Multimercados fecham 1º semestre abaixo do CDI após 2 anos; posições táticas em juros se destacam

Parte da explicação tem a ver com o atraso ou com a falta de alocações em ativos locais; expectativa de recessão global que não veio também afetou retornos

Bruna Furlani

Notas de Real (Marcelo Casal Jr / Agencia Brasil)

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Após anos de bonança, o tempo nublou para boa parte dos fundos multimercados agora no primeiro semestre. O retorno médio dos produtos de gestão ativa no Brasil, medido pelo Índice de Hedge Funds Anbima (IHFA), ficou em 3,76% ao longo dos seis primeiros meses deste ano.

O percentual está abaixo do CDI, que avançou 6,50%, segundo levantamento feito pelo InfoMoney com base em dados da Economatica.

A piora no resultado ocorre após dois anos de desempenho (2022 e 2021) acima do índice de referência – quando os retornos ficaram em 8,32% e 3,33%, respectivamente. Durante o mesmo período, o CDI subiu  5,42% e 1,28%, nessa ordem.

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Retornos do IHFA e do CDI entre janeiro e junho (2020 a 2023)

Período Rentabilidade IHFA Rentabilidade CDI
2020 -0,95% 1,75%
2021 3,33% 1,28%
2022 8,32% 5,42%
2023 3,76% 6,50%

Fonte: TC/Economatica

A explicação para o desempenho abaixo do índice de referência tem a ver com o atraso ou com a falta de posições em ativos locais, na avaliação do CIO da Suno Wealth, João Arthur Almeida.

O profissional destaca que o primeiro semestre foi marcado por uma performance surpreendente do real contra o dólar, além do rali visto no mercado de juros e de ações.

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“Em março, havia um pessimismo muito grande com os ativos locais e os gestores erraram um pouco a mão. Foi um ‘cavalo selado’ que pouca gente aproveitou”, afirma o CIO.

Prova disso é que fundos multimercados do tipo long biased, que possuem um mandato que tende a ter um “viés mais comprado”, tiveram uma performance muito melhor do que a média dos multimercados, especialmente os que montaram posições em empresas mais domésticas e estatais, observa Almeida.

Outro fator que parece ter pesado para a abrir a diferença de retorno entre o primeiro semestre do ano passado e este ano é que houve uma tendência muito clara de abertura de juros, acompanhada por um dólar mais forte e uma queda das Bolsas americanas em 2022, conforme explica o CIO da Kinea Investimentos, Marco Freire.

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“Houve uma persistência em uma direção. Esse ano está mais difícil. É um mercado que oscila muito e que vai para pouco lugar”, afirma o executivo.

Táticos em juros dos EUA — e traídos pela falta de recessão

Em um ano mais difícil, um dos fatores que conseguiram beneficiar os fundos multimercados da casa foram posições aplicadas (que se beneficiam da queda) em juros brasileiros e uma alocação mais tática tomada (que se beneficia da alta) em juros internacionais, com destaque para os Estados Unidos.

Alocações que se beneficiam da alta do dólar contra moedas de outros países, como Suécia, China e Nova Zelândia, também trouxeram bons frutos para os produtos da gestora.

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Por outro lado, os resultados negativos vieram de posições em renda variável internacional e em algumas commodities.

“As Bolsas americanas subiram muito e estávamos comprados em petróleo e a commodity caiu. Houve a reabertura mais lenta da China e o corte da Opep [Organização dos Países Exportadores de Petróleo], o que fez com que a oferta de petróleo ficasse acima da demanda”, diz o executivo.

No acumulado deste ano até 29 de junho, os multimercados da Kinea acumulam retornos entre 4,06% e 5,81%, ou seja, abaixo dos 6,44% do CDI no período.

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Um dos pontos que podem ter atrapalhado a visão das casas sobre o cenário macroeconômico internacional foi a expectativa de que o mundo passaria por uma recessão no começo do ano, o que não ocorreu, lembra o co-CEO e portfólio manager da Alphatree Capital, Jonas Doi.

Ao contrário do que era previsto, a economia americana se mostrou mais resiliente do que o esperado, com forte abertura de empregos. Também não houve uma contaminação para o sistema bancário após problemas envolvendo bancos regionais nos Estados Unidos em março deste ano.

Já do lado brasileiro, o executivo observa que a atividade econômica não enfrentou uma forte desaceleração e que a inflação foi cedendo mais do que era aguardado pelo mercado.

Não à toa, economistas consultados pelo Banco Central têm revisado para cima as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e para baixo as estimativas para a inflação oficial.

“O resultado do primeiro semestre é totalmente ‘aceitável’. É um mercado mais de trading e menos de tendência. O jogo é mais ‘apertado’ para ganhar dinheiro”, pondera Doi.

Posições ganhadoras

Enquanto alguns gestores terminaram o primeiro semestre com retorno inferior ao índice de referência da classe, casas como a Exploritas conseguiram obter bons resultados ao montar – de forma antecipada – posições em juros e em algumas ações.

No acumulado deste ano até 29 de junho, o Exploritas Alpha America Lat FIM está com retorno de 9,16%, ou seja, acima dos 6,44% do CDI no período.

Um dos segredos para o bom desempenho foi a montagem de uma posição aplicada em juros brasileiro entre janeiro e fevereiro, quando o mercado começou a precificar o início do ciclo de corte de juros e havia bastante assimetria em termos de risco e retorno na curva, explica o sócio-fundador da gestora, Daniel Delabio.

Após o rali registrado no mercado de juros futuro nos últimos meses, o gestor conta que desfez a posição e que não possui mais nenhuma alocação em juros Brasil. O executivo defende que já que há bastante corte na curva agora e que tem adotado uma postura mais cautelosa com o país.

“Continuamos achando que o fiscal é complicado e que o PT terá dificuldade de equacionar as contas públicas”, defende. “Eu não vejo grandes assimetrias. No momento atual, há pouco risco para esperar que elas apareçam. Estamos recalculando e vendo qual será a rota”, acrescenta.

Outra ajuda no retorno veio de uma alocação comprada em alguns papéis como Hidrovias do Brasil (HBSA3), Sabesp (SBSP3) e Ambipar (AMBP3), por exemplo, além de posições vendidas (que apostam na queda) em outras ações.

O bom desempenho não é à toa. Uma das maiores alocações da casa está em Hidrovias do Brasil, que acumula alta de pouco mais de 39% no ano até o fechamento da última segunda-feira (3).