Dias melhores virão para a Vale (VALE3)? O que explica a virada da ação, que fechou em alta de 2%, apesar do balanço decepcionante

Custos mais altos foram principal destaque negativo, mas empresa destacou uma visão mais positiva ao projetar 2º semestre mais forte

Lara Rizério Vitor Azevedo

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Apesar de analistas de mercado já esperarem por um resultado não muito positivo para a Vale (VALE3),  os números dos primeiros três meses do ano decepcionaram, principalmente por conta dos custos altos.

Com isso, as ações da companhia abriram em queda, que chegou a 1,55%, mas o papel acabou registrando ganhos ao longo do dia e fechou em alta de 2,12%, a R$ 71,76. Os motivos para tanto são a visão da própria companhia de que ela conseguirá melhores prêmios e custos mais baixos no 2º semestre deste ano, conforme destacou em teleconferência, além de parte dos analistas de mercado seguir otimista com a ação da mineradora, mesmo depois dos números decepcionantes do primeiro trimestre de 2023 (1T23).

Indo as números do período, a mineradora registrou lucro líquido de US$ 1,84 bilhão no primeiro trimestre, queda de 58,8% versus o mesmo período do ano anterior, em meio a preços mais baixos e queda na comercialização de minério de ferro. O valor veio abaixo do esperado por analistas que previam um lucro líquido de US$ 2,422 bilhões, em média, conforme dados da Refinitiv.

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O lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação (Ebitda) ajustado das operações continuadas somou US$ 3,58 bilhões entre janeiro e março, ante US$ 6,21 bilhões um ano antes. O Ebitda ajustado proforma foi de US$ 3,7 bilhões, 7% abaixo do consenso (-26% no trimestre e -44% no ano).

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“Embora já antecipássemos um resultado mais fraco devido à piora na dinâmica da receita, notamos que os custos de produção mais altos foram o principal destaque negativo nos resultados, com os custos caixa C1 ( custo de produção dos finos de minério de ferro da mina ao porto, incluindo terceiros) aumentando de US$ 21,20 a tonelada no 1T22 para US$ 26,70 a tonelada no 1T23, potencialmente aumentando as preocupações sobre o desempenho dos custos no futuro”, aponta Guilherme Nippes, analista da XP.

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Além disso, os custos das operações de níquel aumentaram significativamente, devido ao mix de produtos de menor qualidade e à transição para a mineração subterrânea da mina de Voisey’s Bay.

O Bradesco BBI também destacou esse início de 2023 como difícil, com o Ebitda 13% abaixo das suas estimativas.

“Embora parte dos resultados negativos já tenha sido precificada após a prévia operacional (a Vale reportou embarques e preços realizados na semana passada em seus dados de produção e vendas), esperamos que a ação sofra com os números consolidados do 1T23, especialmente porque o desempenho do custo foi muito mais fraco do que o esperado”, avaliaram os analistas antes da abertura do mercado.

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O BBI pondera, também, que os resultados foram impactados por uma miríade de “eventos pontuais”, de chuvas mais fortes do que o normal que afetaram as exportações do Sistema Norte (com consequente impacto na qualidade e prêmios do minério) e com antecipação de paradas de manutenção impactando custos.

Sobre o salto do custo C1, bem acima do guidance para 2023 de US$ 20-21 a tonelada, os analistas apontaram que tentarão obter uma melhor medida de se os componentes que impulsionaram esse aumento são de fato persistentes ou se devem desaparecer nos próximos trimestres.

Pelo lado positivo, tanto XP quanto BBI destacaram o fluxo de caixa livre em US$ 2,3 bilhões, impactado pelo capital de giro positivo (+US$ 700 milhões), parcialmente compensado por capex (-US$ 1,1 bilhão) e desembolsos de Brumadinho (-US$ 300 milhões). A dívida líquida expandida foi de US$ 14,3 bilhões (dentro da meta de US$ 10-20 bilhões), enquanto a dívida líquida/Ebitda ajustado dos últimos 12 meses foi de 0,5 vez. Além disso, o programa de recompra está 47% concluído.

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Executivos falam em custos passageiros

Durante a teleconferência, os executivos da Vale trataram de tentar acalmar os ânimos de analistas e investidores quanto ao aumento de custos registrado no primeiro trimestre.

“Todos estão enfrentando aumento de custo no setor, os concorrentes também. Temos custos de combustíveis, mão de obra, e por ai vai. Agora, eu não me atentaria muito ao custo do primeiro trimestre”, comentou Gustavo Pimenta, diretor financeiro (CFO) da Vale.

Segundo o executivo, o primeiro trimestre foi muito impactado pelas restrições de embarques, com a chuva no Norte do país impedindo a formação de pilhas para estoque. O custo caixa, se não fosse isso, seria US$ 2 mais baixo.

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“Principal indicador a se ver é a produção e temos flexibilidade no sistema de embarque para correr atrás disso. As minas de Carajás e Torto também vão trazer prêmios melhores. Estamos confiantes que os números serão normalizados”, defendeu Pimenta. “Maioria dos benefícios da busca por eficiência virão no segundo semestre, com mix e volumes, principalmente vindo de Carajás. Estamos focando bastante na eficiência de custo desde o ano passado e isso deve continuar no restante do ano”.

A Vale, apesar do primeiro trimestre, manteve o guidance de produção para 2023 dado anteriormente – algo entre 310 e 320 milhões de toneladas.

“Ao observarmos o guidance, não contamos com a dependência de licenças. Solução nesta frente é importante, mas estamos de olho no médio prazo. Neste ano, estamos seguindo conforme planejado. Não estamos sentados e esperando. O crescimento do sistema Norte virá do S11D [Projeto Ferro Carajás], certamente. Passaremos de 80 milhões de toneladas a 110, 120. Um boa notícia, pouco divulgada, é que estamos executando mais 20 milhões no S11D. Mas precisamos voltar com a produção no sistema norte e no Serra Leste. Estamos trabalhando para chegar em 140 milhões, de olho nas licenças”, comentou Eduardo Bartolomeo diretor executivo (CEO).

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A Vale espera um melhor desempenho em 2023 principalmente de olho nos volumes e nos melhores mix de vendas, uma vez que, para eles, o preço do minério não deve destoar muito do que está sendo visto.

“Nome do jogo para preço do minério nesse ano é estabilidade. China está se recuperando, com números fortes e sólidos. PIB, investimento em infraestrutura. Estamos tendo boas notícias. Mas, por lá, estamos no modo de inventário”, explicou Marcello Spinelli, diretor do braço de minério.  “Nós acabamos de voltar da China e é senso comum que a produção de altos fornos ficará flat. As vendas virão, mas clientes estão esperando e nós estamos esperando também”.

De acordo com o executivo, a demanda, de qualquer forma, deve se equilibrar com a oferta ao longo de 2023.

Na frente de metais básicos, a Vale não trouxe muitas novidades. A companhia segue procurando um parceiro para adquirir uma fatia de 10% do braço e capitalizar o negócio.

“Nos metais básicos, estamos criando proteção, melhorando as alavancas principais. Trouxemos o Jerome, agora o Mark, que já trabalhou conosco antes”, disse Bartolomeo, em referência a Jerome Guillen, ex-Tesla que chegou em feveiro, e Mark Cutifani, que já passou pela mineradora e agora será presidente do conselho de metais básicos.

“Eu sempre disse, quanto a metais básicos, que eventualmente podemos fazer um IPO do braço. Trouxemos um novo executivo para a execução do evento de liquidez, na busca por um parceiro”, comentou o CEO. “Ele entrou porque sabe transformar a frente de metais básicos em um ativo ainda melhor, destravando de valor. Não temos uma opção definitiva, porém, para IPO, mas estamos criando opções. A entidade de níquel está sendo projetada, tem um pouco a ver com a venda da participação, mas deixamos claro que se não encontrarmos o parceiro correto, faremos de qualquer forma”.

Divisão sobre futuro da ação segue em pauta

Para o Goldman Sachs, que também destacou os números como fracos e impactos por altos custos, o trimestre foi marcado provavelmente por muitos eventos pontuais, incluindo sazonalidade e vendas mais fracas do que o normal, mas os lucros têm ficado aquém das expectativas por alguns trimestres e os investidores estarão de olho no cumprimento do guidance (projeções) pela empresa.

Enquanto isso, os preços do minério de ferro devem continuar sendo o principal fator da tese de investimento na Vale. A equipe de commodities do banco vê sustentação no preço do minério de ferro no 2T23 devido a uma combinação de sentimento positivo em relação à reabertura da China, sazonalidade positiva (forte demanda por aço, fraca oferta de minério de ferro) e reposição após Ano Novo Chinês.

Porém, aponta que isso deve ser seguido por uma oferta sazonal crescente, aumento das exportações da Índia e da Austrália e aumento da oferta de sucata na China. Indo para a segunda metade do ano, a demanda fraca como resultado de lançamentos imobiliários mais fracos em 2022 também ficará mais evidente, o que deve impactar a cotação do minério.

Assim, os analistas do Goldman mantêm recomendação neutra para a Vale, pois vê as ações precificando um minério de ferro de US$ 97 a tonelada ante a projeção da casa de minério a US$ 120 a tonelada em 2023 e a US$ 90 em 2024.

O JPMorgan também tem recomendação neutra para a mineradora e espera uma revisão para baixo da expectativa de lucros pelo mercado, com base no Ebitda decepcionante.

Além disso, em recentes conversas, analistas do banco destacam a visão de que, enquanto os investidores geralmente concordaram que os preços do minério de ferro provavelmente seriam corrigidos em 2023, havia divergências na trajetória potencial dos preços.

“Nossas conversas sugerem que os investidores estão mais pessimistas em relação ao minério de ferro e à Vale nas últimas
semanas, o que poderia impulsionar ainda mais a revisão dos lucros para baixo. Além disso, nós acreditamos que os investidores também ficarão mais cautelosos com relação aos custos, especialmente para a divisão de minério de ferro”, avalia.

Por outro lado, algumas casas seguem convictas na tese em Vale, apesar dos resultados fracos e expectativa de que as ações repercutem negativamente os números do trimestre.

O BBI manteve sua recomendação outperform (desempenho acima da média, equivalente à compra) para a Vale, seguindo com a visão de que os fundamentos do mercado de minério de ferro devem melhorar nos próximos meses, sustentado pelo aumento da demanda na China e baixos estoques de minério de ferro (principalmente estoques mantidos por siderúrgicas).

“A Vale deve se beneficiar diretamente deste ambiente positivo, com forte geração de fluxo de caixa livre e perspectivas de remuneração dos acionistas”, apontam, destacando também o desconto de 30% em relação aos pares australianos.

O Credit Suisse aponta que, por um lado, continua construtivo em relação ao minério de ferro (preço médio esperado de  US$ 120 a tonelada esperado para o segundo e terceiro trimestres e de U$ 115 no quarto trimestre), apesar da recente queda de preço. Por outro lado, reconhece que os resultados do 1T23 da Vale representam uma queda em relação à sua atual projeção para o ano.

O banco suíço, assim como o BBI, possui recomendação outperform nos ADRs da Vale, acreditando que a mineradora oferece um Free Cash Flow Yield, ou rentabilidade de fluxo de caixa livre atrativo de 12% em 2023. Dentro de sua política de dividendos mínimos, a empresa poderia registrar um dividendo yield, ou dividendo em relação ao preço da ação, de 8% para 2023 (assumindo preços médios de minério de ferro em US$ 115 a tonelada em 2023).

“Além dos dividendos mínimos, a Vale deve continuar a utilizar seus recursos extras de fluxo de caixa para recomprar agressivamente suas ações, dada a recente queda no preço das ações”, apontam os analistas.

O Morgan Stanley é outra instituição a ter recomendação equivalente à compra (overweight, exposição acima da média do mercado) para os ADRs da Vale, com preço-alvo de US$ 19, ou potencial de alta de 37% em relação ao fechamento da véspera.

O banco avalia que o momentum do preço do minério de ferro no 2T23 seguirá apoiando os preços, suportado pela oferta reduzida, melhor sazonalidade da demanda e políticas favoráveis do mercado imobiliário na China. “Vemos uma resolução para o acordo de compensação de Mariana e outras etapas como liberar valor da unidade de metais básicos sendo catalisadores positivos”, avaliam.

A divisão se reflete também na compilação feita pela Refinitiv de casas de análise que cobrem os ADRs da mineradora. De 25 casas que cobrem os ativos da Vale, 14 recomendam compra, 10 manutenção e 1 venda. O preço-alvo médio, por sua vez, é de US$ 18,58, ainda um potencial de alta significativo de 34% em relação ao fechamento da véspera. Assim, apesar de mais um resultado fraco, a divisão sobre os ativos continua.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.