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Tiago Reis: taxar dividendos em 10% não seria “fim do mundo”, mas abriria precedente para mais impostos

Possibilidade de uma "nova" reforma tributária, com alíquota menor de IR sobre distribuição de lucros, voltou ao radar dos investidores nessa semana

Katherine Rivas

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A tributação dos lucros e dividendos voltou à cena nesta semana. As notícias de que o governo teria retomado negociações com o Congresso Nacional para implementar a reforma do Imposto de Renda, mais branda do que a já aprovada na Câmara e encaminhada ao Senado, chamaram atenção do mercado.

Segundo reportagens publicadas nesta terça-feira (10), a “nova” reforma tributária prevê taxar os lucros e dividendos em 10%, enquanto os impostos para as empresas sofreriam um corte dos atuais 34% para 30%. Se aprovadas, as medidas poderiam entrar em vigor em 2023.

A tentativa é de driblar a rejeição que a proposta anterior sofreu entre os senadores. A antiga proposta foi aprovada na Câmara, mas ficou travada no Senado e estabelecia um imposto de 15% sobre os dividendos e uma tributação para empresas de 26%.

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Atualmente, no Brasil, os dividendos são isentos. Apenas os juros sobre capital próprio (JCP) sofrem retenção de Imposto de Renda de 15% na fonte. Em países como os Estados Unidos, a tributação de dividendos é de 30%, retido na fonte.

Para Tiago Reis, fundador da Suno Research, a possibilidade de taxação dos dividendos em 10% não é o “fim do mundo”. Abre, porém, um precedente para o aumento dessa e de outras taxas no futuro. “É mais fácil aumentar [um imposto que já existe] de 10% para 20% do que criar um imposto do zero”, diz.

Em entrevista ao InfoMoney, Reis avaliou os potenciais efeitos da eventual aprovação de uma proposta de reforma tributária nos moldes do que se discute atualmente. Confira:

InfoMoney: A taxação de dividendos voltou ao radar, agora com uma proposta mais modesta de cobrar 10% sobre o valor dos dividendos, enquanto se faz um corte no imposto a empresas de 34% a 30%. Qual é a sua opinião sobre isso?

Tiago Reis: Eu acho que o Brasil já paga muita taxa, muito imposto, e tributação a mais é ruim. Não temos muitos benefícios de pagar imposto.

A proposta traz um certo alívio com relação à anterior. Por outro lado, o corte seria menor no imposto para empresas, é preciso fazer as contas.

Pelo que eu entendi, vai ser ruim para as empresas que pagam mais dividendos e não será tão ruim para as empresas que pagam menos dividendos, na média.

Por quê?

Na hora que você reduz o imposto para as empresas [de 34% para 30%] e uma companhia não paga dividendos, significa que ela vai ser beneficiada.

Por outro lado, empresas que distribuíam 100% do lucro como dividendos vão começar a pagar Imposto de Renda sobre eles, ainda que também tenham a redução no imposto para a empresa [de 34% para 30%]. Tem que fazer uma conta e imaginar os cenários.

Em geral, a taxação vai ser ruim para quem paga muito dividendo, mas não será o fim do mundo. Obviamente, precisa ver as outras taxações. E o impacto será moderado ou até bom para quem paga pouco dividendo.

Na minha visão, o efeito é bem neutro, na média, mas precisa analisar melhor. Isso se a proposta passar, porque teve esse vaivém mil vezes. Acho que em ano eleitoral vai ser difícil passar qualquer coisa. Mas se passar, não é o fim do mundo.

A possibilidade de o imposto para PJs ser reduzido de 34% a 30% amenizaria o efeito da taxação de dividendos?

Tem que fazer uma conta de empresa para empresa, de acordo com a política de dividendos. Porque você está aliviando de um lado e pegando mais do outro.

A empresa que paga mais está sendo prejudicada. A que paga menos, não, acaba se beneficiando.

Eu fiz uma conta no passado, no modelo de tributação anterior, e é ruim para quem paga mais dividendo em relação ao lucro. Mas estamos indo para o meio do caminho, se comparado com a situação anterior, que era [uma taxação de] dividendo maior, e uma redução de tributação menor.

Eu diria que o efeito é neutro, tanto que o mercado nem está reagindo. O efeito da tributação vai ser pequeno.

A única coisa ruim é que às vezes os governos são malandros. Eles introduzem uma tributação inicial de um jeito e, daqui a pouco, aumentam novamente. O que era 0% virou 10% de imposto, daqui a pouco aumenta para 15%. É mais fácil aumentar de 10% para 20% do que criar um imposto do zero.

Cria-se esse precedente para eles aumentarem o imposto quando precisarem. Hoje, não tem tributação, e até pode ser malandragem do governo. O efeito dessa tributação pode ser neutro, mas quando precisarem, eles aumentam. A gente tem que tomar cuidado para não cair nessa armadilha.

Acredita que a proposta pode passar? Isso pode gerar um movimento de antecipação na distribuição de proventos pelas companhias neste ano? Maio foi um mês de forte distribuição de dividendos, por exemplo.

Muitas empresas fizeram isso em 2021 e, nesse ano, pagaram mais dividendo do que precisariam. Não sou especialista em Brasília, mas olhando de longe, acho difícil qualquer reforma grande passar nesse ano, que é ano eleitoral.

O efeito disso é neutro, o mercado não tem reagido muito em cima disso. Mas pode ser ruim no longo prazo, se o próximo governo, ou este, caso continue, usar isso como malandragem. Ter uma tributação que sai de zero para algo e ir aumentando.

Essa é a minha maior preocupação. A gente sabe que governos atuam dessa forma. Foi o que ocorreu com a CPFM [Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras] no Brasil, que foi criada como uma contribuição provisória e acabou quase virando definitiva, por cerca de uma década.

O pessoal começa com uma tarifa provisória e depois mantém ela indefinidamente. Essa é a minha maior preocupação: não a taxação de 10% em si, mas o precedente de aumentarem mais uma vez.

Em relação às empresas brasileiras distribuírem muitos dividendos, elas fazem isso porque estão muito lucrativas, com balanço sólido, e por isso pagam dividendos, como é o caso de Petrobras e Vale.

E não apenas pagam dividendos, como também recompram ações. Foi o caso da Vale. As empresas estão muito saudáveis, capitalizadas e distribuindo dividendos como deve ser feito.

O investidor com uma estratégia focado em ações que pagam dividendos será afetado?

Acho que será muito pouco impactado. Não deve ser motivo de preocupação ainda. O impacto talvez seja maior em uma ação e menor em outra, mas não acho que seja motivo de preocupação para o investidor a curto e médio prazo.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.