Fundos de renda fixa perdem para o CDI em janeiro com efeito Americanas e piora no mercado de crédito

Rentabilidade média de todas as 16 subclasses de fundos de renda fixa ficou abaixo da taxa de referência para o segmento; CDI rendeu 1,12% no mês

Bruna Furlani

Notas de Real (Marcelo Casal Jr / Agencia Brasil)

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A deterioração no mercado de crédito após a revelação da crise da Americanas (AMER3) – com a descoberta de dívidas de mais de R$ 40 bilhões da varejista – afetou em cheio o retorno de fundos de renda fixa no mês de janeiro.

A rentabilidade média oferecida por todas as 16 subclasses de fundos de renda fixa ficou abaixo da taxa do CDI (indicador de referência para a renda fixa), que rendeu 1,12% em janeiro.

No mês passado, excluindo as carteiras que alocam em títulos soberanos e possuem títulos de dívida externa, os fundos que mais sofreram foram os do tipo crédito livre, com duração baixa – que investem em títulos com prazo médio ponderado inferior a 21 dias úteis. Eles tiveram uma perda média de -0,47% em janeiro.

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Os dados são da Anbima (Associação Brasileira dos Mercados Financeiro e de Capitais).

Confira abaixo a rentabilidade dos fundos de renda fixa por subcategoria em janeiro de 2023:

Subcategoria do fundo de renda fixa Rentabilidade média em janeiro de 2023 (% ao mês)
Renda Fixa Simples 1,07
Renda Fixa Indexados 0,99
Renda Fixa Duração Baixa Soberano 1,06
Renda Fixa Duração Baixa Grau de Investimento 0,74
Renda Fixa Duração Baixa Crédito Livre -0,47
Renda Fixa Duração Média Soberano 1,10
Renda Fixa Duração Média Grau de Investimento 0,86
Renda Fixa Duração Média Crédito Livre 0,39
Renda Fixa Duração Alta Soberano 0,57
Renda Fixa Duração Alta Grau de Investimento 0,90
Renda Fixa Duração Alta Crédito Livre 0,61
Renda Fixa Duração Livre Soberano 1,03
Renda Fixa Duração Livre Grau de Investimento 0,93
Renda Fixa Duração Livre Crédito Livre 0,47
Renda Fixa Investimento no Exterior 0,46
Renda Fixa Dívida Externa -2,33

Fonte: Anbima 

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“Isso tem a ver com a deterioração do mercado de crédito. Houve uma contaminação após o evento Americanas. Outras empresas também começaram a ter problemas”, afirma Samuel Ponsoni, especialista em fundos.

O profissional observa que, antes do caso Americanas vir à tona, o spread médio (juros adicionais que um ativo de crédito oferece em relação ao dos títulos públicos, considerados de baixo risco) das debêntures com remuneração atrelada ao CDI era de CDI mais 1,8% ao ano no começo de janeiro. No fim do mês, o spread médio tinha subido para CDI mais 2,1%.

Ambos os dados foram retirados do índice criado pela gestora JGP para acompanhar o mercado de debêntures com retorno indexado ao CDI – o Idex-CDI.

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“Parece pouca coisa, mas já é suficiente para afetar os fundos. Quando a taxa acima do CDI aumenta, a rentabilidade dos fundos é prejudicada”, alerta Ponsoni.

A explicação é que os fundos têm o valor das cotas marcado a mercado – ou seja, atualizado de acordo com as condições vigentes de negociação dos ativos – diariamente. E quando há abertura (ou alta) nas taxas, os preços dos papéis de renda fixa que o fundo possui na carteira recuam. Isso afeta o retorno do produto.

Além dos problemas envolvendo a Americanas, Ponsoni lembra que outras empresas fizeram o mercado acender o sinal de alerta nos últimos dias.

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Como exemplo, há o caso da Light (LIGT3), que viu algumas de suas debêntures serem negociadas com deságios entre 50% e 75% na semana passada, segundo operadores de mercado. O motivo foi a contratação da Laplace Finanças para assessorar a empresa na análise de estratégias financeiras, visando, principalmente, melhorias em sua estrutura de capital.

O alerta veio porque a assessoria ficou conhecida anteriormente por atuar na recuperação judicial da Oi.

Leia mais:
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A companhia também teve sua classificação de risco de crédito (rating) rebaixada na semana passada. A Fitch Ratings, por exemplo, reduziu os ratings em escala nacional da Light e de suas subsidiárias (Light Sesa e Light Energia) de AA-(bra) para CCC(bra), além dos ratings dos instrumentos de dívida em moeda estrangeira e local, para CCC+/RR4 e CCC(bra).

Segundo a agência, o rebaixamento reflete “um risco de crédito substancial para a Light no pagamento pontual de principal e juros de suas obrigações após o anúncio de que havia contratado a Laplace Finanças com o objetivo de melhorar sua estrutura de capital, e a estratégia no mercado de crédito mais restritivo, devido à inadimplência da Americanas”.

Fora a Light, a CVC (CVCB3) emitiu fato relevante direcionado aos detentores das debêntures CVCB14, CVCB24 e CVCB15 na semana passada.

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No documento, a empresa disse que contratou a BR Partners para assessorar a empresa no “reperfilamento” da dívida a mercado. Na prática, diz Ponsoni, isso significa que a companhia terá que chamar os credores para tentar renegociar as dívidas para ter mais tempo para pagá-las.

“O cenário está mais adverso. Apesar dos fundos de renda fixa estarem se beneficiando da captação líquida positiva com a aversão a multimercados e fundos de ações, a rentabilidade deles está sofrendo”, alerta o especialista em fundos.

Captação dos fundos

Em janeiro, fundos de renda fixa terminaram o mês com uma captação líquida (depósitos menos resgates) de R$ 11,4 bilhões. Por outro lado, fundos de ações e multimercados acumularam saques líquidos de R$ 9,2 bilhões e de R$ R$ 17,6 bilhões, nessa ordem.

Em carta divulgada a clientes, a Ibiuna Investimentos destacou que o grande medo das gestoras de crédito era de que o mês de janeiro fosse marcado por mais saques do que depósitos após o caso da Americanas, o que não ocorreu.

“Olhando para o mês no retrovisor, o medo do que poderia vir foi maior do que a realidade. Sim, foi um mês muito difícil, mas, em geral, o mercado absorveu a pancada e com intenção de recuperar esse impacto pelas vias necessárias”, afirmou a gestora no documento.

A casa ponderou que a grande maioria dos fundos detinha posições de até 3% dos produtos nos papéis da Americanas, o que deve permitir que o calote possa ser absorvido pelos produtos ao longo do ano. “O alto patamar do CDI também contribuiu muito para que a cota ‘absorvesse’ um pedaço do default [calote] sem comprometer o resultado do fundo”, observou.

Na avaliação da Ibiuna, a batalha será longa com a Americanas, mas outra situação também preocupa. A gestora chama atenção para o fato de que algumas empresas contrataram assessores para melhorar a estrutura de capital e reestruturar suas dívidas nos últimos dias.

Diante do cenário mais conturbado, a Ibiuna alerta que segue com a estratégia de manter mais caixa do que o usual, dado que vê espaço para ajuste de preço e possível piora no fundamento das empresas.

Números da indústria de fundos em janeiro

Além do efeito negativo sobre os fundos de crédito, produtos que investem em direitos creditórios (FIDCs) foram destaque em termos de resgates líquidos. Tais fundos ficaram em terceiro lugar entre os que tiveram maior volume de resgates líquidos em janeiro, no valor de R$ 5,6 bilhões, atrás apenas de fundos de ações e multimercados.

ETFs (fundos de índice) vieram na sequência com captação negativa de R$ 3,9 bilhões, seguido por fundos cambiais, com resgates líquidos de R$ 164,3 milhões.

Por outro lado, fundos de previdência e fundos que investem em participações (FIPs) terminaram o mês no campo positivo com depósitos líquidos de R$ 321 milhões e de R$ 80,1 milhões, respectivamente. Os dados são da Anbima.