Patrimônio dos candidatos à presidência inclui imóveis, poupança e VGBL, mas faltam investimentos de liquidez

Listas de bens declarados ao TSE variam de R$ 1 milhão a quase R$ 13 milhões por presidenciável ou vice, considerando as quatro principais candidaturas

Mariana Segala

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Com a inscrição das chapas que disputarão a presidência da República nas eleições de outubro, estão disponíveis no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) as listas de bens declarados pelos candidatos ao posto. A análise dos dados oficiais informados pelos principais postulantes sugere que existem certas predileções de alocação de patrimônio entre eles – nem todas consideradas muito eficientes do ponto de vista financeiro.

Levando em conta as listas de bens dos quatro principais candidatos – Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) – e seus respectivos vices, nota-se uma concentração do patrimônio declarado em imóveis, como apartamentos, casas e terrenos. Há também recursos na poupança e até na conta corrente, além de investimentos em planos de previdência do tipo VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre).

De modo geral, a não ser pela própria caderneta, aplicações financeiras – especialmente as de maior liquidez, bastante utilizadas para a formação de reservas de emergência – não são as mais frequentes nas carteiras.

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Dentre os presidenciáveis, o ex-presidente Lula é o que apresenta o patrimônio mais alto, de R$ 7,4 milhões. A maior parcela, de R$ 5,6 milhões, está alocada em um VGBL. Há ainda terrenos (três, somando R$ 398 mil) e apartamentos (três, com valores unitários entre R$ 19 mil e R$ 95 mil). As aplicações de renda fixa somam R$ 186 mil – dentre os presidenciáveis, Lula é o único a declarar possuir papéis como CDBs, RDBs e outros.

Alguns itens não são detalhados. A lista inclui, por exemplo, “outros bens e direitos” e “quotas ou quinhões de capital”, inscrição que normalmente se refere a participações em empresas limitadas. O restante do patrimônio de Lula se divide da seguinte forma:

Luiz Inácio Lula da Silva - Patrimônio
Fonte: TSE (Arte: Leo Albertino)

“O VGBL tem tem como característica principal a tributação menor no longo prazo e a isenção de imposto para a transmissão dos bens para herdeiros”, diz Nélio Costa, planejador financeiro certificado (CFP). “A leitura que eu faria deste patrimônio é o foco principal no planejamento sucessório, buscando reduzir o gasto tributário após o falecimento”.

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Os resgates em planos de previdência do tipo VGBL podem ser tributados pela tabela progressiva do Imposto de Renda (a mesma que incide sobre os salários, por exemplo) ou pela tabela regressiva – e nesse caso, as alíquotas podem chegar a 10% se as aplicações forem mantidas por dez anos ou mais. Além disso, em caso de morte do titular, eles não são incluídos no inventário, tendo os recursos distribuídos diretamente aos herdeiros.

Os valores dos imóveis – e de outros bens – presentes nas declarações dos candidatos podem causar estranhamento. Lula tem apartamentos declarados por R$ 19 mil e no caso de Simone Tebet (cuja lista completa de bens você confere mais à frente nesta reportagem), há uma casa de R$ 52 mil. São valores considerados baixos demais, longe da realidade do mercado brasileiro, ao menos nas maiores cidades.

Uma explicação, segundo a planejadora financeira Letícia Camargo, pode ser o fato de que eles são incluídos na declaração de Imposto de Renda pelo valor de compra, que pode estar desatualizado. O mesmo ocorre com outros bens, como fundos imobiliários, cotas de capital de empresas e também o próprio VGBL.

Plano de previdência também aparece na lista de bens do segundo candidato com maior patrimônio – Ciro Gomes, que declarou um total de R$ 3 milhões. Mas no caso desse presidenciável, o VGBL ocupa apenas uma parcela reduzida da sua lista de bens, de R$ 23 mil. A parte mais volumosa está em dois apartamentos, que somam mais de R$ 1 milhão. Há ainda outra fatia, de tamanho parecido, declarada como “crédito decorrente de alienação”, o que sugere que o candidato realizou a venda de algum bem e ainda tem valores a receber por ela.

Ainda na seara dos imóveis, Ciro Gomes informou possuir duas casas (R$ 460 mil); os veículos também são dois (R$ 190 mil). Aparecem também em sua declaração “quotas ou quinhões de capital” e “outros créditos e poupança vinculados”, sem maior detalhamento. Confira a lista completa de bens abaixo:

Ciro Gomes - Patrimônio
Fonte: TSE (Arte: Leo Albertino)

“Uma parcela significativa do patrimônio está em crédito e a parte financeira não está exatamente investida, já que poupança ou dinheiro em espécie são apenas ativos de liquidez”, avalia Costa.

Também para Letícia, surpreende o fato de poucos candidatos possuírem investimentos financeiros de fato. “Só aparece poupança, conta corrente e imóveis. Fico imaginando que se precisarem de uma reserva de emergências, muitos candidatos parecem não ter. O patrimônio deles é muito ilíquido”, avalia.

Um caso nesse sentido é o de Simone Tebet, que declarou bens totalizando R$ 2,3 milhões ao TSE. Desse valor, apenas R$ 59 mil estão depositados em conta corrente. Todo o restante se divide entre sete apartamentos, quatro terrenos e duas casas.

Simone Tebet - Patrimônio
Fonte: TSE (Arte: Leo Albertino)

Na visão de Costa, a lista de bens declarada indica que Simone “está colocando todos os ovos apenas em uma cesta, o mercado imobiliário”. O fato de voluntariamente superconcentrar seus bens em imóveis, na visão do planejador, indica um certo nível de irresponsabilidade com o próprio patrimônio. “Ela pode ter problemas de liquidez caso ocorra um imprevisto”, diz.

Letícia destaca que a tradição brasileira de investimento em imóveis se relaciona ao passado hiper-inflacionário do País. “Os imóveis, de modo geral, têm o preço corrigido pela inflação no Brasil, então essa era uma opção para não perder o poder de compra do patrimônio”, avalia. Fora isso, também é comum encarar apartamentos e casas como fontes de geração de renda com aluguéis.

O grande problema, no entanto, está na falta de diversificação. “Vivemos um período difícil nos últimos anos, em que os preços dos aluguéis caíram e houve inadimplência e vacância. Mesmo quem recebeu novos inquilinos não conseguiu repor toda a inflação nos aluguéis e perdeu renda”. Entre 2015 e 2018, período de crise no setor imobiliário, o Índice Fipezap de locação residencial registrou recuo em 28 meses.

Dentre os presidenciáveis, Jair Bolsonaro é o que apresenta maior volume de recursos em ativos de liquidez. Seu patrimônio totaliza R$ 2,3 milhões e ele declarou ter R$ 591 mil na poupança e R$ 316 mil em contas correntes. Embora haja uma imobilização alta, já que o atual presidente informa ter cerca de R$ 1,4 milhão em casas e apartamentos, “não é totalmente preocupante”, segundo Costa – já que os recursos em poupança e conta corrente são acessíveis imediatamente.

Jair Bolsonaro - Patrimônio
Fonte: TSE (Arte: Leo Albertino)

O que chama atenção, na visão do planejador, é o fato de a parcela financeira dos bens de Bolsonaro não estar investida de fato, apenas preservada como uma reserva. Isso ganha relevância especialmente no momento atual, de inflação e juros altos no Brasil.

Enquanto a caderneta oferece remuneração fixa de 0,5% ao mês (6,17% ao ano) mais a variação da TR (Taxa Referencial), outras aplicações que acompanham os movimentos da taxa básica (Selic) proporcionam rendimentos melhores. Em julho, por exemplo, a taxa do CDI (principal referência de retorno da renda fixa) foi de 1,03%.

“Esse dinheiro da poupança e parado na conta poderia estar investido em outros produtos financeiros de renda fixa, também conservadores, também com garantia do FGC [Fundo Garantidor de Crédito] como a caderneta, e rendendo mais”, diz Letícia. “Há muitas alternativas com liquidez. Os candidatos talvez não entendam [de investimentos financeiros] ou não estão bem assessorados”, concorda Costa. Para ele, faz sentido manter recursos na poupança, na conta ou em espécie apenas para ser utilizado imediatamente.

O patrimônio dos vices

Curiosamente, as listas de bens declaradas pelos candidatos a vice-presidente indica que eles são mais afeitos aos investimentos financeiros do que os cabeças de chapa. O general Braga Netto (vice de Bolsonaro), por exemplo, informa ter R$ 1,6 milhão, incluindo ações, aplicações de renda fixa, além de uma conta no exterior. Geraldo Alckmin (vice de Lula), que afirma possuir R$ 1 milhão, tem VGBLs e também declara possuir fundos de longo prazo de FIDCs (fundos de recebíveis).

O patrimônio de Mara Gabrilli (vice de Simone), de cerca de R$ 13 milhões, é considerado o mais diversificado, contando com fundos, fundos imobiliários, VGBL e “outras aplicações e investimentos” não detalhados – além de imóveis e da boa e velha poupança. “Está muito saudável e muito bem diversificado. Não tenho acesso à carteira em si, mas pela distribuição pura do patrimônio por classes de ativos, diria que é alguém bem instruído sobre investimentos e responsável”, avalia Costa.

Já a lista de bens de Ana Paula Matos (vice de Ciro Gomes) é vista de outra maneira. Ela informa possuir R$ 1,2 milhão, dos quais cerca de R$ 1 milhão está alocado em imóveis. Apenas R$ 30 mil estão disponíveis para movimentação. Seu fluxo de caixa parece apertado, na visão de Costa, o que torna sua situação delicada.

Mariana Segala

Editora-executiva do InfoMoney