Uberização: o que está em jogo no julgamento do STF desta quinta (8)?

Decisão pode pacificar entendimento sobre vínculo empregatício dos trabalhadores de aplicativos

Anna França

Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília (DF), em 11/04/2023 (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

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O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para esta quinta-feira (8) julgamento muito aguardado por discutir a existência ou não de vínculo empregatício, como prevê a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre motorista e as empresas de aplicativos.

O objetivo é dar um ponto final ao assunto, que ficou conhecido como “uberização”. Mais do que pacificar a jurisprudência, a decisão deve criar um desfecho na queda de braço entre a Corte e a Justiça do Trabalho, que nos últimos anos tem adotado posições ambíguas sobre a existência ou não do vínculo. Também deve finalmente consolidar a reforma trabalhista feita há sete anos e que não tem encontrado respaldo nos tribunais do trabalho, conforme advogados ouvidos pelo Infomoney.

Primeira vez em plenário

Essa é a primeira vez que o STF julgará o tema em plenário, uma vez que todos os outros processos foram analisados em turmas e em decisões monocráticas. O processo que vai a julgamento é um recurso que contesta decisão da 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que reconheceu o vínculo de emprego entre um entregador e o aplicativo Rappi. O relator é o ministro Alexandre de Moraes, que será o primeiro a votar nesta quinta e que tem posicionamento contrário à existência do vínculo.

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Há alguns dias, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, se manifestou nos autos do processo como contrário ao reconhecimento do vínculo entre os trabalhadores e as plataformas. “Com este parecer que o Supremo decida a questão de forma definitiva, com dois terços de votos do plenário no sentido da inexistência de vínculo de emprego dos motoristas e trabalhadores de aplicativos”, afirma o advogado da Rappi e sócio do sócio do escritório Chiode Minicucci / Littler, Daniel Domingues Chiode.

Para se ter a dimensão da encrenca, de janeiro a agosto de 2023, o STF atendeu 63% dos 324 pedidos de empresas para anular decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram vínculo de emprego, segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Atualmente, existem pelo menos 1,5 milhão de motoristas de aplicativos, entregadores e mototaxistas no país, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Na Justiça do Trabalho há em torno de 30 mil processos sobre o tema, com um valor que chega em R$ 3,4 bilhões, de acordo com levantamento da empresa de jurimetria Data Lawyer Insights.

As decisões têm sido questionadas por meio de reclamações. Nesse tipo de recurso, não há análise das provas do processo. Os ministros apenas avaliam, se a sentença proferida em instância inferior, seguiu ou não a jurisprudência do Supremo.

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Para Chiode, advogado das plataformas nas ações que tramitam no Supremo, a atuação do STF sobre o assunto vem na esteira de uma ausência de regulação de novas formas de trabalho e de uma aplicação indevida da CLT pelos tribunais trabalhistas. “Em decisões monocráticas, ministros do STF têm deixado claro um incômodo com a atuação de juízes trabalhistas”, disse, citando a frase proferida pelo ministro Gilmar Mendes. “Ao fim e ao cabo, a engenharia social que a Justiça do Trabalho tem pretendido realizar não passa de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria”, afirmou o ministro durante uma das sessões do STF em 2023.

Em setembro do ano passado, o Tribunal Superior do Trabalho condenou a Uber a contratar, via CLT, todos os motoristas ativos em sua plataforma, além de pagar R$ 1 bilhão em danos morais coletivos. Segundo levantamento da Data Lawyer, há 15.221 processos (ativos e finalizados) contra Uber, 99 e Cabify. Destes, 5.555 são decisões favoráveis aos aplicativos, e 2.388 aos trabalhadores.

Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro.