pronon e Pronas, que beneficiam serviços médicos, de formação, treinamento e pesquisas nas áreas de oncologia e da pessoa com deficiência. Porém, ficaram surpresos, para não dizer “chocados”, ao ver que, até a publicação do DOU de 9 de dezembro de 2015, quase a totalidade dos projetos de instituições renomadas havia sido indeferida pelo novo Ministério da Saúde.

Dentre elas, GRAACC, Hospital Albert Einstein, Hospital Sírio Libanês, Hospital de Câncer de Barretos, Dorina Nowill. “Não sabemos o que estas instituições citadas pensam a respeito, não falamos em nome delas e nem sequer conversamos com alguma delas sobre este assunto”.

A gestora ressalta que o Ministério da Fazenda limitou o valor global a R$ 2 milhões para a somatória de todas as doações de pessoas físicas e R$ 178 milhões para a totalidade das doações de pessoas jurídicas, mostrando que a lei existe “apenas para inglês ver”.

“Isto porque se 2% já é pouco, agora colocou um teto extremamente baixo no montante total possível de ser doado, praticamente inviabilizando a contribuição da maioria dos potenciais interessados em fazê-la. Em 2014, esse teto foi de 1 bilhão e 348 milhões de reais e foi publicado em 26 de maio daquele ano, enquanto que em 2015 o teto, além de sofrer redução de aproximadamente 85%, foi publicado em 8 de dezembro”. E finaliza: “dado que o dinheiro público é tão mal utilizado historicamente, por que impedir que os doadores apoiem projetos realmente bons e eficientes, por meio da pouquíssima renúncia fiscal que lhes é permitida, ao contrário do que o mundo inteiro faz?”

(Com Reuters) 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.