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Mais ricos recebem 56% das deduções com saúde do Imposto de Renda

A lei hoje não estabelece nenhum teto para deduções de despesas médicas da base de cálculo do Imposto de Renda, mas existem discussões para mudar isso

Estadão Conteúdo

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Mais da metade das deduções de gastos com saúde do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) é concedida a contribuintes que ganham acima de dez salários mínimos ao mês. Levantamento feito pelo Estadão/Broadcast a partir de dados da Receita Federal mostra que os 19,7% mais ricos entre os declarantes abateram R$ 44,4 bilhões em despesas com saúde na declaração de 2018, que considera os rendimentos obtidos no ano anterior. O valor é 56% do total da isenção. Na educação, esse também é o grupo mais contemplado pelo benefício.

A lei hoje não estabelece nenhum teto para deduções de despesas médicas da base de cálculo do Imposto de Renda. Como geralmente é a população de maior renda que tem mais acesso a serviços médicos particulares, ela é a maior contemplada, ao conseguir abater a totalidade dos gastos.

Na prática, no entanto, o benefício tributário acaba sendo usado irregularmente até mesmo para procedimentos estéticos, como aplicação de botox.

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O secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, admitiu neste mês que o governo estuda fixar um teto para as deduções médicas, mas não adiantou valores. “Hoje existe um benefício excessivo a famílias de alta renda, que usam medicina particular e não usam o SUS. O grosso da população usa o SUS e não tem nenhuma dedução. Vamos estabelecer um teto que seja justo e não dê excesso de privilégios e benefícios àqueles que não precisam”, disse.

O limite para a dedução existe no caso dos gastos com educação – é possível abater até R$ 3.561,50 por dependente. Mesmo assim, a política também beneficia mais a alta renda. Segundo os dados da Receita, quem ganhou acima de R$ 9.370 mensais (equivalente a dez salários mínimos em 2017) descontou R$ 8,6 bilhões em despesas com educação, ou 40% do total.

O economista José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), afirma que uma mudança no IRPF deveria vir acompanhada de uma revisão integrada na tributação sobre a folha de salários e também sobre o lucro das empresas. Isso porque os mais ricos do País que estão no setor privado já deixaram de ser pessoas físicas perante o Fisco, recolhendo tributos como pessoa jurídica, em condições mais favoráveis.

Segundo os dados do IRPF 2018, o 1,1% mais rico entre os declarantes recebeu R$ 414,7 bilhões isentos de qualquer tributação – quase metade da renda livre, que somou R$ 908,1 bilhões. Boa parcela vem do recebimento de lucros e dividendos, mas não exclusivamente. Benefícios pagos a servidores públicos, como auxílio-moradia, também ficam livres do imposto.

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Afonso lembra que parcela crescente dos brasileiros de alta renda e até mesmo de média e baixa renda recebem hoje como autônomos, microempresários ou microempreendedores. Nesses casos, os dividendos são isentos de IRPF, mas os contribuintes também perdem o direito às deduções legais. “O raciocínio simplista do governo e da maioria dos debatedores é que precisamos incluir essa renda de lucros e dividendos na tabela progressiva, mas esquecem que isso permitirá a esses contribuintes passar a fazer deduções iguais às dos contribuintes já incluídos”, explica.

O economista avalia ainda que tributar lucros e dividendos, embora seja uma opção, pode estimular a prática de declarar despesas sociais na conta da pessoa jurídica, dificultando a fiscalização. Também haveria incentivo às empresas a reter os lucros.

Isenções

Além de limitar as deduções médicas, o presidente Jair Bolsonaro também tem pressionado a Receita Federal para ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda, hoje limitada a rendimentos de até R$ 1.903,98. O desejo do presidente é aumentar o limite para R$ 5 mil mensais para honrar uma promessa de campanha. Com isso, mais pessoas ficariam livres do tributo sobre seus salários.

O maior entrave a essa ampliação da faixa de isenção do IR é a consequente perda de R$ 40 bilhões em arrecadação, dinheiro do qual o governo não pode abrir mão em um momento de restrição fiscal.

Além disso, há na equipe econômica uma ala que prefere não misturar o debate da mudança no Imposto de Renda com a reforma tributária que tramita no Congresso Nacional e unifica os tributos que incidem sobre o consumo, como PIS/Cofins e IPI. A avaliação desse grupo é a de que não é o momento de mexer no IR, até porque há ainda o risco de o Congresso tomar para si a dianteira também desse debate, a exemplo do que ocorreu com a reforma tributária. Já existem hoje diversos projetos de lei que buscam alterar o IR e elevar as faixas de isenção.

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Numa tentativa de aceno ao desejo do presidente, mas sem comprometer tanto as contas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem sinalizado com a correção da atual tabela do Imposto de Renda pela inflação. Seria o primeiro ajuste desde 2015.

O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Sindifisco) calcula que há hoje uma defasagem média acumulada de 95,46% na tabela do IRPF, devido a anos de reajuste zero ou abaixo da inflação.

Juiz, procurador e promotor têm um terço da renda isenta

Com salários turbinados pelos chamados “penduricalhos”, juízes, procuradores e promotores tiveram quase um terço de sua renda isenta de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em 2017, mostra levantamento do Estadão/Broadcast com dados da Receita Federal. Cada integrante dessas carreiras recebeu cerca de R$ 635,7 mil no ano, dos quais R$ 191,4 mil ficaram livres de qualquer tributação.

A isenção chegou a 31% no Judiciário. No caso de membros do Ministério Público, o porcentual foi de 29,24%. Essas carreiras tinham seus vencimentos engordados por benefícios como auxílio-moradia, que inclusive ficam fora do alcance do teto do funcionalismo.

Os juízes e procuradores foram beneficiados, desde 2014, por uma liminar dada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux que, na prática, liberou o pagamento de auxílio-moradia no valor de R$ 4,7 mil mensais para todos os integrantes da carreira.

No ano passado, as categorias negociaram restringir o benefício em troca de um aumento de 16,38% nos salários – o que resultou em um teto remuneratório maior, de R$ 39,2 mil mensais.

Em dezembro do ano passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou resolução que restringiu o pagamento do auxílio-moradia para aqueles que forem atuar fora da comarca de origem, que não tenham casa própria no novo local, nem residência oficial à disposição. À época, o CNJ estimou que apenas 1% da magistratura teria direito ao benefício sob as novas regras.

Um projeto de lei para limitar os “penduricalhos” nos salários de servidores está parado na Câmara. O relator, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), apresentou parecer, mas ele não foi votado. “A aprovação dessa matéria é essencial para que possamos barrar a criação desenfreada dos chamados penduricalhos”, afirma.

No Executivo, apenas a carreira de diplomata tem parcela maior da renda isenta em relação a juízes e procuradores: 51,8%. Quando eles são transferidos para o exterior, recebem 75% dos seus salários livres de imposto, além de outras ajudas de custo também isentas. 

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