Pontos de milha e redes sociais ganham status de ‘bens virtuais’ em novo Código Civil

Milhas, pontos em programas de cartões e até senhas de redes sociais terão regras especificas para herdeiros

Anna França

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Você já pensou para quem você vai deixar sua herança digital? E não são criptomoedas, NFTs ou qualquer outro ativo deste universo. Trata-se de outros tipos de “bens virtuais”, como milhas, senhas e acessos a programas de pontos e até contas em redes sociais. Imagine quanto não vale a senha de um influenciador com milhões de seguidores? O assunto é tão importante que mereceu um capítulo inteiro na proposta de mudança do Código Civil, entregue por juristas no final de abril para o Senado Federal.

De acordo com especialistas, criptomoedas e outros ativos digitais já entram como bens normais em inventários e testamentos. O que as novas regras vão tratar é desse outro arsenal digital que as pessoas estão acumulando em vida e que vem exigindo até ações em diversos tribunais, como ocorreu recentemente em São Paulo, onde o Tribunal de Justiça concedeu à mãe de uma mulher falecida o direito sobre suas redes sociais.

O texto, com a proposta para o novo Código Civil, define o que são bens digitais e o que é passivo de ser herdado, além de estabelecer como o herdeiro pode dispor desse “patrimônio”, de acordo com a advogada Fernanda Haddad, especialista em Gestão Patrimonial, Família e Sucessões do Trench Rossi Watanabe.

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“Segue a ordem da herança normal, a não ser que a própria pessoa estabeleça algo diferente em testamento, podendo dispor desses bens e determinar quem vai ficar responsável pela herança digital”, diz. Ficam de fora arquivos de mensagens privadas, que não poderão ser acessadas pelos herdeiros, a não ser que a pessoa falecida tenha deixado essa vontade expressa no testamento ou por decisão judicial.

A proposta também estabelece que representantes ou herdeiros legais poderão pedir a exclusão de perfis em redes sociais da pessoa falecida, desde que não haja vontade contrária expressa. Também será possível transformar o perfil em uma espécie de memorial.

Para os mortos que não tiverem representantes legais, a exclusão será feita em 180 dias. Especialistas dizem que é bastante discutível a ideia de deixar para as plataformas o patrimônio da existência de um ser humano e sugerem que os herdeiros fiquem com o direito de decidir o que fazer.

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Como é a lei hoje?

Atualmente, o Código Civil brasileiro não aborda especificamente a questão da herança digital. E as leis relacionadas, como a LGPD e o Marco Civil da Internet, também não oferecem diretrizes claras sobre o assunto. Essa lacuna legal criou desafios significativos exigindo o tratamento da herança digital.

A transferência de milhas aéreas após a morte do titular também é uma questão complexa. Alguns programas de milhagens já estabelecem, desde logo, a extinção da conta após o falecimento do titular, não sendo possível a transmissão das milhas.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em outubro de 2022, que os pontos obtidos como recompensa pela fidelidade do cliente ao comprar produtos ou serviços podem ser excluídos pelas companhias aéreas.

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As políticas das redes sociais variam em relação ao que acontece com os perfis de usuários falecidos. O Instagram, por exemplo, permite que os familiares solicitem a remoção do perfil, sendo possível, ainda, requerer que a conta seja transformada em memorial.

Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro