Antes fabricante de TV, Philips agora só pensa em tecnologia para saúde

Fundada no começo dos anos 1890, há mais de uma década empresa mudou foco de negócio para fornecer softwares e equipamentos para saúde

Wesley Santana

Equipamentos da empresa holandesa usam inteligência artificial para dar mais precisão aos exames. Foto: Divulgação

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Pouco mais de uma década atrás, a Philips (PHGN34) tomou uma decisão arriscada: decidiu parar de fabricar televisores, um dos seus produtos mais conhecidos e vendidos globalmente. Na época, a divisão fabril começava a disputar espaço com vários concorrentes asiáticos, que já conseguiam oferecer tecnologia a preço baixo.

Apesar da mudança de estratégia, a marca não saiu das prateleiras, mas se transformou em outro tipo de fonte de receita. A empresa optou por ceder sua identidade para que outras indústrias usassem, e passou a receber uma participação pelo uso do logo. Por isso, ainda é bastante comum que se encontre televisores, lâmpadas e outros equipamentos com a logomarca da Philips, mas a maioria deles é fabricado por parceiras.

“Por carregar a marca Philips, muitas pessoas ainda pensam que nós fabricamos esses itens”, comenta Patrícia Frossard, CEO da Philips Brasil, ao InfoMoney. “Temos várias divisões de negócios e uma delas é a de gestão dos royalties que as empresas pagam para utilizar a nossa marca e que é um negócio extremamente rentável”.

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Desde sua saída da produção de televisores, o foco da Philips se voltou para a divisão de saúde, que tem se desenvolvido globalmente desde o seu lançamento e deu plano de fundo para o lançamento da marca, ainda nos anos 1890. Atualmente, a linha de tecnologia em saúde se divide entre softwares e equipamentos para clínicas e hospitais, no modelo B2B, e em cuidados pessoais, com ênfase no consumidor final.

“Dentro do portfólio de produtos, a companhia analisou o mercado do futuro e entendeu que energia e saúde eram dois mercados disruptivos. Como já atuava em saúde, este foi um movimento natural, então começou a ser feito um processo de se desfazer de outras unidades de negócios. Todas as vezes que nos desfazíamos de um negócio, reinvestíamos no setor de saúde”, detalha Frossard.

No ano passado, o grupo Philips registrou um crescimento de 4% nas vendas, subindo os resultados para 17 bilhões de euros, equivalente a R$ 93 bilhões. Segundo o relatório publicado na bolsa de valores de Amsterdã, o resultado mais positivo veio da divisão de tratamento e diagnósticos, que cresceu 6,2% no ano, atingindo a marca de 9,1 bilhões de euros.

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No comparativo com outras empresas de tecnologia para saúde, considerando o faturamento anual, a Philips integra o top 10, um pouco distante da Medtronic, Abbott e Johnson & Johnson, mas colada na GE Healthtech.

“Temos vários produtos que chegam a casa do consumidor, como os de bem-estar, mas os outros são menos diretos. Mesmo assim, os pacientes identificam a marca quando vão fazer uma ressonância magnética, por exemplo, e até se familiarizam por ser a mesma marca de sua TV”, diz a executiva.

Advogada de formação, Patrícia chegou ao cargo mais alto da companhia há 4 anos, mas circula pelos bastidores há cerca de 10 anos, liderando a área jurídica, depois de uma longa carreira na PepsiCo. “Isso é um pouco novidade, porque não vemos muito os advogados tomando esse papel de liderança, apesar de eu achar que eles têm bastante vantagem, em razão de serem bons negociadores. No final, o papel do CEO é muito disso, de relacionamentos e de diplomacia”, avalia.

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Patrícia Frossard é CEO da Philips Brasil desde 2019, mas soma 10 anos na empresa.
Patrícia Frossard comanda a filial da Philips no Brasil desde 2019, mas já soma 10 anos na empresa. Foto: Edilson Dantas

Um marketplace de inteligência artificial

Já não há dúvidas de que a tecnologia entrou nas clínicas e hospitais para dar suporte aos diagnósticos e decisões médicas cotidianas. No caso da Philips, mesmo com forte presença nas unidades hospitalares, tem trabalhado para criar um portfólio ainda mais completo de soluções, com o objetivo de permear todo o ecossistema de saúde, do setor público ao privado.

Uma das soluções mais aguardadas, com previsão de lançamento para o próximo ano, é o apelidado marketplace de inteligência artificial para a saúde. Segundo adianta o líder médico de informática da Philips na América Latina, Eli Szwarc, essa plataforma será capaz de conectar diversos algoritmos de IA em um único sistema, de modo a facilitar a análise e o parecer médico, que hoje precisa usar múltiplas tecnologias, cada uma adaptada para uma parte do corpo humano.

“Temos capacidade de juntar na nossa solução os algoritmos específicos, já que a Philips não tem o intuito de desenvolver uma IA para cada linha de cuidado ou doença. Por meio deste conceito amplo, o hospital consegue trazer todas as tecnologias regulamentadas para dentro da nossa base”, diz o médico cardiologista, que também coordena o comitê de inovação da ABIMED (Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde.

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Em termos gerais, o sistema foi criado para funcionar por meio de API, modelo de aplicação em que a empresa autoriza que soluções externas se conectem ao seu produto, como acontece especialmente no setor bancário.

“Nesse ecossistema de API, os clientes [médicos] conseguem fazer interface com outras aplicações para que os dados que estão dentro do prontuário possam ser compartilhados para criar o cuidado horizontal, para fora daquele modelo de negócio, ou para trazer outros modelos e oferecer novos serviços. A interoperabilidade traz oportunidade de mercado e de parcerias, que a Philips está construindo de maneira muito estruturada com grandes players já conectados”.

A interoperabilidade é um dos temas que a empresa persegue, pois trata da integração dos sistemas para garantir uma troca eficaz de informações para o bem-estar do paciente. “Para eles estarem no núcleo é essencial o compartilhamento e a estruturação das informações, portanto, ter um prontuário eletrônico interoperável, com todas as interfaces de equipamentos e softwares é importante para a tomada de decisão”, esclarece Szwarc.

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“O futuro é entregar uma saúde com maior valor. Isso significa manter o paciente no centro do cuidado proporcionando boas experiências, entregando melhores resultados e tendo o controle de custos para manter acessível para todos”, comenta.

Anualmente, a Philips destina cerca de 10% de seu faturamento global em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos, segundo os executivos. Esse valor financia tanto a manutenção da inovação por meios próprios quanto a ida ao mercado para buscar soluções externas.

“Quando encontramos uma tecnologia que diminui o tempo de uma ressonância magnética, por exemplo, significa que o paciente fica menos desconfortável porque vai fazer o exame mais rápido. Do outro lado, o hospital pode planejar melhor sua agenda e fazer mais exames por uma mesma máquina”, finaliza.