Oposição escolhe candidato para enfrentar Maduro nas próximas eleições da Venezuela

Primárias ocorreram dias após presidente Nicolás Maduro assinar acordo por condições mais justas no pleito de 2024, em troca de alívio nas sanções dos EUA

Bloomberg

Venezuelanos fazem fila para votar em primárias da oposição em Caracas, em 22/10/23 (Foto: Gaby Oraa/Bloomberg)

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(Bloomberg) – Os venezuelanos votaram neste domingo (22) para escolher o candidato da oposição que tentará acabar com um quarto de século de regime socialista nas eleições de 2024.

A ex-deputada María Corina Machado é a clara favorita entre os dez candidatos, embora esteja proibida de ocupar cargos públicos.

Grandes multidões lotaram os centros de votação em Caracas durante uma primária organizada de forma independente, na qual os eleitores lutaram para identificar suas urnas. Apesar dos esforços de divulgação, o governo do presidente Nicolás Maduro bloqueou um website que informa os cidadãos onde votar.

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“Quero que meus netos tenham um futuro e não tenham que deixar o país”, disse Nestor Gómez, de 63 anos, do lado de fora de seu centro de votação, perto da praça principal da favela Petare, em Caracas. “Esta é a nossa palavra para mudar a situação atual.”

Moradores de uma zona de classe média da capital trouxeram as suas próprias mesas e cadeiras para instalar nove estações de voto na calçada, onde milhares de pessoas fizeram fila desde o início da manhã, disse a coordenadora local Mirna Azancote.

Perto do fim de uma fila de aproximadamente três horas, Luis Moya, de 20 anos, esperou para votar pela primeira vez.

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“Este governo quer que os jovens não levem a política a sério. Tenho amigos que nem estão inscritos para votar porque pensam: para quê? Mas este é o único direito que nos resta”, disse Moya.

As primárias estão sendo realizadas dias depois de Maduro ter assinado um acordo para proporcionar condições mais justas na eleição do próximo ano, em troca de um alívio das sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos.

Quem vencer deverá enfrentar Maduro, de 60 anos, quando ele concorrer a um terceiro mandato de seis anos, e também poderá ser uma nova força unificadora para a oposição fragmentada.

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Aqui está o que esperar:

A liderança de María Corina Machado

Machado, de 56 anos, que se descreve como uma centrista, é a favorita. Uma pesquisa recente apontou que ela tinha 87% de intenção de voto entre aqueles com alta probabilidade de participar das primárias.

Ainda assim, ela enfrenta sérios obstáculos para se tornar presidente. O governo de Maduro proíbe Machado de deixar o país e, em junho, decidiu que ela está inelegível para ocupar cargos públicos. Machado diz que a desqualificação não tem sentido e espera que uma vitória neste fim de semana force Maduro a suspender a proibição.

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Machado quer reavivar a combalida economia da Venezuela através de políticas favoráveis ​​ao mercado e da privatização generalizada, incluindo o importante setor petrolífero. Ela também deve procurar converter a enorme dívida da Venezuela em um único título.

Nenhum dos outros candidatos está nem perto, de acordo com o instituto de pesquisa Delphos. O candidato do partido Ação Democrática, Carlos Prosperi, também ex-deputado, está em segundo lugar, com 2,1% de apoio entre aqueles com alta probabilidade de votar.

“Hoje homenageamos os venezuelanos no exterior, perseguidos, expulsos do país, outros presos e até mortos”, disse Machado antes de votar. “Hoje é apenas um passo, nosso dever ainda não foi cumprido.”

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O aliado de Maduro

A oposição decidiu financiar e gerir sozinha as primárias assim que o governo anunciou mudanças na autoridade eleitoral, incluindo a nomeação de Elvis Amoroso, um aliado próximo de Maduro, como presidente do órgão. Amoroso foi responsável por impedir a candidatura de líderes importantes da oposição, incluindo Machado.

A decisão de organizar as primárias de forma independente levantou dúvidas sobre o processo e os seus resultados. A votação não utilizará máquinas ou centros de votação tradicionais, baseando-se, em vez disso, em cédulas de papel e em espaços desconhecidos para os eleitores, que vão desde praças urbanas a estacionamentos e casas particulares oferecidas voluntariamente por cidadãos.

Os organizadores mantiveram a sua decisão depois de rejeitar uma oferta de apoio tardia da autoridade eleitoral, por medo de interferência política. Eles dizem que garantiram mais de 3.000 espaços com aproximadamente 5.000 mesas de votação. O comitê afirma ter treinado dezenas de milhares de voluntários.

Baixa participação

Pesquisas recentes estimam que apenas 1,5 milhão de pessoas votariam neste domingo, quase metade do número que participou nas primárias da oposição de 2012, depois de o governo ter bloqueado o website sobre os centros de votação.

Depender de espaços públicos também pode desencorajar os eleitores nos bairros mais pobres, onde os apoiadores do governo usam o seu controle sobre os alimentos e os subsídios financeiros para recompensar os leais e punir os oponentes.

Os centros de votação iam funcionar das 8h às 16h, ou até que não houvesse mais eleitores na fila. Um grupo de organizações nacionais acompanhará o processo. Os resultados parciais serão publicados na noite de domingo, segundo a comissão organizadora.

Negociações

Na última semana, o governo e uma coligação de grupos de oposição reiniciaram conversas destinadas a garantir uma corrida presidencial mais competitiva no próximo ano.

Como gesto de boa vontade, o Tesouro dos EUA emitiu uma licença de seis meses autorizando transações envolvendo petróleo e gás venezuelanos. Também levantou a proibição do comércio secundário de alguns títulos soberanos venezuelanos e dívida e ações emitidas pela estatal Petroleos de Venezuela SA.

Ainda há dúvidas de que Maduro aceitará as exigências de reformas eleitorais profundas que permitiriam à oposição competir de forma justa, escreveu Nicholas Watson, analista da Teneo, numa nota. Ele pode relutar em fazer isso num momento de economia fraca e baixa popularidade do governo – e com Machado a galvanizando apoio

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