Perda de R$ 5 bi em um dia e a questão do mercado: o que fazer com as ações da BRF?

Analista recomenda não ficar posicionado em BRF em meio à tamanha incerteza do mercado com a empresa, que dá mais um sinal de perda de credibilidade

Lara Rizério

Planta da BRF (Divulgação)

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SÃO PAULO – Podia ficar pior para a BRF (BRFS3)? Quem viu o desempenho da ação e o noticiário das últimas semanas da companhia talvez duvidasse que o cenário tão ruim poderia ficar ainda mais turvo para os papéis da dona da Sadia e da Perdigão após a empresa registrar um prejuízo superior a R$ 1 bilhão em 2017.  

Mas sim, podia ficar pior – e muito. A deflagração nesta segunda-feira (5) da nova fase da Operação Carne Fraca, a Trapaça, atingiu em cheio a BRF, com a prisão do seu ex-presidente Pedro Faria, assim como o ex-vice presidente Hélio Rubens Mendes dos Santos Júnior. Com isso, as ações fecharam em queda de 19,75%,  R$ 24,75, levando a uma perda superior de R$ 5 bilhões de valor de mercado em apenas uma sessão. 

De acordo com os representantes da Polícia Federal e do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), do Ministério da Agricultura, executivos da BRF tinham conhecimento de alterações que ocorriam para burlar a fiscalização e a atuação do Ministério da Agricultura.

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O grande problema estava relacionado às ocorrências (e ocultações) relacionadas à salmonela. Apesar de não configurar em si risco à saúde pública em razão da forma de cozimento, as omissões de ocorrência da bactéria e até troca de resultados [sobre a presença do patógeno em amostras]” em laudos laboratoriais entregues pela BRF levaram a deflagração da operação. O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical), defende que, ao ser identificada a salmonela, é preciso que ocorra uma série de procedimentos dentro de granjas e nos produtos, com objetivo de garantir a segurança alimentar do consumidor.

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Na Operação deflagrada pela PF nesta segunda, foi constatado que  cinco laboratórios e setores de análises da BRF fraudavam resultados de exames. De acordo com o delegado da Polícia Federal, Maurício Moscardi Grillo, as provas nos e-mails coletados mostravam que as fraudes ocorreram entre 2012 e 2015 e que burlar regras sanitárias é “estratégia” da empresa. “Uma funcionária do setor de controle qualidade é questionada por uma colega sobre o [suplemento alimentar para frangos] Premix. Ela pergunta se não é possível adequar o produto ao que manda a lei. A resposta é ‘Sim, é possível. Mas é a estratégia da empresa agir dessa forma’”, disse o delegado em entrevista à imprensa nesta segunda-feira para falar sobre a “Trapaça”.

A deflagração da Lava Jato não poderia ocorrer em um momento mais delicado para a companhia. Nesta segunda-feira, o Conselho de Administração da companhia faria (até segunda ordem) a reunião que traria a definição do novo conselho de administração da companhia, em meio à disputa entre os acionistas que ficou ainda mais aberta após a divulgação no último dia 22 de fevereiro do prejuízo bilionário de 2017.

Uma das “culpadas” para esse resultado negativo foi justamente a Operação Carne Fraca, que teve a sua primeira etapa deflagrada em março de 2017. “Enfrentamos um dos momentos mais desafiadores da indústria de alimentos com a deflagração da Operação Carne Fraca, a qual impactou dezenas de empresas do setor, incluindo a BRF, principalmente para o mercado internacional”, disse José A. Drummond Jr., Diretor Presidente Global, no release de resultados. Segundo a empresa, aproximadamente 50% do balanço foi afetado pela operação. Isso porque a Carne Fraca levou ao fechamento de muitos mercados, gerou descontos nos preços de exportação e causou transtornos na cadeia de produção. Nesta segunda, três plantas de ave da BRF  (Rio Verde, Mineiros e Carambeí), foram alvos da Carne Fraca. 

Desta vez, a operação pode ser ainda mais negativa para a companhia, que foi o foco da operação (em comparação às 30 companhias alvo na Carne Fraca do ano passado), com a BRF também devendo sofrer muitos problemas de imagem, conforme avalia o analista Raul Grego, da Eleven Financial. 

Os analistas ainda mostram muitas incertezas sobre a companhia e ainda estão em modo de espera para revisar as suas estimativas para o papel. Porém, se é possível apontar uma direção, é de que a Tarpon (TRPN3), acionista da BRF e de onde Pedro Faria veio para assumir a presidência da companhia, está bastante enfraquecida e será mais “fácil” haver uma troca total no Conselho da empresa. 

“Os acionistas Petros e Previ [que têm deflagrado uma verdadeira queda de braço com Abilio Diniz, atual presidente do Conselho de Administração] apresentaram nomes fortes para o Conselho, o que é positivo. Contudo, é difícil que o novo Conselho trata resultado no curto prazo. Ou seja, não deve mudar muito o sentimento do investidor”, afirma Grego. De qualquer forma, a mudança do Conselho pode ser melhor do que “não fazer nada”, já que sinaliza pelo menos que haverá alguma alteração na BRF, que tanto vem sofrendo com a descrença dos investidores. 

O que fazer com a ação?

O resultado do quarto trimestre já parecia ser a “gota d´água” da companhia e, na sessão pós-divulgação do balanço (23), os papéis fecharam em queda de 8,33%, a R$ 28,40. Porém, a ação engatou um movimento de ganhos, com cinco sessões seguidas de alta acumulada de 8,59%, com o mercado vendo uma “luz no fim do túnel” para a empresa e esperando os próximos passos sobre as mudanças do Conselho de Administração e já enxergando os papéis mais atrativos após a derrocada recente. 

Contudo, o cenário parece ter ficado mais nebuloso após essa nova fase da Carne Fraca. O analista da Eleven recomenda não ficar posicionado no ativo, principalmente por que ainda é muito cedo para dizer quais serão os impactos na empresa. Ainda mais porque, pelo que pôde ser observado, se o impacto desta operação for parecido com a da Carne Fraca no ano passado, tanto o operacional quanto a imagem da empresa serão bem impactados. 

Com uma visão similar, os analistas do BB Investimentos apontam que estão revisitando as estimativas e preço-alvo para a BRF.

“É mais do que provável que rebaixemos nossa recomendação, pois temos uma baixa visibilidade e muita incerteza, neste momento, em torno de desenvolvimentos adicionais sobre assuntos, tais como: (i) o resultado da Assembléia Geral Extraordinária envolvendo mudança no Conselho, o que atrasa as discussões estratégicas num momento em que o mercado espera que a empresa recupere os ganhos e apresente desalavancagem, e (ii) o resultado das investigações que devem afetar os resultados operacionais da BRF e que possam levar a embargos para a carne brasileira (mais uma vez)”.

Neste contexto, o BB Investimentos aponta que a BRF deve permanecer sob pressão nas próximas semanas, ao longo de novidades sobre o tema. 

Desta forma, muitas incertezas tornam o cenário ainda mais difícil para a BRF. Mas algo é certo: se já era difícil para a empresa reconquistar a credibilidade do mercado, agora ficará muito mais. 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.