“Americanas não é vítima e sim corresponsável da fraude com diretores”, afirmam minoritários

Instituto busca reunir acionistas lesados nos próximos 60 dias para indenização pelos danos

Katherine Rivas

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Uma luz no fim do túnel surgiu para os investidores minoritários de Americanas (AMER3). A companhia divulgou nesta terça-feira (13) um fato relevante em que afirma que suas demonstrações financeiras foram fraudadas pela diretoria anterior, conforme prova relatório preliminar de assessores jurídicos.

O relatório indica, ainda, a participação na fraude do ex-CEO Miguel Gutierrez, dos ex-diretores Anna Christina Ramos Saicali, José Timótheo de Barros e Márcio Cruz Meirelles, e dos ex-executivos Fábio da Silva Abrate, Flávia Carneiro e Marcelo da Silva Nunes.

O reconhecimento da fraude e a menção de “possíveis culpados” fortalece um processo arbitral de investidores minoritários, liderado pelo Instituto Ibero-Americano da Empresa – uma associação que reúne investidores e atua no mercado de capitais.

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A demanda é contra a Americanas e os sócios da 3G capital –  gestora de Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, acionistas de referência da companhia – e tramita na Câmara de Mercado da B3 desde o dia 19 de janeiro.

Rafael Mortari, advogado do Instituto Empresa e sócio do escritório Mortari Bolico, defende que o problema não é exclusivamente a citação das pessoas no fato relevante e sim da menção da Americanas como empresa, por ter contratado esses diretores e por uma falta de mecanismos de controle e governança. “A empresa não pode se fazer de vítima, ela é corresponsável pela fraude praticada durante vários anos pelos mais altos cargos da companhia”, aponta.

Para Mortari, isso ratifica e fortalece que os acionistas minoritários precisam ser indenizados no processo arbitral em andamento, mas nada muda com relação aos responsáveis pela reparação, que seguem sendo Americanas e os sócios controladores.

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“É muito fácil querer responsabilizar as pessoas físicas que não têm patrimônio suficiente para ressarcir um rombo de R$ 40 bilhões”, pontua. “A empresa tem 100% de responsabilidade, não apenas uma parcela. Contudo, ela tem todo o direito de pedir ressarcimento dos prejuízos a esses diretores”, destaca.

Indenização

O processo arbitral movido pelo Instituto Empresa tem um valor simbólico inicial de R$ 500 milhões, mas Mortari explica que a indenização poderá ser ajustada e vai considerar a perda que os investidores tiveram com a desvalorização das ações, além de danos acessórios que englobam desde recursos que o acionista deixou de ganhar no mercado se tivesse as informações verdadeiras sobre a companhia até efeitos na vida pessoal dos investidores em decorrência da perda de patrimônio.

“No processo contra IRB surgiram muitos relatos de divórcios, tentativas de suicídio, situações que ultrapassam a barreira do financeiro e isso está aparecendo também no caso Americanas”, comenta Mortari. “Sobre os valores que o investidor deixou de ganhar, comparamos sempre com o desempenho do Ibovespa ao longo dos anos da fraude”, completa.

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O processo arbitral ainda pode reunir novos investidores enquanto os árbitros não forem designados, com a duração do trâmite mudando dependendo do caso. Mortari, no entanto, espera que o tribunal seja formado nos próximos 80 ou 120 dias. “No mínimo, temos dois meses para reunir mais acionistas minoritários lesados”, diz.

Quem tem direito?

O Instituto Empresa solicitou recentemente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a lista de todos os investidores da Americanas em janeiro de 2023, data de divulgação de fatos relacionados à fraude nos balanços.

Mortari explica que o Instituto já tinha feito esta solicitação à Americanas por meio da Lei de Sociedade por Ações, mas sem sucesso. Houve também a tentativa de reunir os investidores por meio de um site criado pelo Instituto, que foi derrubado pela varejista com alegação de emprego indevido do termo “Americanas”.

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“Trata-se mesmo de algo muito grave, porque fere o direito político dos acionistas exercerem suas pretensões e reclamações”, explica Mortari.

Com a lista solicitada, o Instituto pretende entrar em contato com cada investidor minoritário, apresentando a eles as medidas em andamento para que eles optem ou não por reaver seus direitos. “Tem muito investidor que acha que dá para fazer nada, outros que estão reclamando na via judicial de forma errada, sendo que a via correta é a arbitral”, comenta.

A união de investidores minoritários não apenas fortaleceria o processo como auxiliaria na divisão de custos, tendo em vista que processos arbitrais são onerosos e podem chegar a custar cerca de R$ 2 milhões. A hora de trabalho do árbitro, por exemplo, custa cerca de R$ 850, e cada processo requer três árbitros.

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Podem participar deste processo de arbitragem os investidores que tinham ações AMER3 até o dia 11 de janeiro, antes da divulgação do fato relevante da Americanas, independentemente se mantêm os papéis em carteira ou se os venderam depois, com prejuízo. O número de ações é indiferente, mas será necessário o investidor fazer a conta dos custos.

A indenização, em caso de vitória dos minoritários, será distribuída entre os participantes, proporcionalmente.

Mortari destaca ainda que, embora não tenham sido citados no fato relevante como responsáveis, Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira seguem sendo demandados pelo processo arbitral com o intuito de ressarcir a companhia. “O valor ressarcido pelos controladores vai dar fôlego para a Americanas indenizar seus acionistas”, comenta.

“Lockup”

Os bilionários Lemann, Sicupira e Telles, da 3G Capital, aceitaram ficar um período de cerca de três anos com restrição na venda de ações (lockup) da Americanas, segundo informações da Bloomberg.

O acordo que envolve Lemann e os demais acionistas da Americanas faz parte de um plano de reestruturação da varejista.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.