Febraban pede ao BC abertura de processo para investigar ‘maquininhas’ por suspeita de fraudes

Entidade dos bancos quer apuração sobre supostas irregularidades na oferta de 'parcelados sem juros no cartão'

Anna França

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Foi dada a largada para mais uma disputa entre os bancos e as empresas de ‘maquininhas’ independentes. De um lado está a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que ingressou na quarta-feira (6) com duas representações junto ao Banco Central pedindo a investigação e a punição dessas empresas por ofertas dissimuladas de “parcelado sem juros no cartão”. Do outro lado, estão companhias de peso como Stone, Mercado Pago, PagSeguro e PicPay, que alegam ser esta mais uma tentativa dos “bancões” de atingi-las.

Em suas denúncias, a Febraban aponta práticas de eventuais operações irregulares e fictícias, por meio das quais as empresas que operam as maquininhas estariam cobrando, de forma dissimulada, juros dos consumidores. Entre as acusações está a criação de um modelo de “parcelado sem juros pirata”, num esquema onde as empresas estariam cobrando juros remuneratórios dos consumidores, mas lançando na fatura do cartão de crédito como modalidade de parcelado sem juros.

“Se confirmada, pode estar comprometida a lisura dessa prática, uma vez que essas atividades podem ser vedadas ou não autorizadas pelo Banco Central, além de eventualmente fraudulentas, comprometendo a legalidade dessas cobranças”, diz, por nota, a Febraban.

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Entenda

Na primeira representação dirigida ao BC, a federação explica que as empresas de maquininhas desenvolveram uma oferta de crédito que permite aos estabelecimentos comerciais a cobrança do chamado “parcelado comprador”, embutindo, nas compras a prazo, um adicional ao preço do produto. “Foi a forma artificiosa encontrada para repassar ao consumidor os custos associados à antecipação de recebíveis cobrados dos estabelecimentos comerciais.”

Assim, apesar de cobrar juros do consumidor, a maquininha independente insere, nos sistemas da bandeira do cartão, uma transação não verdadeira de “parcelado sem juros”. Na prática, a transação realmente efetivada tem juros e é distinta daquela inserida nos sistemas das bandeiras como compra parcelada sem juros.

Com esse modelo de negócios, a Febraban acredita que as independentes fazem com que uma considerável parcela de lojistas fique dependente da antecipação de recebíveis desse tipo de parcelamento. “Ao mesmo tempo, é um modelo que se ancora no endividamento das famílias, gerando um elevado risco de crédito, o que resulta nas altas taxas de juros cobradas no cartão de crédito. Quanto maior o prazo para o consumidor quitar sua dívida, maior seu endividamento e maior a probabilidade de inadimplir”, acrescenta a entidade em nota.

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Na segunda representação, a Febraban pede ao BC que sejam investigadas as carteiras digitais de Mercado Pago e PicPay, que, por meio de uma engenharia financeira, estariam concedendo empréstimos aos consumidores e cobrando juros, mas também de forma dissimulada, registrando a operação como modalidade de “parcelado sem juros”, sem que sequer haja uma relação de consumo na compra de bens.

Essas carteiras digitais, na prática, estariam registrando pagamento parcelado sem juros no cartão de crédito, mas sem qualquer relação com a venda de mercadoria ou prestação de serviço. As carteiras digitais, usando o limite do cartão de crédito das pessoas, antecipam recursos ao consumidor para transferências de dinheiro, pagamentos de contas, boletos bancários ou fatura de cartão, para depois serem pagos de forma parcelada, acrescidos de juros, mas lançando no cartão de crédito uma compra parcelada sem juros.

“Essa prática afronta diretamente as regras das bandeiras de cartão de crédito, as normas do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional, já que as carteiras digitais não podem realizar operações de empréstimos diretamente aos consumidores.”

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O que dizem as empresas de ‘maquininhas’?

A Abipag (Associação Brasileira de Instituições de Pagamentos) diz, por nota, desconhecer as denúncias dirigidas aos seus associados junto ao regulador e afirma que “representações eventualmente protocoladas evidenciam a má-fé e ignorância do suposto denunciante e servem de subterfúgio para inviabilizar a concorrência de mercado e atacar concorrentes independentes”.

Na mesma linha está o comunicado da Abranet (Associação Brasileira de Internet), que representa as empresas de pagamento. Para a entidade, a ação da Febraban configura mais uma tentativa dos “bancões” de atingir as empresas do setor. A entidade diz que as associadas ainda não foram notificadas de tal representação pelo Banco Central, mas, desde já, rebate os pontos noticiados.

Em nota, a Abranet reforça que os bancos têm sido sistematicamente derrotados em sua tentativa de restringir a modalidade “Parcelado Sem Juros” (PSJ). “Primeiro, foram derrotados no Congresso, que rechaçou de forma clara o ataque ao PSJ no âmbito do Projeto Desenrola. Depois, nas discussões para proposta de consenso dos setores com vistas a posterior apresentação ao Conselho Monetário Nacional (CMN), intermediadas pelo Banco Central (conforme previsto na lei aprovada pelo Congresso), a Febraban não conseguiu demonstrar qualquer relação entre o PSJ e os altos juros cobrados pelos bancões (ao contrário, os dados mostram que o PSJ não é causa dos altos juros de cartão de crédito, que chegam a 445% ao ano)”, salienta a entidade.

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“Nessas discussões, a Febraban é a única entidade a tentar impor a redução drástica do número de parcelas do PSJ, contra as empresas independentes de maquininhas e o setor varejista, que querem manter essa importante forma de acesso dos brasileiros ao consumo”, explica em nota a Abranet. Segundo a entidade, há outras propostas para a redução dos juros´, como a melhoria dos critérios de emissão de cartões pelos próprios bancos, que poderiam compor o necessário consenso, se a Febraban “abandonasse a obsessiva meta de destruir o PSJ”.

Ainda de acordo com a entidade, o “Parcelado Comprador”, referido na representação da Febraban contra associados da Abranet, conforme noticiado, é uma ferramenta tecnológica disponibilizada aos estabelecimentos comerciais que permite ao vendedor calcular os valores a receber por suas vendas, de acordo com os diferentes meios de pagamento utilizados, os prazos de pagamento e os custos transacionais envolvidos.

A Abranet ainda explica que esta solução já é amplamente utilizada pelo mercado e foi desenvolvida no contexto da Lei 13.455/17, que prevê a possibilidade de o vendedor diferenciar o preço de bens e serviços em decorrência do meio de pagamento utilizado pelo comprador e/ou em decorrência do prazo de pagamento da transação. Ou seja, trata-se do cálculo do preço do produto, que poderá variar de acordo com o instrumento e prazo de pagamento.

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A Febraban entende, no entanto, que tais práticas violam as normas regulatórias estabelecidas pelo Banco Central e representam condutas desleais para com as instituições financeiras bancárias. Além disso, a federação diz que essas práticas não são transparentes para com os consumidores, conduzindo-os ao superendividamento. As representações feitas pela Febraban pedem que, enquanto procedem à investigação dessas denúncias, o Banco Central determine a interrupção imediata dessas práticas, para que os consumidores, lojistas e o princípio da livre concorrência não sejam mais prejudicados.

Já a Abranet diz estar “certa de que o Banco Central reconhecerá a legalidade dos procedimentos de suas empresas associadas, dentro do propósito que sempre teve o regulador de fomentar a competição no mercado”, finaliza nota da instituição encaminhada ao InfoMoney.

Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro.