Tesouro Direto: retornos de títulos prefixados registram mais uma sessão histórica; o que explica essa alta?

Aumento do risco fiscal, com a aprovação a PEC dos Auxílios, e discussões sobre o futuro do teto dos gastos têm ajudado a puxar os juros para cima

Bruna Furlani

(Getty Images)

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Investidores que entraram no Tesouro Direto na manhã desta terça-feira (19) foram novamente surpreendidos com a alta das taxas, que voltaram a bater marcas históricas.

Na segunda atualização da tarde, o maior juro oferecido por prefixados era no valor de 13,57% ao ano, percentual bem próximo do valor mais alto já registrado pelo papel com vencimento em 2033, que foi de 13,58%, batido no começo da manhã.

A situação se repetia entre alguns papéis atrelados à inflação, caso do Tesouro IPCA+2026, que entregava um retorno real de 6,26%, recorde para o título, também no mesmo horário. O papel passou a ser negociado em fevereiro de 2020.

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“É uma combinação de risco fiscal, com discussões sobre a mudança na regra do teto de gastos, o que vai ser feito sobre a continuidade ou não do mecanismo, com a questão eleitoral. Isso tudo eleva os prêmios [juros oferecidos pelos títulos]”, afirma Luciano Costa, economista-chefe e sócio da Monte Bravo Investimentos.

Fatores externos também ajudam a puxar as taxas para cima, de acordo com Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital. Ela explica que a perspectiva de que as taxas de juros nos Estados Unidos terão que ficar altas por um período maior de tempo pressiona a curva local.

Isso ocorre porque, para manter a atratividade dos juros brasileiros, é preciso seguir com a diferença entre as taxas de juros oferecidas aqui e nos Estados Unidos. Nesse sentido, o discurso defendido pelo Banco Central de que deve encerrar em breve o ciclo de aperto monetário “parece perder força por ora”, na avaliação da especialista da CM Capital.

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Segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) e declarações feitas por dirigentes do Banco Central nos últimos meses, a autoridade monetária deve realizar mais um ajuste nos juros, só que desta vez, em menor magnitude no encontro de agosto.

As opções de Copom negociadas na B3 seguem nessa mesma direção, ao apontar que há mais de 80% de chance de que os juros sejam elevados em 0,50 ponto percentual na próxima reunião do Banco Central. O que mudou agora é que há mais casas apostando que a taxa básica pode passar dos 14% até o fim deste ano, o que implicaria em ajustes para além de agosto.

Ontem (18), por exemplo, o Credit Suisse revisou a projeção da Selic neste ano, de 13,75% para 14,25%. Nos cálculos do banco, o BC deve realizar mais uma elevação de 0,50 ponto percentual em agosto e mais duas, de 0,25 ponto percentual, em setembro e outubro.

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Em relatório, Solange Srour, economista-chefe do banco para o Brasil, além dos economistas Lucas Vilela e Rafael Castilho, afirmaram que a continuação do ciclo de aperto pelo BC “minimiza o risco de que a política monetária perca credibilidade”.

Na avaliação dos três, se isso ocorresse, o Banco Central mostraria que “continua preocupado com a convergência da inflação para a meta, ao mesmo tempo em que permite tempo adicional para avaliar como a dinâmica da inflação provavelmente evoluirá”.

“O mercado percebeu que para manter essa paridade em relação aos juros americanos, teríamos que elevar [a Selic] para percentuais além do previsto antes”, diz a economista da CM Capital. “As casas estavam com uma perspectiva mais amena em relação à política monetária e agora acabaram com essas posições. Isso tem impacto grande sobre as reprecificações desta semana”, completa.

Revisões na inflação

A mudança está ligada a uma pressão adicional inflacionária, segundo Rodrigo Marcatti, CEO da Veedha Investimentos, que impacta os títulos com vencimento mais curto, que são mais sensíveis a uma alteração na política monetária.

Da mesma forma, diz Marcatti, os papéis de prazo mais longo sofrem com a piora na parte fiscal, impulsionada pela aprovação da PEC das Bondades, ou Auxílios, que prevê gastos de R$ 41,25 bilhões acima do teto de gastos.

Nas últimas semanas, o mercado vem revisando as projeções para a inflação deste ano e do próximo. Segundo o Relatório Focus, do Banco Central, divulgado nesta segunda-feira, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve encerrar este ano em 7,54%. As previsões da semana anterior apontavam que o indicador terminaria em 7,67%.

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Embora a inflação deva recuar neste ano, a expectativa é que essa queda seja revertida no ano que vem. Segundo a pesquisa Focus, o ponto médio das projeções mostra que a inflação deve encerrar 2023 em 5,20%, contra 5,09% previstos uma semana antes.

Segundo analistas, o recuo em 2022 está ligado à aprovação de medidas como a PEC dos Combustíveis, focada em diminuir a alta dos combustíveis, que tem forte peso sobre a inflação.

O projeto aprovado no Congresso semanas atrás definiu que combustíveis — assim como energia, transportes coletivos, gás natural e comunicações — são bens essenciais e indispensáveis. Com isso, os governos estaduais não podem cobrar o ICMS sobre estes itens acima do teto estabelecido pelo texto, de 17%, além de outros impostos.

Com um detalhe: as medidas aprovadas são válidas até o fim deste ano. Apesar de ter um prazo de validade curto, analistas de mercado avaliam que pode ser difícil reverter tais medidas no ano que vem, já que elas atacam vários pontos sensíveis e com forte peso no bolso do consumidor.

Qual indexador escolher?

Em meio a um ambiente inflacionário que deve seguir desafiador, as apostas dentro do Tesouro Direto e da renda fixa, em geral, têm se concentrado em papéis pós-fixados atrelados à Selic (Tesouro Selic) e ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI), além daqueles corrigidos pela inflação (Tesouro IPCA+).

Em relatório, Camilla Dolle, head de renda fixa da XP, e Pietro Consolaro, analista de renda fixa da casa, destacam que o motivo é que a inflação deve se manter acima da meta do Banco Central nos próximos dois anos, embora esperem um choque negativo no curto prazo por causa da PEC dos Combustíveis.

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Mesmo com a aprovação desse projeto, a expectativa da XP é de que o IPCA feche o ano em 7%. Já para 2023, as projeções apontam que a inflação oficial deve terminar em 5%.

As estimativas da corretora mostram ainda que a Selic deve encerrar este ano em 13,75% ao ano e terminar 2023 em 9% ao ano. Nesse sentido, defendem os especialistas, a alocação em prefixados deve seguir baixa, por enquanto, ainda que as taxas de alguns ativos estejam em suas máximas.

O motivo é que com a expectativa de subida da Selic, a tendência é de que o juro oferecido pelos papéis prefixados fique defasado, porque o investidor “trava” a taxa na hora que adquire o papel.

Por outro lado, em documento enviado a clientes, a analista da Rico Investimentos Paula Zogbi afirma que papéis indexados ao IPCA podem ser bons trunfos para proteger o patrimônio e o poder de compra, já que uma parte do retorno acompanha a inflação.

Destaque positivo também para papéis atrelados à Selic ou ao CDI, afirma Paula, da Rico, que podem se beneficiar da alta dos juros e elevar a rentabilidade da reserva de emergência dos investidores, que é aquele dinheiro que o investidor deve investir em aplicações que permitem resgates rápidos, se houver algum imprevisto.