Colunista InfoMoney: As decisões intuitivas

Um taco e uma bola custam R$ 1,10. O taco é R$ 1 mais caro que a bola. Quanto custa a bola? Estudantes responderam que a bola custava dez centavos

Jurandir Sell Macedo Jr

Um taco e uma bola custam R$ 1,10. O taco é R$ 1 mais caro que a bola. Quanto custa a bola?

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Shane Frederick, um dos mais próximos colaboradores do professor e teórico de finanças comportamentais Daniel de Kahneman, fez esta pergunta a estudantes das Universidades de Princeton e de Michigan. Metade dos estudantes de Princeton e 56% dos estudantes de Michigan responderam prontamente que a bola custava dez centavos.
Mas por que pessoas tão qualificadas como estes estudantes erraram ao responder um problema tão simples?
Este exemplo serve para distinguir raciocínio e racionalidade. No conceito de raciocínio, há a ideia de atividade, de funcionamento cerebral. Mas o raciocínio é neutro em relação aos critérios de exatidão ou de conformidade. Já a racionalidade evoca a obediência a normas lógicas.

“A percepção nem sempre é processada pelo sistema racional”

No exemplo da bola e do taco, os estudantes usaram o raciocínio para dar a resposta. Para mais da metade dos estudantes, este raciocínio sofreu um viés: um real mais dez centavos é igual a um real e dez centavos (1 + 0,10 = 1,10). Nós, humanos, cometemos constantemente vieses e manifestamos tendências em nossos julgamentos e decisões.
Se o raciocínio e a racionalidade são respostas deliberadas da cognição humana, existem ainda outras respostas do sistema cognitivo. Na escala das decisões, existem aquelas tomadas de forma automática – trocar a marcha do carro para um motorista experiente – mas também outras baseadas nos julgamentos intuitivos, onde o sistema cerebral entra em funcionamento deliberado tentando, mas não conseguindo, respeitar normas lógicas.
Os julgamentos intuitivos ocupam uma posição intermediária entre os processos automáticos e aqueles baseados no raciocínio e na racionalidade. A característica central dos julgamentos intuitivos é a sua acessibilidade, ou espontaneidade. Compreenderemos a intuição quando compreendermos porque certos conteúdos são acessíveis e outros não.
Muitos conteúdos não são acessíveis no momento da tomada de decisão porque não foram processados pelo sistema cognitivo, mas apenas percebidos. Temos, então, a divisão entre os sistemas cerebrais da percepção e da cognição. A intuição está profundamente calcada na percepção, e a percepção nem sempre é processada pelo sistema racional.
Desta maneira, muitos dos nossos julgamentos que buscam racionalidade deixam de levar em consideração as percepções. Ainda assim podem ter sofrido vieses, como no caso do exemplo inicial e, portanto, não representam uma decisão exata.
Muitas pessoas que se enganaram na resposta à pergunta sobre o taco e a bola relataram que a intuição indicava que algo estava errado. Mas, como utilizavam o raciocínio, confiaram na decisão, sem levar em conta que ela poderia estar incorreta.
Portanto, descartar as decisões intuitivas, porque elas não estão calcadas na racionalidade, pode ser um grave erro daqueles que não entendem o funcionamento do cérebro humano.
A propósito, para atender à equação, a bola deve custar R$ 0,05. Se a bola custasse R$ 0,10 e o taco custasse R$ 1, o taco seria apenas R$ 0,90 mais caro que a bola.

Jurandir Sell Macedo Junior é doutor em Finanças, professor da UFSC e escreve mensalmente na InfoMoney, às quartas-feiras.
jurandir.macedo@infomoney.com.br

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