Riachuelo traz ex-PicPay para modernizar serviços financeiros da Midway

Francisco Santos, que já foi de Cielo e Itaú, usará dados para fazer ofertas otimizadas de crédito, seguros e assistência para 31 milhões de clientes

Rikardy Tooge Raquel Balarin

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Manequins e banquinhas espalhadas pelo andar, discussões sobre tendências da moda e cores da estação agora fazem parte da vida de Francisco Santos, o novo diretor executivo do grupo Guararapes (GUAR3), controlador da Riachuelo. Santos, que vem do PicPay, é a grande aposta do grupo para alavancar os negócios da Midway, a empresa de serviços financeiros do grupo que tem uma carteira de crédito de R$ 5,6 bilhões e opera um total de 30 milhões de cartões Riachuelo.

Com passagens também por Santander (SANB11) e Itaú (ITUB4), Santos foi, na Cielo (CIEL3), um dos responsáveis por desenvolver a solução de pagamento via WhatsApp em 2020 – a solução foi suspensa logo na sequência por decisão do Banco Central, que naquele momento estava prestes a lançar o PIX.

Para o executivo, os anos de experiência em fintech, adquirência e bancão dão a ele as condições necessárias para o que o mercado chama de “destravar valor” da Midway. “Nós passamos pelo processo de ser um segmento dentro da Guararapes muito preso às estruturas de uma varejista. Também tentamos alçar voo para ser um banco digital [projeto que foi deixado de lado], mas entendemos que o meio do caminho é o ideal para nossa estratégia”, disse o novo head da Midway, que concedeu sua primeira entrevista no cargo ao InfoMoney.

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A estratégia para alavancar os negócios está centrada na operação integrada entre loja e financeira e no alto grau de conhecimento do cliente, mais os pesados investimentos em tecnologia. O executivo acredita, por exemplo, que pode aumentar em até 55% o número de clientes que parcelam a fatura do cartão se a eles forem oferecidas condições diferenciadas de acordo com o perfil.

“O cliente pode não ter como pagar toda a fatura agora, mas é melhor pagar uma parte e renegociar do que ficar inadimplente”, diz Santos, ressaltando que a operação integrada permite que ele tenha dados sobre frequência de compras, produtos adquiridos, hábitos e pontualidade no pagamento.

Essa base de clientes e dados, avalia Santos, é um grande trunfo não só para oferecer renegociação da fatura do cartão, mas também empréstimos e serviços personalizados para cada tipo de cliente. “Na minha experiência, vi que outras financeiras de varejistas, ligadas a bancos, eram muito engessadas na oferta de crédito, não diferenciavam os perfis. Aqui, posso ter uma precificação diferente e uma rentabilidade diferente de acordo com o cliente.”

Francisco Santos, diretor executivo da Midway
Francisco Santos, diretor executivo da Guararapes (Divulgação)

O uso da inteligência de dados é, na opinião do executivo, um aliado importante na política de concessão de crédito em um cenário tratado por ele como “desafiador”. Com o rápido ciclo de alta de juro, que elevou a taxa básica Selic a 13,75% ao ano, inflação e o desarranjo provocado pela pandemia, 29,6% das famílias brasileiras estão com contas de consumo ou de dívidas atrasadas, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). É o maior percentual da série histórica iniciada em 2010.

Diante da escalada, a Midway vem se protegendo de eventuais calotes. No primeiro semestre do ano, a financeira provisionou R$ 347 milhões para perdas – no mesmo período do ano passado, a empresa fez reversão da provisão em R$ 140 milhões. A política de concessão de crédito está mais conservadora e o executivo admite que o público com perfil mais arriscado “irá sofrer”.

“Nós começamos a enxergar uma luz no fim do túnel, mas o cenário ainda é desafiador e exige muita cautela. As coisas tendem a melhorar e queremos dar fôlego para nossos clientes até lá”, pontua o diretor executivo da Guararapes.

No segundo trimestre do ano, a receita líquida da Midway chegou a R$ 567,1 milhões, com alta de 44,2% sobre igual período de 2021. Por outro lado, as despesas financeiras subiram 280% no período, para R$ 33,8 milhões. O aumento de despesa somado à alta provisão de perdas acabou gerando um prejuízo líquido de R$ 7 milhões, ante lucro líquido de R$ 63,6 milhões no segundo trimestre do ano passado. A empresa divulga os resultados do terceiro trimestre de 2022 no próximo dia 9 de novembro.

Retomada do consumo

Francisco Santos indica que já é possível notar alguma melhora no consumo advinda do incremento no Auxílio Brasil, que passou de R$ 400 para R$ 600 ao mês em agosto. Ele argumenta que existe um natural delay entre a implementação da política pública até que ela chegue à ponta consumidora, mas o sinal gera otimismo para 2023.

Outra expectativa gira em torno do último trimestre deste ano, que junta eventos importantes para o varejo, como o Dia das Crianças, a BlackFriday, a Copa do Mundo e o Natal. No varejo como um todo, a estimativa é de que 30% das receitas venham deste período do ano.

Apesar de uma expectativa de alívio pontual, o executivo crê que as condições vão melhorar mesmo a partir da segunda metade do próximo ano. “O primeiro semestre de 2023 será duro, mas o segundo tende a ser melhor, caso nenhum problema externo afete mais o Brasil”, diz. Ele acrescenta que esta perspectiva se encaixa seja quem for o candidato vencedor do segundo turno das eleições presidenciais, marcado para 30 de outubro.

Alavancas de negócio

O executivo da Midway reforça que a empresa busca fazer os ajustes necessários na operação a partir de agora para conseguir surfar a retomada do consumo esperada para o próximo ano. E vê três grandes forças para o grupo: o cartão de crédito, que é o carro-chefe da financeira, a oferta de empréstimos e, por fim, a venda de seguros e assistência.

Para ajudá-lo na empreitada, está trazendo três executivos: Norberto Sanchez, ex-Cosan (Oxxo Pay), que assume o cargo de superintendente executivo de crédito; Vitor Ramos, ex-Cielo, que será o superintendente de produtos e Paulo Soares, ex-PicPay, que assumirá o planejamento.

Além de contar com as 20 milhões de pessoas que passam pelas lojas Riachuelo e os 30 milhões de cartões da marca (17 milhões deles aptos a fazer transações), outra alavanca para os negócios vem dos 2 milhões de clientes da conta digital do grupo. Esse nicho é visto como uma interface para a oferta de produtos da Midway. Cerca de 24% dos R$ 143,9 milhões em empréstimos concedidos pela financeira da Guararapes no segundo trimestre deste ano surgiram por meio do app – que também permite a renegociação de dívidas de forma online.

No ano, as ações GUAR3 acumulam queda de 8,7%, cotadas a R$ 8,81 por volta das 15h20. A XP indica o papel para compra, com valor potencial de R$ 15 por ação, já o Santander mantém recomendação neutra, com expectativa de R$ 11,20 por ação.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br