“Medo de perder o emprego”: nos EUA, funcionários relatam dia a dia em varejistas com surto de coronavírus

Alguns funcionários revelam pânico por lidarem com muitas pessoas todos os dias e receio de contrair o vírus

Giovanna Sutto

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SÃO PAULO – Em uma das unidades da Target, varejista americana, no estado de Michigan, nos EUA, um funcionário do departamento de eletrônicos parou de cumprimentar seus clientes favoritos com apertos de mão e abraços em meio à crescente ameaça do coronavírus, e começou a se preocupar com o que aconteceria se ficasse doente.

“O funcionário não é pago se faltar e eu não tenho como perder um dia de trabalho”, contou o funcionário em entrevista ao site Business Insider.

Do outro lado do país, em Oregon, Robert Davis, gerente do Walmart, está cada vez mais preocupado com a probabilidade de exposição ao vírus nas prateleiras de seu trabalho em uma unidade da empresa.

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“Estamos em contato com centenas de pessoas toda semana, é um risco. Estou preocupado com o que minha família faria se acontecesse algo comigo. Isso pesa muito em mim”, afirma.

À medida que o número de casos de coronavírus nos EUA aumenta, alguns consumidores estão passando em lojas e comprando uma série de mercadorias impulsionados pelo pânico, incluindo máscaras, álcool em gel para as mãos e utensílios domésticos.

Enquanto isso, os funcionários do varejo estão trabalhando para reabastecer as prateleiras e ajudar os clientes.

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Ao mesmo tempo, muitos deles enfrentam suas próprias ansiedades em relação à exposição ao vírus no trabalho e sofrem com a possibilidade de serem punidos se denunciarem clientes doentes devido às políticas de atendimento.

O Business Insider entrevistou 20 trabalhadores do varejo de 13 estados nos EUA. Onze trabalham na Target, nove no Walmart e um na CVS, subsidiária da empresa americana de varejo e assistência médica CVS Health.

Alguns desses trabalhadores pediram para permanecer anônimos nesta história por medo de retaliação do empregador. Nesses casos, o site não revelou as identidades.

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Ambiente de trabalho conturbado

No Walmart, as ausências de funcionários são gerenciadas por um sistema de pontos. Os trabalhadores podem acumular cinco pontos em um período de seis meses, e um ponto é igual a um dia de folga.

Oito trabalhadores disseram que temem adoecer e perder o trabalho com esse sistema, apesar de um memorando recente do Walmart orientar os funcionários a ficar em casa quando doentes.

“Se você ficar doente, nossa política de atendimento é extremamente rigorosa e uma boa dose de gripe pode acabar com o seu trabalho”, disse uma funcionária de um Walmart de Oregon que pediu para permanecer anônima. Como resultado, muitas pessoas trabalham doentes.

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“Desde que o surto com o coronavírus foi se intensificando tivemos pessoas chegando ao trabalho tão doentes que praticamente caíam”, contou. Ela acrescentou que tem usado uma máscara para trabalhar todos os dias nas últimas duas semanas.

Um trabalhador de uma loja do Walmart em Missouri é um exemplo: admitiu ir trabalhar enquanto estava doente.

“Se eu ficar doente, ainda trabalho porque não posso me dar ao luxo de ficar em casa, ser acusado de ter um vírus e não ser pago”, disse o funcionário que também pediu para permanecer anônimo. “Se eu tiver febre, eles me enviarão para um departamento diferente.”

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Este é um problema enfrentado por muitos trabalhadores do varejo. Mas uma porta-voz do Walmart disse ao site que a empresa está monitorando de perto a situação e ajustará as políticas conforme necessário.

“Sempre que há eventos extremos ou desastres naturais, monitoramos de perto o que está acontecendo em nossas comunidades e ajustamos as operações e políticas comerciais, como dispensar ausências, conforme apropriado – o coronavírus não é diferente”, disse ela.

Se os funcionários estiverem doentes, eles não devem se apresentar para o trabalho, segundo a porta-voz da varejista.

“Sempre que nossos associados não estiverem se sentindo bem, queremos que fiquem em casa e temos opções para administrar as faltas”, disse. “Se um funcionário acredita que pode ter contraído a Covid-19, não deve trabalhar. Queremos que os funcionários se concentrem em sua saúde. Além disso, também oferecemos opções de agendamento flexíveis que permitem que nossos funcionários troquem turnos com colegas de trabalho, quando necessário”, acrescentou.

A Target enviou um e-mail para os gestores de lojas nos EUA na manhã da última terça-feira (3), instruindo-os a não mudar nada sobre o funcionamento das lojas, apesar dos crescentes receios resultantes da disseminação do coronavírus.

Como resultado, os funcionários abaixo do nível gerencial disseram que se sentiam confusos e no escuro devido à falta de comunicação da parte superior.

“Não recebi nenhuma comunicação da gerência sobre como lidar com o coronavírus”, afirmou um funcionário da Target em Seattle, que acrescentou estar nervoso por trabalhar em um estado que atualmente está enfrentando um surto do coronavírus.

Um funcionário do Walmart no Alabama, que também pediu para não ser identificado, disse que está preocupado em pegar o vírus no trabalho porque ele limpa os banheiros da loja e lida com o lixo. “Me assusta que alguém possa entrar infectado e a loja possa fechar temporariamente. Não posso perder uma semana de pagamento no momento”, explica.

Lisa Baker trabalha em uma loja do Walmart no Alabama e disse que está atualmente de licença médica após uma cirurgia relacionada ao câncer. Ela disse que está preocupada com o retorno ao trabalho após a quimioterapia, que pode ter um impacto severo na imunidade.

Vários trabalhadores disseram em entrevista ao site que desejam que seus empregadores lhes forneçam luvas e máscaras, mesmo que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) não recomende o uso geral de máscaras para pessoas saudáveis.

Demanda crescente vs. estoque

Os trabalhadores do varejo também estão sob uma pressão adicional de um ambiente de trabalho mais movimentado do que a média, com os consumidores estocando itens essenciais em antecipação a um surto potencialmente mais amplo do coronavírus.

Um funcionário da CVS em Rhode Island descreveu o ambiente da loja como um “pânico leve” e disse que uma “onda” de pessoas vinha chegando para receber a vacina contra a gripe.

Um porta-voz da empresa confirmou que as farmácias e clínicas do grupo estão atualmente administrando um número maior de vacinas contra a gripe para esta época do ano.

“Estamos monitorando ativamente o ambiente em busca de riscos relacionados à COVID-19, enquanto desenvolvemos planos no local de trabalho para ajudar a garantir que nossos funcionários permaneçam seguros e saudáveis”, disse o porta-voz da CVS.

Um segundo funcionário da Target também na área de Seattle disse que alguns clientes estão ficando chateados com a falta de estoque de alguns itens, já que a loja tenta lidar com a crescente demanda de determinados produtos.

“Já é estressante trabalhar em um ambiente movimentado de varejo, esse pânico só piora as coisas.”

Em resposta à solicitação de comentários do Business Insider, a Target enviou os comentários do CEO Brian Cornell feitos na teleconferência de resultados da empresa na terça-feira (3).

“Na Target, priorizamos nossa equipe, começando por garantir que todos os membros de nossa equipe na China possam trabalhar em casa. Em termos gerais, passamos um tempo considerável focado na melhor maneira de apoiar os membros de nossa equipe em todo o mundo para garantir que eles permaneçam saudáveis ​​e seguros”, afirmou o executivo.

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Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.