A teia da gestora de criptoativos da Faria Lima alvo da PF

Polícia Federal aponta elo entre gestora regulada pela CVM e empresa que deve milhões a investidores

Lucas Gabriel Marins

Publicidade

O caso da gestora de criptoativos Titanium Asset, com sede na região da Faria Lima, em São Paulo (SP), afastada de seus fundos após operação da Polícia Federal, ganhou novos contornos nos últimos dias: uma nova empresa acusada de fazer parte do mesmo grupo suspendeu saques e fez investidores assumirem prejuízo que, em alguns casos, passa de R$ 1 milhão, apurou o InfoMoney.

Uma empresa chamada Sbaraini Capital, de Curitiba (PR), interrompeu saques no final de novembro, em situação que veio à tona nos últimos dias em meio a queixas dos clientes. No mês passado, o negócio foi um dos alvos da operação Ouranós da Polícia Federal, que buscava desarticular organização criminosa que opera estrutura semelhante à pirâmide financeira.

Em documento ao qual a reportagem teve acesso, a PF diz que a Sbaraini faz parte do mesmo grupo econômico da Titanium Asset. As empresas negam ligação, mas documentos mostram elo entre os sócios das companhias.

Continua depois da publicidade

Em nota, a Sbaraini Capital defende que o bloqueio dos saques foi motivado por um pedido exarcerbado de autoridades. “Após acesso aos processos, reiteramos nosso entendimento de que a dúvida que embasou a investigação é precipitada e exarcebada, pois já havia sido enfrentada e arquivada em procedimentos que tramitaram diante da própria CVM e do BCB (Banco Central). Importante ressaltar que a Sbaraini Capital não foi representada criminalmente por ‘pirâmide financeira’”.

Procurada, a Comissão de Valores Mobiliários (CMV) disse que não comenta casos específicos. No entanto, informou que a Sbaraini Capital é alvo de dois processos. Conforme informações públicas, o primeiro foi encerrado. O segundo, de 27 de janeiro de 2023, continua aberto. É preciso entrar com pedido de vistas para ter acesso aos autos.

Na investigação, a PF alega que a empresa fazia parte de um esquema que consistia em captar R$ 1 bilhão de 7 mil investidores, por meio de oferta pública de contratos de investimento coletivos (CIC), para aplicação em suposta arbitragem de criptoativos, com remunerações fixas e variáveis, sem autorização dos órgãos competentes.

Continua depois da publicidade

“Meu assessor perdeu R$ 1,6 milhão”

O InfoMoney conversou com dois clientes com dinheiro preso na empresa, que pediram anonimato. Um deles é investidor há mais de dois anos, e tem R$ 100 mil congelados. “Tem gente com valores de milhão para cima. Espero resgatar meu dinheiro, que juntei para ter como reserva de segurança. Tem gente desesperada, algumas nem contaram para a família ainda”.

Outro investidor disse que aportou aproximadamente R$ 240 mil entre setembro e dezembro de 2021. “Tive movimentações recorrentes seja para pegar parte do dinheiro para trocar meu carro, como para suprir gastos que surgiam. Meu assessor acredita que em 90 dias teremos definições melhores ou mesmo a liberação, só que ele não me promete nada. Ele também tem dinheiro bloqueado, cerca de R$ 1,6 milhão”.

Nas últimas duas semanas, pelo menos 30 pessoas relataram no Reclame Aqui que não conseguem reaver os valores investidos. Há ainda diversos comentários semelhantes em redes sociais e grupos de conversa. A Sbarani Capital não deu prazo para resolver o bloqueio e disse que a situação depende de fatores judiciais externos. A empresa não revelou o total bloqueado e o número de pessoas lesadas alegando sigilo judicial e comercial.

Publicidade

Miscelânea de CNPJs

A Sbaraini (que antes se chamava MK) tem capital social de R$ 1 milhão e é administrada pelo empresário Eduardo Sbaraini, segundo dados da Receita Federal. Junto com a Titanium Asset, fazem parte de um grupo econômico chamado “Grupo MK”, afirma a PF em relatório acessado pelo InfoMoney, que faz parte da investigação contra supostas pirâmides financeiras. Um material publicitário e um documento interno vistos pela reportagem também mostram a relação entre as empresas e os empresários.

Claudio Miguel Miksza Filho e Guilherme Bernert Miksza, sócios da Titanium, também aparecem como fiadores da Sbaraini Capital por meio de um contrato firmado por uma terceira empresa chamada Manhattan Crédito e Caução, com sede em Goiânia (GO). A dupla é alvo de execução de título extrajudicial para obrigar o pagamento no valor de R$ 29 milhões a 71 investidores

Em nota, a Titanium contesta a versão da PF e diz não faz parte do mesmo grupo econômico que a Sbaraini. Alega que o empresário Cláudio Miksza Filho vendeu empresa que deu origem à Sbaraini Capital em 30 de junho de 2021, “como comprovam documentos que estão em posse da PF”. Também afirma que a relação de fiador “ocorreu apenas nos seis meses seguintes, período contratual de transição”.

Continua depois da publicidade

Em 2019, os donos da Titanium fizeram negócios com o empresário Claudio Oliveira, conhecido como “Rei do Bitcoin“, condenado e preso em 2022 por estelionato e crimes contra o sistema financeiro nacional. Eles alegam que na verdade foram vítimas do criminoso.

Leia mais:

Ação coletiva

Para o advogado Artêmio Picanço, especialista em blockchain e combate a golpes financeiros e fundador do Instituto Brasileiro de Prevenção a Golpes financeiros (IBPGO), os documentos levantados sobre o caso indicam que havia promessa de rentabilidade por meio de arbitragem de criptoativos em contratos de investimento coletivo (CIC), o que tem oferta vedada sem devida autorização da CVM. O advogado sinalizou que pretende abrir uma ação coletiva sobre o caso.

Publicidade

Para evitar golpes com criptomoedas, Picanço ressaltou que o investidor precisa checar se a companhia que pretende investir possui registro ou dispensa de registro da CVM para atuar no mercado, além de “requerer o histórico da operação, preferencialmente com possibilidade de validação ‘on-chain‘ (na blockchain) das atividades econômicas realizadas”.

Lucas Gabriel Marins

Jornalista colaborador do InfoMoney