Brasil precisa se inserir no mundo, defende presidente da Whirlpool América Latina

João Carlos Brega defende engajamento da sociedade e diz que 2019 vai ser um ano de forte demanda para os eletrodomésticos, seja qual for o presidente 

Equipe InfoMoney

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Publicidade

A sociedade precisa tomar consciência de que é necessário agir para o País se tornar mais competitivo nos mercados internacionais. Para isso, é importante diminuir o tamanho do Estado, e que ele deixe de competir com a iniciativa privada em setores como o de aeroportos. Além disso, deve seguir exemplos como o da Colômbia, que melhorou a segurança e reduziu a burocracia para as empresas. Essa é a receita para o crescimento de João Carlos Brega, presidente da Whirlpool América Latina desde 2012.

Fabricante das marcas Brastemp, Consul e KitchenAid, a companhia tem mais de 60 anos de Brasil e é líder na chamada linha branca (geladeiras, lavadoras e micro-ondas). O Brasil é um dos principais mercados da empresa no mundo, representando quase 25% das vendas globais. O lucro líquido em 2016 alcançou R$ 312 milhões, acréscimo de quase 9% em relação a 2015.

Bacharel em Administração de Empresas e pós-graduado em Finanças pela FGV, Brega está desde 1995 no grupo, onde já presidiu a divisão de compressores, a Embraco. É responsável pelas unidades na Argentina, Chile, Peru, Guatemala, Equador, Colômbia, Porto Rico, República Dominicana e Miami. Administrar a operação em tantos locais é um desafio em termos de produtividade, em razão das diferenças nas normas e no ambiente de negócios dos diferentes países, tema que concentra a atenção do executivo. Ele foi o curador do Fórum de Competitividade do LIDE, em outubro, em São Paulo.

Continua depois da publicidade

LIDE – A recessão afetou especialmente os fabricantes da chamada linha branca. A crise ficou para trás?

JOÃO CARLOS BREGA – A crise está afetando todos os setores, em especial o de bens duráveis, que inclui a linha branca. Ela é suportada pelo financiamento, então, quando tem desemprego, automaticamente a demanda cai. Há duas alavancas de demanda. A primeira é de reposição, que no nosso caso são produtos essenciais – quebrou o fogão, você tem de comprar outro. E tem a planejada – não vou me casar agora, mas daqui a seis meses. Essa planejada foi a que mais sofreu. Voltamos aos níveis de 2007. No nosso caso ainda não acabou. Entendemos que bateu no piso no terceiro trimestre deste ano. Daí não passa, pela lei da física, porque não pode ir abaixo do chão. E por que tem essa demanda de reposição. Ela vai continuar até o fim do ano que vem pois o nível de desemprego vai continuar elevado. Acreditamos que 2019 vai ser um ano de crescimento muito grande para a linha branca.

Isso não depende de quem vai ganhar as eleições?

Independe, porque nós continuamos com 200 milhões de habitantes. Essa demanda planejada, com o passar do tempo, acaba virando reposição. Uso muito o exemplo da Argentina ou da Colômbia. A Argentina está crescendo este ano 20%. Ainda tem uma inflação alta, de 15%, e desemprego. Mas tem um fator novo, uma atmosfera de esperança. Aqui, [a retomada] vai ser sustentável dependendo das reformas, mas a partir de 2019 eu não tenho dúvidas de que haverá um crescimento de dois dígitos para o nosso mercado. Em 2018, ainda vai andar de lado. Pode ter um pequeno crescimento, mas nada que vá mover nossa curva.

A Whirlpool tem lançado produtos. Isso foi estratégia para atravessar o período da crise?

Não, é uma estratégia de longo prazo. Temos quatro pilares estratégicos – liderança de marca, liderança de produto, excelência operacional e de pessoas. Investimos nas marcas e nos produtos de 3% a 4% ao ano. Somos pagos para administrar uma inequação: curto prazo e longo prazo. Fizemos ajustes de otimização de custos ao longo destes três, quatro anos de recessão. Mas nenhum que tenha maculado o nosso pilar estratégico e a nossa capacidade de crescer. Em agosto, fizemos o maior lançamento da Brastemp em quantidade de produtos. Isso foi decidido dois anos atrás, no meio da crise. São coisas que você não sacrifica, senão perde o longo prazo. Não tenho dúvidas de que vamos sair muito mais fortes nesse pico que vai acontecer em 2019. A posição relativa de tamanho de mercado da Whirlpool no Brasil nunca foi tão alta.

Quais são os planos de investimentos da Whirpool? Qual é o volume de investimentos?

Posso falar que é de 3% a 4% do nosso faturamento de uma forma consistente. Tem ano que vai para 3%, 4%, 4,5%, mas fica sempre nisso.

O Brasil aparece mal em todos os rankings de competitividade. O que pode ser feito?

Primeiro, entendemos que esse é um problema nosso, e não é do outro. Acho que esse é um momento positivo, a sociedade está tomando consciência de que tem de fazer alguma coisa. É um trabalho de médio e longo prazo, mas primeiro você tem de se conscientizar de que precisa mudar. Não existe uma bala de prata para resolver. O tamanho do Estado tem de ser revisto. Precisamos de uma agenda consistente, em que o Estado esteja em segurança, saúde e educação. Não precisa estar em aeroportos. Estabelece as regras, mas não precisa competir com a iniciativa privada. O problema é que temos um Estado rico e uma sociedade pobre, e tem de ser o inverso.

A Embraco é a segunda empresa brasileira que mais registra patentes nos EUA, atrás apenas da Petrobras. O que garantiu essa performance?

Primeiro, é um time muito valente. A fábrica do Brasil abastecia os Estados Unidos. Aí o Brasil começou a crescer. E a gente começou a falar: “Puxa, precisamos de mais produção. Onde vou investir? Ah, Brasil, mas espera aí! Para exportar? Para que eu tenha de mandar minha mercadoria para o porto 15 dias antes de passar o navio? Para um porto que não tem calado ou que está com uma greve? Vou ter que exportar PIS e Cofins? Não”. Abrimos uma fábrica no México, deve ter cinco, sete anos. O Brasil não é a última bolacha do pacote. A gente tem de se inserir no mundo, tem de abrir e falar: a regra é essa. A Embraco fez geração de conhecimento. Tem acordo com universidades, uma que é referência para nós no mundo, como a Universidade Federal de Santa Catarina. Mas também temos acordo com a Universidade de Monterrey (México), com a Universidade de Pequim… Patrocinamos 45 professores ao redor do mundo.

Reduzir a burocracia pode impulsionar a venda externa de bens duráveis? Poderia dar exemplos?

Existe uma agenda macroeconômica, mas existe também uma agenda microeconômica, muitas vezes de política tributária. Vou dar um exemplo da burocracia, e não é Estados Unidos. Abrimos recentemente uma fábrica de lavadora de roupas na Colômbia. É a mais moderna da Whirlpool no mundo – não em quantidade, mas em processo industrial. Estávamos importando uma máquina e ela caiu no “canal vermelho”. Disseram que precisavam vistoriar. Falei: “Vão ficar uma semana com a máquina!” Ficaram quatro horas. Na Colômbia, o “canal vermelho” é quatro horas. A Colômbia não é o que a gente vê na Netflix. Me sinto mais seguro em Medellín do que em São Paulo. A Colômbia fez a lição de casa, se você olhar dez anos atrás. Então, é possível. Só que você vê a sociedade engajada. Sabe fazer acordos, não fica cada um na sua trincheira.

Empresários precisam se engajar na política?

A sociedade precisa se engajar. Empresários também, mas todos.

Reformas são necessárias? O que é preciso para melhorar o ambiente de negócios?

Não são reformas, são uma atualização necessária. A trabalhista foi importante, vai gerar mais empregos. A previdenciária precisa ser feita. É uma questão matemática, não é política. O funcionalismo público, a gente precisar ter a coragem de entender e rever. Eles têm privilégios. A gente confundiu tudo isso. Então [a reforma previdenciária] é mais do que necessária. Tenho certeza de que está caminhando bem, porque a sociedade Whirlpool fabrica eletrodomésticos da linha branca em três unidades no Brasil: Joinville (SC), Manaus (AM) e Rio Claro (SP) está cada vez mais se engajando.

*Esta reportagem foi originalmente publicada na edição de número 66 da revista LIDE, em 22/11/2017.