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Como ficam os seguros de crédito, garantia e responsabilidade civil dos executivos com a confirmação de fraude na Americanas?

Seguro D&O deve ser o principal afetado com a confissão de adulteração; estimativa é que a apólice de D&O tenha cobertura de cerca de R$ 50 milhões

Gilmara Santos

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O escândalo corporativo envolvendo a Americanas ganhou mais um capítulo nesta terça-feira (13), quando a empresa divulgou fato relevante assumindo que houve fraude em seus resultados. A confirmação ocorre 5 meses depois de vir à tona a alegação de ‘inconsistências contábeis’ estimadas em mais R$ 20 bilhões em seus balanços.

O reconhecimento da fraude abre um novo debate sobre o pagamento dos seguros envolvendo a companhia: de crédito, garantia e responsabilidade civil dos executivos, apólice conhecida como Directors & Officer (D&O).

O seguro D&O deve ser o principal afetado com a confissão de adulteração. A estimativa é que a apólice de D&O tenha cobertura de cerca de R$ 50 milhões. “A caracterização do ato doloso depende de sentença transitada em julgado ou confissão do segurado”, diz a advogada Marcia Cicarelli, sócia de seguros e resseguros do escritório Demarest Advogados.

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Ela ressalta, porém, que o segurado é o executivo (pessoa física), não a empresa, por isso, será preciso analisar a autoria da confissão, quais são os fatos confessados, sua natureza e alcance. “Via de regra, a análise de caracterização ou não de ato doloso se dá pela avaliação da conduta individual de cada segurado”, enfatiza.

O advogado Tiago Mackey, sócio do dcom advogados e head da área de resolução de disputas, concorda que o D&O deve sofrer mais impactos com as apurações internas na Americanas.

Ele comenta que os contratos de seguro se baseiam essencialmente em uma relação de boa-fé, confiança e transparência. A própria lei prevê que a inexatidão ou omissão de informações e o agravamento intencional do risco segurado levam à perda da cobertura.

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“As apólices de seguro usualmente possuem previsões expressas no sentido de que atos ilícitos, fraudulentos, dolosos [intencionais], provenientes de culpa grave [quando a atitude representa tamanha falha, que chega próxima de ser intencional] levam igualmente à perda da cobertura e no caso do D&O, não costuma ser diferente”, diz Mackey.

“O seguro D&O é um seguro de responsabilidade civil para diretores e conselheiros e visa proteger o patrimônio de tais executivos contra eventuais imputações de responsabilidade no âmbito civil, criminal, regulatório, etc em razão de atos regulares de gestão. Todavia, por expressa previsão legal, nenhum seguro cobre atos dolosos, ou seja, atos intencionais como a fraude, cometidos com o intuito de favorecer o próprio executivo”, enfatiza Marcia.

Seguro de crédito

Os seguro de crédito, por sua vez, é um seguro para proteção de fornecedores de produtos e serviços contra a inadimplência em vendas a prazo. “Nesse caso, a proteção é daquele que vende para as Americanas, de forma que eventual fraude cometida pelos empresa devedora, sem a participação do credor, não deve afetar a cobertura securitária”, diz Marcia.

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Já o seguro garantia é de adimplemento contratual, ou seja, garante ao segurado (contratante) o cumprimento de uma determinada obrigação contratual pelo contratado, denominado tomador. “Assim como o seguro de crédito, a fraude cometida pelo tomador não pode prejudicar o segurado.”

Ela explica que os seguros de crédito e de garantia são acionados no momento do atraso no pagamento (inadimplência), descumprimento contratual (inadimplemento) ou com o processo de recuperação judicial.

“Ou seja, esses seguros já foram acionados e, em princípio, não são afetados pelo resultado da investigação, já que a proteção é dos fornecedores”, afirma Marcia.

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O impacto financeiro do seguro de crédito deve ser significativo para as seguradoras e resseguradoras. O setor estima que devem ser pagos de R$ 2 bilhões a R$ 3 bilhões em indenizações aos fornecedores da companhia que haviam contratado seguro de crédito. Para se ter uma ideia, no ano passado, o ramo arrecadou cerca de R$ 800 milhões.

Histórico

No início de janeiro deste ano, a empresa informou ao mercado inconsistências contábeis na ordem de R$ 20 bilhões e na sequência entrou em processo de recuperação judicial e ganhou prazo para apresentar um plano de pagamento aos credores e, assim, evitar a falência.

No comunicado divulgado nesta terça-feira (13), a companhia reconhece a fraude e responsabiliza a antiga administração, que incluía o ex-CEO, Miguel Gutierrez e três ex-diretores. Ainda segundo a empresa, assessores jurídicos da administração da Americanas apresentaram relatório contendo achados preliminares acerca dos fatos narrados no fato relevante de 11 de janeiro sobre lançamentos contábeis.

A companhia explica que o relatório apresentado pelos assessores foi baseado em documentos entregues pelo comitê de investigação independente e por documentos complementares identificados pela administração e seus assessores após as reuniões com o Comitê.

Gilmara Santos

Jornalista especializada em economia e negócios. Foi editora de legislação da Gazeta Mercantil e de Economia do Diário do Grande ABC