Guru dos emergentes, Mark Mobius está otimista com Brasil e vê oportunidades em empresas de tecnologia e saúde na Bolsa

Em entrevista ao InfoMoney, Mobius recomenda alocação em ouro e se mostra cético com o avanço das criptomoedas, que considera "uma religião"

Mariana Zonta d'Ávila

Publicidade

As projeções mais pessimistas para o desempenho da economia brasileira em meio à piora de indicadores econômicos, alta dos juros e da inflação não têm afetado a confiança de um dos gestores mais otimistas com Brasil: Mark Mobius.

Em entrevista ao InfoMoney por telefone, direto de Dubai, Mobius – considerado um guru dos mercados emergentes – disse que mesmo diante de projeções mais fracas para a atividade brasileira em 2022, o mercado ainda oferece oportunidades, em especial na Bolsa, em companhias ligadas à tecnologia e à saúde.

Na carteira do fundo da gestora, o Brasil representa atualmente uma fatia de 5%, em linha com os níveis históricos.

Continua depois da publicidade

Segundo Mobius, um aumento da exposição ao País dependeria da qualidade dos ganhos dos ativos. “Se encontrarmos companhias com bons retornos de capital, baixa dívida e alto crescimento de lucro por ação (EPS), aí, claro, aumentaríamos [a posição]”, disse.

Entre os nomes brasileiros que compõem o portfólio estão empresas com Totvs ( TOTS3), Fleury (FLRY3), Lojas Americanas (LAME4; AMER3) e Yduqs (YDUQ3), segundo o site da gestora.

As duas maiores regiões no portfólio são Índia e Taiwan, cada uma com 20% de participação no portfólio. Demais regiões relevantes incluem Turquia, África do Sul, Vietnã e China.

Continua depois da publicidade

Leia também:

Durante a conversa, Mobius reforçou que as ações são os melhores ativos para se estar posicionado, desde que o investidor escolha nomes com perspectivas de crescimento dos ganhos. Em outras palavras, o objetivo deve ser o de buscar empresas que ajustem seus preços em meio à alta da inflação no mundo.

Grande defensor de ouro nos portfólios, Mobius voltou a recomendar alocação no metal precioso e se mostrou cético com o avanço das criptomoedas, comparando os ativos digitais à religião.

Publicidade

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

InfoMoney: O senhor costuma ser otimista com o Brasil. É possível estar otimista com o mercado brasileiro no contexto atual?

Mark Mobius: Sim, ainda há muito com o que estar otimista. Você percebe que a moeda não está tão ruim e que o mercado está em baixa, mas, principalmente, por conta das empresas large caps que representam a maior parte do índice [Ibovespa], ou seja, bancos, Petrobras e Vale, por exemplo, afetando o índice por inteiro.

Continua depois da publicidade

E o índice é acompanhado de perto pelos investidores, impactando a psicologia do mercado de forma geral. Mas, ao mesmo tempo, há uma série de companhias médias que não foram muito afetadas e que podem se sair bem.

IM: Do ponto de vista do mercado de ações brasileiro, o copo está meio cheio ou meio vazio? Há oportunidades?

Mobius: Sim, há oportunidades, é só uma questão de encontrar as companhias certas e garantir que os ganhos vão subir. Então há, definitivamente uma oportunidade, mesmo que o sentimento do mercado esteja negativo.

Publicidade

IM: Um grande setor do Ibovespa é o de commodities, que teve um boom recentemente. O senhor acha que é um padrão? Essas empresas devem continuar tendo uma boa performance?

Mobius: Claro. Essas empresas devem continuar se destacando, porque os preços das commodities devem continuar elevados. Mas temos visto que Petrobras, por exemplo, não têm apresentado um bom desempenho – mas isso tem mais a ver com a administração, por ser uma estatal.

IM: Então a agenda de privatizações seria algo positivo e para ficar de olho em 2022?

Mobius: Definitivamente. As privatizações são sempre algo positivo, porque significam que as companhias não estarão mais submetidas às decisões do governo. E como você sabe, qualquer coisa relacionada ao governo acaba caindo em questões como corrupção e diferentes tipos de problemas. Então, se você olhar de um ponto de vista ESG mais C [de cultura], é possível ver que as estatais seriam muito beneficiadas pela privatização.

IM: Os ruídos políticos mexeram com essas companhias ao longo do ano. Em 2022 temos as eleições presidenciais no Brasil. Como o ambiente eleitoral pode impactar o mercado de ações no país?

Mobius: O impacto pode ser grande. Eu lembro de quando o Lula foi eleito pela primeira vez e que o mercado estava preocupado, as ações caíram e todos acharam que o governo dele seria um desastre. Resultou que o Lula foi bom para o mercado e a principal razão para isso é que ele conduziu políticas sociais, de forma a melhorar as condições de vida e de educação da população de baixa renda. Qualquer candidato que siga essa estratégia deve se sair bem.

IM: É preciso entrar em 2022 de forma mais cautelosa nos investimentos, adicionando mais proteções ao portfólio dada a incerteza?

Mobius: Sim, com as eleições se aproximando, essa incerteza tende a afetar o mercado. Mas como eu disse, isso às vezes abre oportunidades para os investidores – caso eles consigam encontrar as ações corretas, com bom lucro por ação.

IM: E quais são essas empresas “corretas” no Brasil para se ter hoje na carteira? Quais o senhor tem no portfólio?

Mobius: Temos focado em empresas que usam software [tecnologia], além de empresas de varejo que usam a internet. Não estamos no setor bancário, nem no de mineração, estamos olhando mais para essas empresas nas quais a tecnologia tem tido um grande impacto.

IM: Tecnologia é o principal foco no Brasil. E nas outras regiões? Como estão as alocações?

Mobius: Sim, preciso mencionar também o setor de saúde, qualquer coisa relacionada à medicina no Brasil. E isso vale para nossas estratégias ao redor do mundo. Globalmente, temos grande exposição aos setores de software e tecnologia, bem como saúde, educação e produtos [consumer products].

IM: Uma das grandes preocupações hoje recai sobre o aumento da inflação e das taxas de juros ao redor do mundo. Qual sua opinião sobre isso e como esse cenário afeta os mercados emergentes?

Mobius: Com a maior oferta de dinheiro que temos visto, com um aumento da oferta de dólar americano em cerca de 30%, podemos esperar que os preços subam na mesma proporção. Também temos visto o preço das commodities subirem ainda mais. Por outro lado, a tecnologia tem feito os bens e serviços ficarem mais baratos, então isso tem contribuído para equilibrar.
Por um lado, temos o dinheiro ficando mais caro, levando a um aumento dos custos e, do outro, temos a tecnologia puxado os preços para baixo.

IM: O senhor prefere algum setor específico para usar como proteção no portfólio? Como os investidores podem proteger a carteira?

Mobius: O principal, como mencionei, é o crescimento dos lucros e da receita. E para isso, uma das formas é usar tecnologia de forma a aprimorar a eficiência, além da necessidade de prestar atenção às políticas ESG. Os riscos associados a questões ambientais, sociais e de governança devem ser monitorados, porque mostram como é a cultura da empresa – e se a atitude dos funcionários é positiva para a companhia.

IM: O senhor então tem esse cuidado, de investir em empresas com foco em ESG?

Mobius: Sim. Para cada companhia que analisamos avaliamos os critérios ESG e C, de cultura, também. Então se vemos que uma empresa tem problema com essas políticas, não investimos. Ou então, investimos se conseguimos aprimorar seu modelo de negócios.

IM: Recentemente, o senhor disse que as criptomoedas não são um investimento, mas uma religião. Por que o senhor diz disso?

Mobius: Simplesmente porque é preciso fazer uma pergunta: por que o preço das criptomoedas sobe? O único motivo para a alta é porque outras pessoas estão comprando. Se as pessoas pararem de comprar, os preços caem. Então não tem a ver com ganhos, nem dividendos, nem ativos, apenas com quem está comprando. É como uma religião.

IM: O ouro ainda é um bom ativo para se ter hoje?

Mobus: Sim, sempre, principalmente em momentos de maior volatilidade. É sempre bom ter [no portfólio] para emergências. Todo investidor precisa ter, no mínimo, 5% a 10% do portfólio alocado em ouro.

Oportunidade de compra? Estrategista da XP revela 6 ações baratas para comprar hoje. Assista aqui!