Franklin Templeton: sinalização de Bolsonaro é “conclusão positiva” e pode indicar “equilíbrio de Poderes” a estrangeiro

Para Marcus Vinicius Golçalves, CEO da gestora no Brasil, importa ao investidor externo saber se a lei funciona e que não haverá mudanças no caminho

Bruna Furlani

Crédito: Divulgação

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SÃO PAULO – A piora do cenário político-institucional que o país viveu com mais intensidade nesta semana exigiu certo “sangue frio” de investidores e fez o mercado pedir prêmios de risco cada vez maiores diante do aumento da instabilidade local.

Ainda que analistas estejam se questionando se a paz selada entre o Executivo e o Judiciário pode ser duradoura ou não, a avaliação do investidor estrangeiro é que a nota divulgada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na última quinta-feira (9) mostra a “conclusão positiva de uma situação que foi certamente ruim”.

A análise é de Marcus Vinicius Gonçalves, CEO da Franklin Templeton no Brasil, gestora internacional que possui pouco mais de R$ 8 bilhões sob gestão local e está entre as maiores do mundo. Gonçalves concedeu entrevista ao InfoMoney na última sexta-feira (10).

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Para Gonçalves, a postura do presidente mostra que o país segue com “equilíbrio de poderes” e “regras funcionando bem”. “O investidor estrangeiro precisa saber se a lei funciona e se não vai ter nenhuma mudança no meio do caminho. Se tiver uma sinalização de solidez e de credibilidade, isso deve atrair capital”, pondera.

Ao falar sobre reformas, o executivo diz que o cenário não é muito animador para a aprovação de pautas importantes e de impacto fiscal, como a reforma administrativa. Mas afirma que vê uma chance de aprovação na reforma do Imposto de Renda porque há interesses de grupos influentes em jogo.

Sobre o cenário de Bolsa, o CEO pontua que a gestora foi às compras recentemente e que vê momentos de crise como esse como boas oportunidades de entrada, especialmente porque os preços das ações seguem bastante atrativos e porque o país pode atrair capital em um cenário de retomada global.

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Gonçalves afirma ainda que diante da piora no cenário local tem se dedicado a olhar com maior atenção a investimentos alternativos, ou seja, que possuem baixa correlação com índices tradicionais, especialmente nos setores de serviços públicos, imobiliário e de infraestrutura.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

A nota enviada pelo presidente da república nesta semana pregou um tom mais conciliador entre os Poderes. Que impactos essa postura pode trazer para o cenário econômico daqui pra frente?

Acredito que a nota é uma sinalização positiva. Olhando pelo copo meio cheio, talvez isso tudo fortaleça ainda mais as instituições. Talvez os investidores estrangeiros fiquem mais convencidos de que o Brasil é um bom investimento a longo prazo, à medida em que conseguirmos superar essas intempéries. Nós estamos longe de ter uma definição, especialmente com a aproximação das eleições, mas no fim das contas pode ser uma boa referência pra investidores externos de que aqui existe um equilíbrio de Poderes, de que aqui as regras estão funcionando bem.

Quando fazemos investimentos em países emergentes como um todo, a primeira e principal discussão que a gente tem é o chamado “rule of law“, que é a regra da lei. O investidor estrangeiro precisa saber se a lei funciona e se não vai ter nenhuma mudança no meio do caminho. Se tiver uma sinalização de solidez e de credibilidade, isso deve atrair capital. E eu acho que tudo isso que aconteceu agora é a conclusão positiva de uma situação que certamente foi ruim em todos os sentidos.

A aprovação de reformas importantes e com impacto fiscal deve ser mesmo postergada diante dessa crise? Ou pautas importantes, como a reforma do IR ainda podem ser aprovadas neste ano?

As sinalizações recentes foram negativas, com o risco de rompimento do teto e toda a questão [de atraso no pagamento] dos precatórios. Nós ficamos um pouco desapontados com esses sinais e os preços do mercado refletem um pouco isso. O que seria importante nas reformas é uma sinalização de integração, de que o Brasil está olhando para as boas práticas internacionais, seguindo o exemplo do que foi feito com a lei da liberdade econômica.

Ainda assim, a leitura que temos é a mesma do consenso [de mercado] e que aponta que não existe ambiente agora. Acho que se existir uma brecha talvez a reforma do Imposto de Renda ainda consiga passar porque ela tem teses que são de interesse de alguns grupos fortes. Mas para o investidor tudo está muito aquém do esperado. Acho que o texto não foi bem discutido. Não houve participação da sociedade.

As perspectivas de crescimento estão menores e a inflação oficial está mais disseminada entre os segmentos. Nesse cenário, o que o investidor deve esperar para o desempenho da Bolsa? 

Acredito que é preciso esclarecer dois pontos. A Bolsa está interessante em termos de preço, e olhando para frente, o Brasil é uma posição atrativa em um ciclo de retomada global que se avizinha, com a pandemia ficando pra trás ou com as vacinas ajudando a ter uma vida mais normal. Existe um espaço grande para o país ser relevante. Mas quem dá a tônica é o investidor brasileiro por estar vivendo isso no dia a dia.

Ainda assim, no curto prazo, o cenário é de taxas de juros mais altas, percepção de avanço da inflação e de reformas que vão decepcionar, além de uma eleição a caminho, o que deve trazer volatilidade para a Bolsa.

Mas se o investidor tiver apetite e estômago, os sinais são bons olhando pra frente. Os desempenhos devem seguir bons, a precificação é atraente e o real deve se apreciar.

A Bolsa brasileira está com preços atrativos frente os pares, mas o que vai fazer com que o investidor estrangeiro venha em peso? 

Acredito que a dinâmica acaba sendo moldada pelo investidor local. Isso porque o estrangeiro não enxerga o que acontece aqui de forma tão clara. Logo, o investidor local é quem vai dar a primeira pernada para depois o estrangeiro vir. Outro fator é a percepção de que as reformas que vão ser aprovadas vão facilitar o investimento global. Acho que ainda não temos isso muito claro. Há ainda o fato de quanto mais empresas internacionais voltarem a abrir escritórios aqui, isso tende a colocar o Brasil de novo no radar. Se olharmos para o setor automotivo, por exemplo, nós vimos a saída de várias empresas de peso neste ano. Isso tira o país do ambiente de negócios.

E o que deve fazer o investidor local voltar com mais força para a bolsa? 

Os riscos nunca vão se dissipar. Nós temos que lidar e administrar os riscos. O investidor deve voltar com mais peso quando perceber que o quadro vai evoluir. Por exemplo, o BC joga o juros pra cima e a inflação responde [é controlada], a economia cresce e, em seguida, a demanda reprimida e os investimentos começam a voltar. Não acredito que uma terceira via em termos de candidatos à presidência vai fazer com que ele volte. Outra questão são as sinalizações positivas vindas de reformas. Mas, nessa altura do campeonato, não acho que há mais muito apoio para aprovar pautas importantes, como a reforma administrativa.

Como está a visão da gestora sobre o câmbio? 

O cenário-base é de apreciação do real frente o dólar. Acreditamos que o dólar pode ir para R$ 5, considerando o diferencial de taxa de juros e o diferencial de inflação. O real depreciou muito mais do que outras moedas de emergente e, em nosso cenário-base, acreditamos que o BC [Banco Central] vai ser capaz de controlar a inflação. Mas a depender das eleições, o dólar pode ir a R$ 6 diante de um cenário político mais turvo com candidatos com discurso mais populista e antimercado.

O mercado e o Banco Central têm uma visão bastante diferente sobre a direção que os juros devem seguir. A Franklin Templeton acredita que as taxas de juros estão descalibradas? 

O nosso call [visão] para a Selic até o fim do ano foi recentemente alterado para 9%. Com isso, seriam mais três altas de 125 pontos-base até dezembro. Os principais motivos estão ligados ao fato de que a inflação corrente está acima do esperado e a tese de que o aumento de preços é temporário vem perdendo força. Há ainda a crise hídrica no radar que deve pressionar os preços administrados ao longo de 2022, assim como possíveis pressões políticas contra a alta de juros no ano que vem que podem fazer com que o Banco Central queira fazer esse movimento de alta já neste ano.

O BC quando foi chamado a agir, agiu e vai continuar agindo para controlar a inflação. Eu acho que ele não vai perder a credibilidade. Ele sabe o que está fazendo. Penso que a autoridade monetária não jogou os juros lá pra cima logo porque quando isso ocorre, a dívida pública também fica mais cara.

Falando sobre retomada econômica, alguns fundos da casa parecem bem posicionadas para aproveitar a recuperação da economia. O que está sustentando essa tese, já que tivemos revisões para baixo nas projeções de crescimento? 

Recentemente, um dos riscos que ganhou maior dimensão foi a crise hídrica, que é um fator importante nas estimativas de crescimento da economia. Existem várias incertezas de qual é o tamanho dessa crise. Mas a nossa leitura é que ainda que o Produto Interno Bruto (PIB) caia, a gente está comprando empresas de qualidade. Há empresas que podem ganhar mercado nesse cenário. Momentos como esse de realização e de crise são ótimos para entrar.

Isso significa que recentemente a gestora foi às compras?

Prefiro não falar de setores porque ainda estamos montando a posição, mas temos aproveitado o momento para comprar e, por enquanto, não vimos nenhum movimento forte de resgate dos fundos com posição em bolsa. Meu conselho para quem investe é ter paciência e diversificar. Outro ponto que o investidor deve ter atenção nesse momento é com os custos envolvidos. Há muito gestor que cobra taxas de performance que não condizem com os benchmarks [taxa de referência que o fundo deve seguir]. É preciso ver o retorno e ver se realmente vale.

Quando o assunto é diversificação, qual é a preferência? 

Nós temos olhado bastante investimentos alternativos, ou seja, em ativos que têm baixa correlação com índices tradicionais. O foco maior está no setor de utilities [concessões públicas], real estate [mercado imobiliário] e infraestrutura. Além disso, temos investido em empresas focadas em tecnologia e inovação, como por exemplo algumas que ajudaram a desenvolver as vacinas contra a Covid. Companhias que não são tão fáceis de acessar aqui do Brasil. Com isso, o investidor também fica exposto a variação cambial.

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