Investidores pedem indenização de R$ 500 milhões da AMER3 em processo de arbitragem; como funciona?

Segundo especialistas, processo pode levar até dois anos; minoritários poderiam ainda processar empresa de auditoria PWC

Katherine Rivas

Os minoritários da Americanas (AMER3) estão se movimentando para tentar reaver prejuízos. Pelo fato de ser listada no Novo Mercado, segmento que concentra as companhias que cumprem certos requisitos de governança corporativa, uma saída para os pequenos investidores solicitarem indenização é a arbitragem.

O Instituto Íbero-Americano da Empresa – uma associação que reúne investidores e atua no mercado de capitais – ingressou, na quinta-feira (19), com um requerimento na Câmara de Mercado da B3, para que seja instaurado um processo de arbitragem coletiva contra Americanas e a 3G Capital – gestora de Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, acionistas de referência que possuem 30,13% de participação na companhia.

Segundo a coluna de Lauro Jardim, do jornal O Globo, o pedido é de uma indenização de R$ 500 milhões. Seria uma compensação financeira que corresponde à diferença entre o valor que a ação tinha antes da revelação da existência de inconsistências contábeis, e o preço atual do papel, depois da depreciação.

O portal E-Investidor informa que, para a associação, os investidores foram induzidos a erro na tomada de decisão, dado que informações contábeis são essenciais na comunicação da empresa com os seus investidores. “Se os números não condizem com a realidade, todo o processo decisório está contaminado”.

Já no caso dos acionistas de referência, a associação argumenta que as práticas de “risco-sacado” da companhia, que deram lugar ao rombo contábil, não poderiam ter acontecido durante tantos anos sem o conhecimento dos principais investidores.

Igor Bimkowski Rossoni, sócio da área de resolução de conflitos e arbitragem do Silveiro Advogados, disse ao InfoMoney que a opção pela arbitragem provavelmente tem a ver com as regras do Novo Mercado, que vedam processos judiciais envolvendo questões societárias (leia mais no quadro abaixo).

Segundo Rossoni, os processos de arbitragem costumam ser demorados, a depender da complexidade da causa, número de partes envolvidas e o tipo de apuração que vai ser necessário fazer. “Hoje é difícil ver processos dessa complexidade se encerrarem em menos de dois anos”, destaca.

De acordo com o Instituto Íbero-Americano, investidores têm o prazo de em média um ano para se unir ao processo, até os árbitros serem designados.

Se a causa for ganha, o montante de R$ 500 milhões será dividido entre os minoritários que participaram do processo de arbitragem.

Saiba mais:

Americanas: investidor pode buscar ressarcimento por prejuízo? Minoritários se unem em processos coletivos

Confira as respostas do advogado Igor Bimkowski Rossoni para algumas dúvidas sobre processos de arbitragem como o da Americanas:

 

O que é e como funciona o processo de arbitragem para acionistas minoritários?

O processo arbitral funciona como qualquer processo judicial. A diferença é que não se leva a demanda ao Judiciário, e sim a uma câmara arbitral.

O que é a cláusula compromissória e porque seria o único meio dos minoritários exigirem uma indenização no caso Americanas?

Para participar do Novo Mercado da B3, é exigido que conste dos estatutos sociais a submissão de qualquer controvérsia à arbitragem. Na prática isso significa que qualquer disputa dos acionistas com a companhia não ocorrerá no Judiciário. E o acionista, ao comprar uma ação da Americanas ou de qualquer outra companhia listada no Novo Mercado, automaticamente concorda com essa cláusula e só poderá propor demandas envolvendo a relação societária por meio da arbitragem.

A recuperação judicial de Americanas impede a arbitragem?

Não, a recuperação judicial não impede a propositura de demanda arbitral.

Quanto tempo em média demora para conseguir uma vitória em um processo de arbitragem contra empresas de capital aberto?

Tudo vai depender da complexidade da causa, número de partes envolvidas, tipo de apuração que vai ser necessário ser feita. Demandas mais complexas, com muitas partes, que demandam perícias complexas, tendem a demorar mais. Hoje, também há um prazo cada vez maior para constituição dos tribunais em razão de impugnações e impedimentos dos árbitros. Hoje é difícil ver processos dessa complexidade se encerrarem em menos de dois anos.

Podem participar da arbitragem todos os acionistas minoritários de AMER3 ou apenas aqueles que tinham ações antes do escândalo vir à tona?

No caso específico de Americanas, a princípio apenas aqueles que eram detentores da posição anteriormente à divulgação do fato relevante. Os que compraram ações depois já sabiam das inconsistências financeiras e o fizeram sabendo disso.

Quem comprou ADRs de Americanas no mercado americano no lugar das ações AMER3 também pode participar da arbitragem?

Essa vai ser uma questão a ser discutida, pois possivelmente haverá ações de responsabilidade também nos Estados Unidos. O que não pode acontecer é o investidor pleitear a indenização nas duas jurisdições, no Brasil e nos EUA, em razão do mesmo papel.

O sucesso da arbitragem depende do maior número de investidores minoritários participando?

A princípio, não. O direito é igual para um ou para todos. O que se verifica é que a reunião de minoritários dá maior fôlego financeiro ao grupo, pois dividem custos, possibilitando a contratação de melhores advogados e a produção de provas melhores e mais robustas.

A arbitragem é um processo caro?

Em casos como o da Americanas, em que estamos falando de cifras na casa de milhões, já há estudos que comprovam que a arbitragem acaba sendo mais barata que o processo judicial. A grande vantagem da reunião de acionistas minoritários está justamente numa maior representação e na possibilidade de dividir custos.

Os minoritários podem entrar com arbitragem exigindo indenização da empresa de auditoria PWC?

Sim, a PWC pode vir a ser responsabilizada, mas para isso é necessário a comprovação da falha na prestação de serviço.

Temos casos antigos de processos de arbitragem de minoritários no mercado de capitais?

Hoje, dois casos que ainda estão em curso são o da Petrobras e da JBS, que não tiveram desfecho. A partir deles, nós podemos vislumbrar alguns desdobramentos para o caso das Americanas. Um deles é a propositura de inúmeras ações de responsabilidade, muitas deles temerárias e apressadas, sem o devido cuidado.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.