3 anos após o impeachment: o que avançou (além da Bolsa) e por que a economia não decolou

InfoMoney ouviu os diagnósticos de cinco dos principais economistas do país, que também deram suas projeções para os próximos meses 

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Há exatos três anos, em 31 de agosto de 2016, a então presidente Dilma Rousseff foi afastada do cargo. Com o impeachment, formou-se uma série de expectativas sobre o que poderia acontecer na economia e também na política no governo de Michel Temer, que a sucedeu, e em seguida, no mandato de Jair Bolsonaro.

De forma geral, uma onda de otimismo tomou o mercado financeiro. Nesses três anos, o Ibovespa saltou 75%, passando de 57.900 pontos para um patamar acima de 100 mil, sendo que, desde que a possibilidade de impeachment entrou no radar dos investidores, em janeiro de 2016, o índice já havia disparado 54,40%. Ou seja, considerando todo o período, a valorização foi de 170%.

Mas, como é de praxe, os investidores em bolsa reagiram antecipadamente, enquanto a economia anda devagar. O PIB cresceu mais que o esperado no segundo trimestre, mas  continua 4,8% abaixo do nível de produção alcançado no primeiro trimestre de 2014. Ou seja, ainda há um caminho longo para o Brasil voltar a ter uma retomada expressiva na economia. 

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O que avançou nestes três anos na agenda de reformas e o que ainda precisa ser feito, além dos motivos para a atividade não ter tido a retomada esperada, foram questionamentos feitos pelo InfoMoney a cinco dos principais economistas do país. Confira os diagnósticos e o que esperar daqui para frente para o Brasil três anos após o impeachment de Dilma Rousseff. 

Elena Landau,  economista e ex-diretora do BNDES 

O que comemorar

“Houve muitos avanços nos últimos três anos, principalmente na transição do governo de Michel Temer, retomando uma agenda liberal e de ajuste microeconômico e pró-mercado. Um dos grandes exemplos é a implementação da lei das estatais, com a mudança na governança corporativa.

A partir daí, teve início uma virada que fez essas companhias saírem do prejuízo, reduzirem o quadro e empregados e melhorar a qualidade técnica dos conselhos e das diretorias. Nessa transição, foram mais de 20 empresas estatais vendidas ou fechadas, com a retomada das privatizações.

A reforma trabalhista e a mudança da taxa de juros do BNDES para eliminar os subsídios também foram importantes. Cito ainda a discussão da reforma da Previdência, que está perto de ser concretizada, a aprovação da PEC do teto de gastos e a maior conscientização da questão dos desequilíbrios fiscais, além do avanço na reforma tributária.”

O que falta

“É preciso avançar nas privatizações, na abertura comercial e no ajuste nas contas dos estados e municípios. Além disso, a insegurança jurídica continua, com decisões que ainda atrapalham os investimentos porque há mudanças no entendimento sobre concessões.

Também existe muito ruído na área tributária, o que torna difícil para o investidor saber como agir.

É positivo que a reforma da Previdência esteja saindo do papel, mas seu atraso paralisou o país. Começamos o ano com a expectativa de crescimento do PIB de 2,5% e estamos caminhando para uma expansão inferior a 1%, por conta de um erro na condução política, e não de política econômica.

É necessário diminuir os ruídos que saem do Executivo, reduzir o tamanho do estado de forma radical focando ainda mais em privatizações e investir mais em capital humano, uma vez que não há nenhum incentivo para o aumento da produtividade.”

Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos 

O que comemorar

“Nesses três anos, o mais importante foi a mudança na política econômica e no debate público, além da retomada da agenda de reformas – lembrando que ficamos dez anos sem fazer reformas estruturais.

Em termos de debate público, foi essencial a discussão do ajuste fiscal estrutural, não mais via aumento de impostos e sim por meio de redução de gastos com as reformas como da Previdência e constitucional.

Isso afinou o diagnóstico de que, para cortar despesa, temos que avançar com reformas, o que contribuiu para a inflexão da política econômica. Esse ambiente trouxe a inflação para baixo e a taxa Selic para níveis civilizados e, para este caso, foi essencial a aprovação da PEC do teto de gastos. Consolidar esse ambiente macroeconômico foi muito importante: é só olhar a vizinha Argentina para entender a importância disso.”

O que falta

“Agora, precisamos avançar na agenda de crescimento econômico. A Previdência não é uma reforma para crescimento: ela propicia um equilíbrio macroeconômico estável, mas, sozinha, não resolver a questão do ajuste fiscal. De fato, “construir as paredes” é continuar com as agendas estruturais de melhora de ambiente de negócios.

Quando falamos de crescimento, um dos pilares essenciais são políticas para melhorar a qualidade da nossa mão-de-obra, que está atrasada, enquanto a abertura comercial está sendo retomada depois de 20 anos. Outro é a abertura comercial e um terceiro é o aprimoramento do ambiente de negócios. Este último é especialmente complicado, pois não há algo único na pauta, são várias frentes.

A reforma tributária é prioridade (e talvez ela seja ainda mais desafiadora que a da Previdência), mas teremos que avançar em marcos regulatórios do setor de infraestrutura, com discussões também em telecomunicações e saneamento, e nem tudo está avançando da mesma maneira.

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Outra agenda que estamos descuidando é da segurança jurídica. Há mudanças frequentes de regra de todos os lados (apesar de certos avanços com a reforma trabalhista), sem critério e com efeito retroativo. 

O Brasil está construindo o seu caminho para o crescimento, mas não é algo que vamos colher tão rapidamente. É possível que tenhamos uma expansão em torno de de 2% em 2020, mas ainda há uma fraqueza estrutural muito grande que dificulta a capacidade de reação a corte de juros. As reformas demoram, então a palavra de ordem é perseverança: o Brasil não pode perder o foco.”

Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações

O que comemorar
“A economia está se recuperando. Os números do PIB do segundo trimestre, divulgados recentemente, mostram a continuidade da retomada que foi iniciada ainda no governo Michel Temer, apesar dos choques negativos que tivemos.”

O que falta

“O que é preciso agora são medidas de estímulos à demanda agregada privada para consolidá-la, como a devolução de parte da poupança compulsória do FGTS, a continuidade da queda dos juros e uma redução vigorosa do compulsório dos bancos para acelerar a recuperação de crédito, principalmente para as pessoas físicas, como já vem ocorrendo.

Se isto for feito a tempo, o ano de 2020 será visto com mais otimismo.”

Otaviano Canuto, diretor do Center for Macroeconomics and Development em Washington, ex-diretor executivo do Banco Mundial e do FMI

O que comemorar
“Os avanços desde 2015 compreendem um gradual encaminhamento do ajuste fiscal. O teto de gastos foi aprovado, mas ainda sem as paredes de reformas no gasto público mandatório e na vinculação de receitas que o tornarão sustentável, cuja construção apenas começa com a reforma previdenciária.

Além disso, algumas reformas microeconômicas com consequentes melhoras no ambiente de negócios também foram aprovadas”

O que falta
“A lista de reformas microeconômicas ainda por cumprir inclui a reforma tributária, abertura comercial e outras.

Com relação ao PIB, vivemos uma grande ressaca, depois de longo período em que o crescimento da atividade e do emprego foram puxados por um gasto público crescendo a um ritmo médio de 6% ao ano acima da inflação entre 1992 e 2014. Uma expansão de gastos que não incluiu investimentos públicos suficientes em infraestrutura.

Aliás, baixas taxas de investimento público e privado como proporção do PIB – além do péssimo ambiente de negócios, insuficiência de concorrência e fechamento comercial, carências educacionais e outros – levaram à ‘anemia de produtividade’ na economia brasileira, ao mesmo tempo em que o gasto público ganhava ‘obesidade’. O modelo de obesidade em conjunto com anemia teve uma sobrevida via expansão da dívida pública, repassada a bancos públicos para fornecimento de crédito fortemente subsidiado, na ‘nova matriz econômica’, sem ter, porém, uma contrapartida equivalente pelo lado dos investimentos privados.

Os passos lentos na economia do Brasil refletem a ausência dos mecanismos de empuxe de demanda agregada via gasto e crédito público de outrora, completamente exauridos e cuja recomposição tornou-se uma exigência, enquanto gastos privados que apostem num futuro mais longo e não estejam aprisionados na conjuntura recessiva ainda estão em compasso de espera. A participação privada em programas de infraestrutura constitui ótimo exemplo de tais possíveis apostas no futuro. Cumpre não retroceder no tratamento da anemia com obesidade”.

Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, comanda a consultoria econômica Schwartsman & Associados

O que comemorar
“A solução para o baixo crescimento do PIB passa por recolocar as finanças públicas em ordem, o que requer reduzir o peso do gasto obrigatório nos orçamentos, o que só é possível por meio de reformas profundas. Começamos a primeira, e mais importante, a reforma previdenciária, mas com atraso significativo: já se esperava avanços em meados de 2017, quando o caso JBS veio à tona e inviabilizou reforma.

É verdade que houve outras iniciativas no período, do teto de gastos à eliminação dos subsídios implícitos nos empréstimos do BNDES, passando pela reforma trabalhista. Todavia, nenhuma delas atacou o que nos parece ser o nó do problema”.

O que falta
“Os riscos de uma ‘solução’ inflacionária da dívida são o principal motivo para manter projetos de investimento nas gavetas, em conjunto com a própria incapacidade do governos, em seus três níveis, de fazer deslanchar seus gastos de capital, já que salários e aposentadorias ‘comem’ a maior parcela dos orçamentos do setor público.

Com a aprovação da reforma previdenciária, de preferência estendendo o ajuste a estados e municípios, iniciamos o ataque à rigidez orçamentária, mas resta muito a ser feito, dado que esta reforma provavelmente apenas estabilizará o gasto previdenciária com relação ao PIB. Falta lidar com o peso excessivo do funcionalismo, principalmente no caso dos estados, bem como as vinculações orçamentárias.

Se conseguirmos avançar nesta pauta, haverá um caminho para o ajuste fiscal que reduz o risco de trajetórias explosivas da dívida, pavimentando o caminho para a recuperação. Caso contrário, a mesma dinâmica hoje presente seguirá limitando o investimento, e impedindo a recuperação plena da economia”.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.