A renda variável enfrentou um cenário desafiador em 2022, com juros elevados, inflação, eleições e incertezas fiscais. Apesar disso, os Fiagros, fundos que investem nas cadeias agroindústrias, conseguiram se destacar e fecharam o ano com um retorno médio em dividendos de 1,27% ao mês.
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Levando em conta a isenção de tributação, o dividend yield médio dos Fiagros listados na Bolsa foi de 1,49%, equivalente a 133% da taxa do CDI (principal referência para aplicações de renda fixa).
Um levantamento exclusivo de Anna Clara Tenan, especialista em Fiagros da Órama, para o InfoMoney revela que 18 Fiagros negociados na Bolsa brasileira apresentaram um dividend yield médio mensal superior a 1% neste ano.
O campeão de 2022 foi o CPTR11, da gestora Capitânia, que entregou um dividend yield médio mensal de 1,64%. Na segunda posição está o VGIA11, com um retorno médio mensal de 1,53%, seguido pelo EGAF11, com 1,52%. O cálculo considerou a cotação dos fundos em 19 de dezembro.
Confira os detalhes abaixo:
Fiagro | Gestora | Dividendos pagos em 2022 (por cota) | Dividendos mensais médios (por cota) | Dividend yield mensal médio |
CPTR11 | Capitânia Investimentos | R$ 9,43 | R$ 1,57 | 1,64% |
VGIA11 | Valora Investimentos | R$ 1,66 | R$ 0,15 | 1,53% |
EGAF11 | Eco Agro | R$ 13,63 | R$ 1,51 | 1,52% |
FGAA11 | FG/A Gestora | R$ 1,44 | R$ 0,14 | 1,48% |
DCRA11 | Devant Asset | R$ 1,02 | R$ 0,13 | 1,39% |
XPCA11 | XP Asset Management | R$ 1,45 | R$ 0,13 | 1,39% |
LSAG11 | Leste | R$ 11,75 | R$ 1,47 | 1,35% |
GCRA11 | Galapagos Capital | R$ 12,82 | R$ 1,28 | 1,33% |
VCRA11 | Vectis Gestão | R$ 8,30 | R$ 1,38 | 1,32% |
RZAG11 | Riza Asset Management | R$ 1,36 | R$ 0,12 | 1,31% |
KNCA11 | Kinea Investimentos | R$ 14,28 | R$ 1,30 | 1,24% |
JGPX11 | JGP | R$ 12,61 | R$ 1,15 | 1,20% |
NCRA11 | NCH Capital Brasil | R$ 11,08 | R$ 1,01 | 1,18% |
OIAG11 | Fator ORE | R$ 0,68 | R$ 0,11 | 1,12% |
PLCA11 | Genial Investimentos | R$ 4,09 | R$ 1,02 | 1,11% |
AGRX11 | Exes Gestora de Recursos | R$ 0,44 | R$ 0,11 | 1,05% |
SNAG11 | Suno Asset | R$ 4,20 | R$ 1,05 | 1,04% |
RURA11 | Itaú Asset Management | R$ 0,91 | R$ 0,10 | 1,01% |
BBGO11 | BB Asset Management | R$ 7,43 | R$ 0,68 | 0,87% |
HGAG11 | HGI Capital | R$ 2,44 | R$ 0,61 | 0,60% |
Fonte: Órama com dados da Quantum Axis. Data base: 19/12/2022
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Retorno de 1% ao mês
Embora os Fiagros tenham apenas pouco mais de um ano de vida – foram regulamentados provisoriamente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em julho de 2021 e chegaram à Bolsa em outubro – o crescimento foi exponencial. Segundo o Boletim CVM do Agronegócio, até setembro de 2022 existiam 66 Fiagros registrados, sendo 37 operacionais. Eles somavam património líquido de R$ 7 bilhões, e cinco Fiagros possuíam mais de 15 mil cotistas.
O grande destaque foram os Fiagros do tipo FII, que reproduzem a estrutura dos fundos imobiliários – especialmente os de “papel”, que atraíram os pequenos investidores dada a distribuição polpuda de dividendos. Há ainda Fiagros que investem em direitos creditórios (do tipo FIDC) e em participações (do tipo FIP), embora ambos sejam destinados a investidores qualificados (com mais de R$ 1 milhão em aplicações financeiras) e negociados no mercado de balcão.
Anna Clara destaca que muitos Fiagros nasceram com estratégia semelhante à dos FIIs de CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), que investem em papéis que pagam juros prefixados mais a variação de um indicador de inflação, como o IPCA. A diferença é que os Fiagros apostam nos CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) indexados ao CDI, que acompanha a trajetória da Selic, taxa básica de juros.
Com a Selic chegando aos atuais 13,75% ao ano, alocar em papéis atrelados ao CDI era um diferencial para os Fiagros na comparação os FII de CRI, já que a inflação passou a arrefecer em meados deste ano, avalia Anna Clara.
Em janeiro, quando havia apenas nove Fiagros listados, 95% das carteiras ofereciam rendimento equivalente a CDI mais spread (taxa adicional) de 5,24% ao ano, em média. Em novembro, o rendimento de 91% dos Fiagros era de CDI mais spread de 4,91% ao ano, em média.
“Quando a Selic é menor, o spread tende a subir. Agora, estamos no caminho oposto, com o spread reduzindo”, diz Maria Fernanda Violatii, analista de fundos imobiliários e fundos listados da XP. Além disso, a queda pode estar relacionada também à maturidade do mercado, com gestores buscando operações mais seguras e créditos de melhor qualidade, com taxas de remuneração menores. Anna Clara reforça que spreads na casa dos 5% ainda são atrativos.
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Dividendos seguirão elevados em 2023?
Os Fiagros ainda devem entregar dividendos robustos em 2023, na visão das analistas, superando 1% ao mês. Para a XP, a Selic deve se manter elevada até o fim do próximo ano, podendo haver aumento nos juros no curto prazo. “A Selic e o CDI só devem reduzir a partir de 2024, mas ainda permanecerão em dois dígitos. 2023 será um ano favorável para os Fiagros”, afirma Maria Fernanda.
Para a Órama, a Selic deve fechar 2023 em 11,75% ao ano. Nesse patamar, Anna Clara avalia que os Fiagros poderiam continuar rendendo mais de 1% ao mês. “Só a rentabilidade do CDI das carteiras já seria próxima de 1% ao mês. Considerando o spread médio de 4,91%, estaríamos falando de um dividend yield de mais de 1,30%”, calcula.
Os dividendos de Fiagros são isentos de Imposto de Renda – desde que os fundos tenham cotas negociadas na Bolsa ou no mercado de balcão organizado, com no mínimo 50 cotistas. “Eles devem pagar rendimentos acima dos FIIs em 2023”, destaca Anna Clara.
Até abril, a CVM deve publicar a regulação definitiva dos Fiagros, que deve unificar os três tipos (FII, FDIC e FIP), possibilitando que os gestores mesclem diferentes estratégias de investimento nos mesmos fundos.
Para Maria Fernanda, a regulação deve ajudar a reduzir os custos, o que permitira elevar a rentabilidade dos cotistas. Um exemplo é a possibilidade de os fundos investirem em CPR Financeira (Cédula do Produtor Rural), mais simples que um CRA e não demanda securitizadora.
Os Fiagros que mais pagaram dividendos em 2022
O Fiagro que apresentou o maior retorno com dividendos em 2022 foi o CPTR11, com uma média mensal de 1,64% e distribuições de R$ 1,57 por cota. Segundo Anna Clara, a carteira está 73% alocada em ativos com retorno de CDI mais 5%, enquanto 27% estão em papéis que pagam IPCA mais 8% ao ano. Ela explica que o fundo é diversificado, com exposição a diversas culturas e com risco moderado.
O fundo é negociado na Bolsa desde junho. Segundo a analista, de julho a setembro, o CPTR11 chegou a pagar dividendos de R$ 1,75 por mês, pela distribuição de lucro acumulado. Depois, a remuneração passou a ser de cerca de R$ 1,40, em base recorrente.
Na segunda posição está o VGIA11, da Valora, com um dividend yield médio mensal de 1,53% e distribuições de R$ 0,15 por cota ao mês. Anna Clara destaca que o fundo tem uma carteira que remunera a CDI mais 5,5% ao ano, o que dá lugar a um dividendo recorrente de R$ 0,14 por cota.
Segundo ela, a Valora é uma casa reconhecida no mercado de crédito que possui vários fundos imobiliários populares entre os investidores de varejo. “O Fiagro tem liquidez elevada, negociando quase R$ 2 milhões por dia”, diz. Esse aspecto, segundo ela, ajudou no crescimento do fundo, que tem valor de mercado de quase R$ 700 milhões. “É um dos três maiores Fiagros do mercado”, afirma.
De acordo com Anna Clara, a carteira tem risco moderado e é focada em crédito para várias cooperativas e distribuidoras, com operações pulverizadas. A gestora também origina muitos dos CRAs, destaca ela.
Na terceira posição está o EGAF11, que apresentou dividend yield médio mensal de 1,52%, distribuindo R$ 1,51 por cota ao mês. Diferentemente da maioria dos Fiagros, o fundo faz pagamentos trimestrais. Anna Clara explica que isso ocorre por conta das operações da carteira, com fluxo semestral ou anual. “Tem muita relação com a safra”, diz.
Ela explica que a carteira do EGAF11 tem um retorno de CDI mais 5,3% ao ano, com perfil de risco moderado. A analista destaca a ampla experiência da gestora EcoAgro na originação de CRAs, antes mesmo da criação dos Fiagros.
Segundo Anna Clara, o fundo trabalha com revenda e lastro corporativo, ou seja, com empresas que compram insumos e os distribuem a vários produtores, com faturamento entre R$ 100 milhões e R$ 500 milhões. “Embora, a revenda dependa dos produtores para pagar a dívida, quem é responsabilizado pelo crédito é a empresa”, explica.
E os riscos? Investidores estão de olho
Um tipo de fundo novo com dividendos elevados desperta dúvidas entre os investidores sobre a sustentabilidade do nível de retorno dos Fiagros e as possíveis mudanças com a regulação definitiva da CVM.
O engenheiro agrônomo Tjiago Gavansky, de Guarapuava (PR), começou a investir no Fiagro RZAG11, da Riza Asset, há quatro meses para diversificar a carteira. Mas diante de um dividend yield médio mensal de 1,31% e com recordes de produção de trigo, milho, soja e algodão em 2022, ele questiona se os dividendos realmente podem aumentar em 2023. Ele teme os impactos de possíveis invasões de terras ou de novos impostos que venham a ser aplicados ao agronegócio.
Já Daniel Salles, analista de sistemas e educador financeiro de Jacareí (SP), investe nos Fiagros RZAG11 e VGIA11 há três meses e se preocupa com a possibilidade de taxação dos dividendos dos fundos em uma eventual reforma tributária. “Isso diminuiria a motivação dos investidores para um mercado que acabou de começar”, comenta. Ele se mostra preocupado ainda com os juros elevados e o risco de crédito.
Gavansky e Salles gostaria que a nova regulação da CVM permitisse o acesso dos investidores de varejo às três categorias de Fiagros (FII, FDIC e FIP). “Acho que todos os mercados devem ser abertos, os riscos devem ser claros e cada um, responsável pelas suas ações”, destaca Salles.
Anna Clara, da Órama, destaca que a inadimplência é um risco latente dos Fiagros, dada a persistência dos juros elevados. Em dezembro, um dos fundos que mais pagou dividendos – o LSAG11 – apresentou problemas com devedores. “É importante alocar em fundos com empresas mais robustas, que consigam pagar o custo da dívida”, aconselha.
Contudo, Anna Clara acredita que o agronegócio é um setor resiliente a momentos de dificuldade na economia, principalmente porque o Brasil é um grande exportador. “É diferente no mercado imobiliário, mais cíclico”, diz.
Os juros elevados também podem ocasionar a diminuição do número de ofertas, segundo a analista, para quem os Fiagros cresceram aquém do potencial em 2022 dado o cenário macroeconômico – o que deve se manter nos primeiros meses de 2023. “Os gestores vão segurar as ofertas até que seja publicada a nova regulação dos Fiagros”, diz.
Maria Fernanda, da XP, destaca que com uma indústria em consolidação, os gestores terão o desafio de estruturar operações mais transparentes e com melhores garantias. Apesar da nova regulação permitir uma exposição marginal dos fundos a FDICs e FIPs, a analista ainda acredita que o CRA seja o grande destaque das carteiras.
Segundo a CVM, até setembro, o CRA era o principal ativo investido pelos Fiagros, com R$ 3,2 bilhões alocados, principalmente nos que replicam a estrutura de FIIs. 96% dos CRAs eram concentrados em poucos devedores.