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SÃO PAULO – A Lei Geral da Copa desenvolvida pelo Governo Brasileiro não agradou a Federação Internacional de Futebol, a FIFA, entidade responsável pela organização das Copas do Mundo, inclusive aquela que será realizada em 2014 no Brasil.
Por isso, a Federação propôs – nas entrelinhas – que sejam suspensos o CDC (Código de Defesa do Consumidor), o Estatudo do Idoso e o Estatuto do Torcedor durante a realização do evento esportivo. O objetivo? Possibilitar que ela própria estipule suas regras, como a definição dos preços dos ingressos e o veto para qualquer tipo de desconto, inclusive meia-entrada para estudante e idoso.
De acordo com a advogada especializada em Direito do Consumidor e Direito Eletrônico, Gisele Friso, da G. Friso Consultoria Jurídica, a sugestão por si só já soa como um disparate. Mas, quando se pensa nas consequências da suspensão temporária das leis, percebe-se o quão exposto ficará o consumidor brasileiro.
Não perca a oportunidade!
“Ainda que temporária, a suspensão do CDC seria inconstitucional, visto que a defesa do consumidor pelo Estado está prevista no artigo 5º da Constituição Federal como um direito fundamental, não podendo, portanto, ser restrita e muito menos suspensa. Além disso, se com as leis em vigor já é complicado para o consumidor ter seus direitos atendidos, que dirá com a suspensão delas?”, questiona Gisele.
Ela ainda explica que a suspensão temporária de direitos fundamentais só é permitida em casos extremos, como em estado de sítio ou em estado de defesa.
Reembolso
Uma das desvantagens do consumidor, se admitida a suspensão do CDC, será em casos de reembolso do valor da compra dos ingressos para assistir aos jogos.
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De acordo com o Artigo 49 do Código, o ressarcimento é garantido para quem comprou pela internet ou por telefone e desistiu dentro do prazo de sete dias, a partir da data de recebimento do ingresso. O consumidor também tem direito de receber integralmente o valor pago, caso haja cancelamento do evento, troca do horário ou anulação.
“Sem a obrigatoriedade da aplicação das leis, o consumidor ficará totalmente desamparado, correndo o risco de perder dinheiro e ficar no prejuízo, pois sequer poderá reivindicar seus direitos”, alerta a advogada.
Equilíbrio!
O Código, conforme lembra Gisele, é uma lei elaborada para equilibrar as relações jurídicas entre fornecedores e consumidores, por isso, traz inúmeros benefícios ao consumidor, como responsabilidade objetiva (que independe de dolo ou culpa do fornecedor), a vinculação, o cumprimento forçado da oferta, dentre outros direitos.
“Além disso, o CDC prevê uma vantagem processual ao consumidor: ele pode ser beneficiado pela inversão do ônus da prova, de acordo com a análise do juiz”, acrescenta. Se, por exemplo, o consumidor alegar que o produto tem um problema, quem terá que provar que ele não existe é o fornecedor. Suspensa essa legislação, o consumidor teria uma série de obstáculos para comprovar a existência do defeito, como arcar com custos de uma perícia.
“Será uma total falta de respeito com o consumidor, caso essa proposta de suspensão do CDC seja acatada”, conclui Gisele.
Governo vai rever a Lei Geral da Copa
No início desta semana, o Governo se dispôs a rever alguns aspectos da Lei Geral da Copa, os quais divergem da proposta feita pela FIFA.
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O ministro do Esporte, Orlando Silva, disse que o governo se propõe a “aperfeiçoar a redação para ficar mais clara” sobre os aspectos ponderados pela entidade. As sugestões de mudanças serão encaminhadas ao Congresso Nacional, aos estados e também aos municípios – os quais dispõem de legislação local sobre alguns temas.
Repúdio
No mesmo dia em que o Governo anunciou a revisão das regras, o Idec (Instituto de Defesa do Consumidr) enviou uma carta à presidência pedindo que o Executivo seja firme na defesa das leis, de maneira a garantir sua plena compatibilização com os direitos dos consumidores e com todos os direitos sociais da população brasileira.
O problema, de acordo com a entidade, é que a Lei Geral da Copa restringe direitos sociais, especialmente os direitos dos consumdiores.
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Preocupação e defesa do consumidor
A Fundação Procon-SP, outra entidade que trabalha em defesa dos consumidores, também manifestou, na última quinta-feira (6), sua preocupação com a Lei Geral da Copa. “O governo brasileiro aceitou fazer parte da FIFA, o que confere à organização a possibilidade de fazer uma série de imposições ao País sede do evento”, disse o Procon-SP em nota.
Apesar do necessário equilíbrio entre a legislação brasileira e as exigências internacionais, isso não significa que os direitos já consolidados na legislação e assegurados pelo próprio Estado sejam por ele colocados de lado, dando lugar a novos regulamentos.
A preocupação reside no fato do Projeto de Lei que cria a Lei Geral da Copa colocar de lado institutos que fazem do Brasil referência mundial. A proposta, por exemplo, confere à FIFA prerrogativas para cancelar, remarcar e realocar os jogos.
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Então, se tiver um jogo clássico no Rio de Janeiro (como Brasil x Argentina), e o torcedor sair de São Paulo especificamente para esse jogo, pegar avião, hospedar-se em um hotel, utilizar táxi, comer e chegar ao local de evento, e a FIFA cancelar o jogo, a organização terá apenas que devolver o ingresso. O consumidor não será indenizado pelos prejuízos materiais ou morais, por eventual constrangimentos sofridos, conforme garante o CDC.
Por isso, a Fundação Procon-SP entende que a Lei Geral da Copa não deve estabelecer regras que dão poderes irrestritos à FIFA, desrespeitando leis nacionais e ferindo um dos princípios fundamentais da Política Nacional de Relações de Consumo, que é a harmonia e equilíbrio entre os interesses dos participantes das relações de consumo.