Mais de 600 fundos tinham ações da Americanas em setembro de 2022, somando cerca de R$ 1,5 bilhão

Americanas assustou o mercado depois de informar um rombo de R$ 20 bilhões ligado à conta de fornecedores, que não constava nos balanços da empresa

Bruna Furlani

Lojas Americanas

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A derrocada das ações da Americanas (AMER3) nesta quinta-feira (12) causou apreensão entre investidores posicionados em fundos com exposição aos papéis.

No total, cerca de 600 fundos possuíam as ações ordinárias da companhia em setembro, segundo dados levantados pela plataforma Economatica. Somado, o volume financeiro bruto registrado pelas carteiras era de R$ 1,53 bilhão.

Os números englobam fundos de todas as classes (multimercados, ações, entre outros) e consideram apenas os papéis comprados – não se trata de posição líquida (descontando as apostas vendidas, ou short). 

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Os dados de setembro são os mais recentes disponibilizados pelos gestores à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e compilados por plataformas como a Economatica.

A Americanas assustou o mercado depois de informar um rombo da ordem de R$ 20 bilhões ligado à conta de fornecedores, que não constava nos balanços da empresa.

Só no pregão de hoje, a companhia viu seu valor de mercado evaporar de R$ 10,83 bilhões para R$ 2,45 bilhões, uma queda de R$ 8,38 bilhões. O papel AMER3 derreteu 77,33%, cotado a R$ 2,72, em uma sessão encurtada para os ativos – que passaram boa parte do tempo em leilão.

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Em valores absolutos, o fundo Moat Capital FIA Master, da gestora Moat Capital, era o que possuía o maior volume de AMER3 na carteira em setembro: R$ 327 milhões. O Bogari Value Master II FIA, da Bogari Capital, tinha R$ 70 milhões e o Tempo Capital Principal FIA, da Tempo Capital, outros R$ 66 milhões.

Em termos relativos, o fundo Colorado FIA IE, da Mandatto Gestão de Investimentos, era a carteira em que a soma dos papéis da Americanas equivaliam a um volume maior do patrimônio líquido do fundo: 99%. Na sequência, aparecia o fundo Beau Soleil FIA IE, da mesma gestora, com 28%. O terceiro lugar era ocupado por um fundo da Zero Conflict Wealth Management, o Beta FI Multimercado, com 18%.

Nem todos os fundos mantiveram a exposição nas ações da Americanas de setembro para cá.

Todos os fundos da Bogari Capital, por exemplo, somavam uma posição líquida comprada de aproximadamente R$ 120 milhões em ações da Americanas naquele mês, segundo dados levantados pela plataforma Trademap. Mas zerou a exposição aos papéis ainda em outubro do ano passado, depois de mantê-los em carteira por aproximadamente um ano.

Veja os dez fundos com maiores posições absolutas em ações da Americanas (AMER3) em setembro de 2022: 

Fundo Valor (R$ mil)
Moat Capital FIA Master 327.090
Bogari Value Master II FIA 70.391
Tempo Capital Principal FIA 66.580
Moat Capital Equity Hedge Master FI Mult 56.251
Truxt Long Bias Master FI Mult 40.217
Tavola Absoluto Master FIA 31.056
Truxt Long Bias Master FIA 29.343
Kapitalo Master II FI Mult 24.356
Beau Soleil FIA Ie 22.161
FIA Alvorada 21.205

Fonte: TC/Economatica. Posição em 30/09/22.

Veja os dez fundos com maiores posições relativas em ações da Americanas (AMER3) em setembro de 2022: 

Fundo Valor (R$ mil) Percentual em relação ao patrimônio líquido (%)
Colorado FIA Ie 15.482 99,64
Beau Soleil FIA Ie 22.161 28,33
Beta FI Mult Ie Cred Priv 1.358 18,42
3a FI Mult Cred Priv Ie 4.177 15,80
Moat Capital B Prev Fife FIA Master 8.244 13,63
Moat Capital FIA Master 327.090 13,49
Moat Mult Seg Prev Master FIA 6.379 13,29
Moat Prev Itau Master FIA 7.510 13,12
Moat Prev FIA 3.343 13,06
Sant Pb Stoic Acoes FI – Bdr Nivel I 1.805 12,81

Fonte: TC/Economatica. Posição em 30/09/22.

Leia mais:
Um dia após rombo de R$ 20 bilhões, debêntures da Americanas são negociadas com desconto de até 60%

Na avaliação da equipe de ações e de renda fixa da XP, as inconsistências contábeis podem levar a alterações relevantes nos indicadores de liquidez corrente (ativo circulante/passivo circulante) e de endividamento financeiro (dívida líquida/Ebitda).

Nos cálculos dos especialistas da corretora, a relação entre a dívida líquida e o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da Americanas poderia sair de 1,7 vezes no terceiro trimestre de 2022 para 8 vezes em uma reavaliação ao longo do mesmo período.

As simulações levam em conta uma análise proforma em que todo o impacto deve ser reconhecido de uma só vez, com aumento da dívida bruta no curto prazo de R$ 20 bilhões, conforme divulgado pela companhia – número ainda não foi auditado.

Além dos impactos no endividamento da companhia, os especialistas chamam atenção para as cláusulas restritivas (covenants) que a empresa possui em uma parcela pequena dos contratos de empréstimos e financiamentos – com foco em proteger os credores.

Nesse caso, o indicador máximo de endividamento financeiro permitido deve ser igual a 3,5 vezes (divida líquida/Ebitda). Se houver a reclassificação contábil, esse indicador pode chegar a 8 vezes.

“Quando isso ocorre, torna-se necessária uma renegociação junto aos credores, buscando um waiver [perdão] por um determinado período até que o indicador possa voltar à conformidade”, dizem os analistas. “Essa renegociação é realizada em troca de um pagamento aos investidores (waiver fee) e afeta a credibilidade da empresa no mercado”.

Do lado das ações, a avaliação de analistas da XP é que o cenário é incerto. Por isso, a recomendação foi mantida como “sob revisão”.

Mesmo depois da reunião feita com investidores hoje pela manhã, os especialistas da corretora destacaram que não há “visibilidade suficiente” para detalhar o impacto financeiro que as revisões devem ter nos números da empresa.

Os profissionais ressaltaram ainda que a revisão só deve ser publicada depois do processo de auditoria, o que pode adicionar mais risco e incerteza para a tese em Americanas.

Entenda o caso

A derrocada dos ativos ocorre após a divulgação, na quarta-feira (11), de inconsistências contábeis no valor de R$ 20 bilhões, num caso que culminou com a saída do presidente da Amereicanas, Sérgio Rial, e do diretor de relações com investidores, André Covre. Eles deixaram os cargos depois de apenas dez dias da posse.

Rial atuará ainda como assessor, apoiando os acionistas de referência da companhia no processo de apuração do ocorrido. O ex-CEO trouxe indicações sobre os próximos passos da companhia em conferência com investidores, em um contexto de diversas revisões de recomendações dos analistas de mercado, que destacam as grandes incertezas após o anúncio.

Na conferência com o mercado, Rial destacou que a empresa vai precisar se capitalizar para enfrentar problema contábil.

A operação provavelmente será um follow-on, mas o executivo diz que não é possível estimar a necessidade de capital. “Ninguém definiu o valor, até porque o número não foi auditado. Mas sabemos que não será uma capitalização de [apenas] milhões”, afirmou Rial. O executivo destacou o compromisso dos acionistas de referência Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira com o negócio. “Mas não pode ser a solução por si só. ‘Me dá um cheque e tá resolvido’, não é assim”, apontou.