Previdência: tempo para benefício máximo está pelo menos 8 anos acima do “razoável”, diz ex-secretário

Proposta de idade mínima é acertada, de acordo com especialista, mas governo precisará fazer ajustes no mercado de trabalho por meio de incentivos

Paula Zogbi

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SÃO PAULO – A proposta de reforma da previdência anunciada hoje pelo presidente Michel Temer pode estar desamparando uma parcela mais vulnerável da população, de acordo com o professor da USP José Roberto Savoia, que foi secretário de Previdência Complementar no governo FHC.

Sua análise atenta principalmente para a necessidade de contribuir por 49 anos para se ter direito ao benefício integral. Para ele, esse cálculo chegou a um valor “oito anos superior ao que seria razoável supor”.

A população de baixa renda, explana, por não ter grau alto de escolaridade, acaba passando muito tempo trabalhando na informalidade ou entre empregos por falta de qualificação. “Essas pessoas acabam não conseguindo fazer uma contribuição contínua para a seguridade social”, explica, em entrevista ao InfoMoney.

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Mesmo no melhor dos cenários, em que a contribuição não tem pausas, Savoia acredita que o tempo está exagerado. “Imagine uma pessoa que começou a trabalhar aos 15 anos, contribuindo continuamente, e que se aposente aos 65. Essa pessoa deveria receber um benefício muito alto, até maior do que 100%, na minha opinião”, analisou o professor, ao comentar aspectos da legislação que deverão ser debatidos e possivelmente modificados antes de sua aprovação. 

Acúmulo de benefícios

Também pode significar desamparo à população de baixa renda a impossibilidade de recebimento de mais de um benefício, como no caso de pensão por morte. No documento publicado pelo governo, fica vedado que o mesmo cidadão receba aposentadoria e pensão concomitantemente.

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“Quando a soma da pensão por morte com a aposentadoria fica abaixo do teto do INSS eu não vejo problema nenhum que os benefícios fossem conjugados. Você tem que analisar a condição da família, e não a condição geral, para que as famílias não fiquem em uma condição de desamparo”, alertou o professor. De acordo com ele, a situação ideal seria analisar caso a caso a necessidade de benefício de cada beneficiário.

“Imagine o seguinte: um casal de aposentados que tem uma determinada renda somada eles conseguem morar, pagar suas despesas e ter um certo padrão de vida. Se um deles vier a falecer, as despesas não vão ser reduzidas à metade. Algumas despesas são fixas”, exemplifica. E alerta: “você pode cometer grandes injustiças nessa situação”.

Idade Mínima e condições do mercado

Outro ponto que gerou controvérsias na publicação da proposta foi o estabelecimento de idade mínima para a aposentadoria aos 65 anos – atualmente, não há obrigatoriedade de idade para a aposentadoria, apenas tempo mínimo de contribuição de 15 anos. Neste aspecto, porém, Savoia acredita que o entendimento do governo foi acertado.

Em apoio à proposta, ele cita alguns números. “Não tenho dados para as mulheres, mas hoje no Brasil cerca de 70% dos homens com mais de 60 anos exerce alguma atividade. Na Argentina, esse número é maior que 80%; em Cuba, 90%”.

Ao mesmo tempo, ele acredita que o Brasil atualmente não tem as condições necessárias para abrigar contribuintes mais velhos no mercado de trabalho. “O mercado de trabalho é restritivo. No Brasil passou a se fazer uma troca do funcionário mais experiência por um outro mais jovem e mais barato numa busca de produtividade maior”, comenta.

Para diminuir esse efeito, o ex-secretário acredita que a reforma deverá vir acompanhada de ações do governo para incentivar a empregabilidade desse trabalhador. “Eu diria que essa oferta vai ter que vir a reboque numa mudança de incentivos. Dentro do modelo que se institui, o governo vai ter que alocar incentivos para as empresas para que elas contratem”, analisa, citando incentivos fiscais e desonerações para empresas que contratem pessoas com mais de 60 anos de idade.

Paula Zogbi

Analista de conteúdo da Rico Investimentos, ex-editora de finanças do InfoMoney