Vale a pena comprar um imóvel durante a crise do coronavírus?

Não há, por ora, sinal de preços mais baixos no curto prazo, mesmo com queda brusca da demanda

Paula Zogbi

Ilustração (Natee Meepian/Getty Images)

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SÃO PAULO – Comprometer uma fatia relevante da renda na compra de um imóvel, mesmo à vista, pode não ser uma boa ideia durante a pandemia do novo coronavírus, opinam especialistas. Não apenas por ser um momento crítico para se desfazer de reservar financeiras, mas também porque não necessariamente o mercado apresenta as melhores oportunidades agora, mesmo para quem vai comprar à vista.

Eduardo Zylberstajn, diretor de pesquisa e inovação na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), explica que o mercado imobiliário responde à crise de forma muito mais suave que a Bolsa de valores, pelo aspecto da liquidez.

“A Bolsa chegou a cair mais de 40% [a queda acumulada ante o início do ano chegou a 45% em 23 de março] mas a gente não vê uma queda nem parecida com isso no preço dos imóveis. O que a gente vê é o sumiço da liquidez: quem quer vender não vai dar tanto desconto e quem quer comprar fica mais receoso – o negócio não sai”, explica.

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Esse foi o comportamento do setor na crise anterior, a partir de 2014: “não saía negócio, mas a redução nos preços foi muito modesta.” De acordo com o índice FipeZap, que mede preços de imóveis anunciados, entre 2014 e 2017 os valores de venda caíram 17%, já descontada a inflação do período.

Em março, primeiro mês com dados disponíveis desde que o Brasil começou a apresentar algum efeito da pandemia (a partir da segunda quinzena, já havia cidades em quarentena), o índice acelerou a 0,18%, uma variação positiva superior à inflação medida pelo IPCA (0,07%).

Também não há garantia que, com a crise, os juros de financiamento caiam abaixo dos patamares atuais – os menores da história. É comum que os bancos sigam a Selic e diminuam suas taxas quando a taxa básica cai, mas a situação agora não é usual: a qualidade da carteira de crédito deve pesar mais que a política monetária.

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“Mesmo que a Selic caia mais, como indicou o Banco Central, as instituições estão cautelosas por conta da inadimplência, que possivelmente vai crescer”, explica Bruno Gama, CEO da Credihome, empresa que compara taxas de financiamento imobiliário e tem sua própria linha de crédito.

É previsível uma queda na capacidade pagadora de quem já tem um financiamento contratado – além das postergações de parcelas já anunciadas pela Caixa e outros bancos. Isso diminui a qualidade da carteira e joga contra novas reduções nas taxas.

“Imagino que bancos não devem, a princípio, transferir a redução da Selic futura, esperando para ver o comportamento das carteiras de crédito”, completa Gama.

Por outro lado, os aluguéis tendem a ser mais voláteis que os preços de compra em momentos como este, já que o sentimento de diminuir os valores não é o de “queimar um ativo”. Segundo o pesquisador da Fipe, “é um preço mais dinâmico, menos rígido, e que caiu mais durante a última crise.” Na prática, significa que deve ser mais fácil encontrar bons negócios agora para viver de aluguel do que para comprar.

Balança

Segundo Zylberstajn, ao mesmo tempo que a situação de crise deveria levar a uma queda nos preços dos imóveis, o menor custo de oportunidade (ou seja, rendimentos menos atraentes em produtos de investimentos) em tese leva a uma alta para o mercado, pela maior procura de investidores por ativos imobiliários.

“É uma enorme incerteza de uma situação inédita que ainda vai impactar a vida das pessoas por um tempo que a gente ainda não sabe”, resume o estudioso.

E depois?

A quarentena não paralisou o setor de construção civil: há imóveis sendo erguidos que, provavelmente, não serão vendidos enquanto as pessoas não podem sair de casa para fazer visitas. Neste momento, apenas depois do lockdown, opina Gama, é possível que haja uma queda nos preços por conta desse excesso.

Para os usados, avalia Zylberstajn, o resultado dependerá do tempo de duração da crise. “Se muita gente perder renda, se a duração da quarentena for maior, você [o proprietário de imóveis] começa a ter a pressão de precisar de liquidez e passa a baixar os preços”.

É possível fechar o negócio

Embora os proprietários dispostos a “queimar” patrimônio não sejam a maioria – ao menos enquanto não se sabe a duração da crise -, sempre há oportunidades para quem sabe buscar no mercado, avalia Zylberstajn.

Para esses casos, Gama lembra que já existe a possibilidade de contratar um financiamento de forma totalmente remota, com toda a documentação avaliada eletronicamente – e imobiliárias já se adaptaram à necessidade de mostrar imóveis sem contato físico.

A imobiliária Lello, por exemplo, lançou ainda em março um sistema de visitas virtuais para a região metropolitana de São Paulo, com transmissão via programas de teleconferência. Entre os dias 27 de abril e 3 de maio, a Lopes promove um salão de imóveis totalmente virtual com 80 empreendimentos com preços descontados, de acordo com a imobiliária. A tendência é de expansão para outras empresas e mercados.

Paula Zogbi

Analista de conteúdo da Rico Investimentos, ex-editora de finanças do InfoMoney