“Vai, tourinho”: Pablo Spyer se diz otimista com a Bolsa, mas teme virada quando EUA cortarem estímulos

Economista se define como "cautelosamente otimista" e minimiza impactos de inflação e BC mais hawkish, enxergando no exterior o maior risco

Ricardo Bomfim

O economista e sócio da Touro Inc, Pablo Spyer (crédito: Divulgação)

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SÃO PAULO – Contratado no início da semana pela XP Inc. para gerir a empresa de educação financeira Touro Inc., o economista Pablo Spyer se diz otimista com o mercado financeiro e acredita que a tendência do Ibovespa é ir além dos 130 mil pontos devido a um ambiente macroeconômico mais favorável.

Esse horizonte positivo deriva, na opinião de Spyer, da valorização das commodities em meio a investimentos disseminados internacionalmente em infraestrutura, da taxa Selic ainda baixa, do avanço da agenda econômica do governo e, por fim, da enorme liquidez global desde que bancos centrais no mundo todo injetaram dinheiro na economia para conter o pânico dos investidores no auge da pandemia de coronavírus.

Por outro lado, o economista diz temer o efeito que uma virada na política monetária dos Estados Unidos pode trazer aos mercados. É por isso que ele considera sua posição atual como “cautelosamente otimista” e atualmente investe em ações de empresas que se beneficiam da reabertura econômica.

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Pablo Spyer vê o ritmo de vacinação como satisfatório e acredita que em breve a economia voltará a ser como era antes das medidas de isolamento social. “A vacinação em massa finalmente chegou ao Brasil e a economia vai se reabrir a qualquer momento.”

Para ele, a inflação que tanto preocupa os investidores atualmente é temporária e deve ser contida pela atuação do Banco Central, que não estaria tão hawkish (favorável a elevar juros para enfrentar a inflação) quanto muitos supõem.

“Acredito que está havendo um equívoco de alguns agentes dos mercados porque o BC não disse que vai subir mais os juros, só que vai subir mais rápido. Uma coisa é levar o juro para 11%, outra é levar para 7% alguns meses antes do que se esperava. Para a migração dos investimentos de renda fixa para a Bolsa não deve fazer muita diferença o ciclo de aperto atual”, defende.

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Ao InfoMoney, Spyer ainda falou sobre sua carreira e seus objetivos na XP, destacando que é questão de tempo para que mais brasileiros comecem a investir em ativos de Bolsa. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:

Como você enxerga a Bolsa hoje? Há oportunidades perto dos 130 mil pontos? Como fazer um bom stock picking nesse patamar?

Sempre existem oportunidades na Bolsa. Não existem momentos em que nada vai render. O nosso objetivo, meu e da XP, é ajudar os investidores a encontrar essas oportunidades.

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Hoje sou um cara otimista com a Bolsa, mas é claro que, dada a globalização mais forte do que era antes, as correlações do mercado financeiro nacional com os demais são maiores. O momento é delicado, pois os EUA são muito relevantes. Saímos de uma crise forte provocada pelo coronavírus, em que se imprimiu muito dinheiro para conter o pânico que se instalou.

Uma das provas mais visíveis das consequências dessa política monetária ultraestimulativa é que tudo o que é criptomoeda valorizou com força. Os investidores estavam cheios de dinheiro na mão e a renda fixa nos países desenvolvidos não compensava. Era um momento único.

Por isso, acho que a Bolsa deve subir sim até o fim do ano, passar dos 130 mil pontos. No entanto, qualquer reviravolta nos Estados Unidos no sentido de aperto de política monetária me deixaria mais cauteloso.

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O que o Federal Reserve faz, atualmente, é comprar um título e sumir com ele. Daí quando alguém vai comprar um título de dívida, o preço dele está muito caro, então o investidor é obrigado a investir na economia real.

O ponto é que se esse cenário virar lá, a Bolsa aqui também pode azedar. Se mudar o patamar de juros nos EUA, o mundo vira. É por isso que quem é investidor sempre tem que escutar os discursos do Powell. O gráfico de pontos do Fed também é importante, porque vai adiantando o momento em que irá se formar a maioria necessária de membros do Fed para subir juros. Eventualmente vai existir essa maioria. É importante estar preparado para quando acontecer.

Na semana passada, o mercado global se estressou porque mais quatro diretores revelaram acreditar que os EUA devem retirar estímulos. Não podemos esperar a taxa de juros ser elevada para reposicionar nossas carteiras. Quando começarem a cortar os US$ 120 bilhões de compras mensais de títulos que o Fed faz,  já vou começar a olhar com lupa o mercado.

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Poderia ser mais específico? Para onde está olhando agora em termos de investimentos?

Na Bolsa brasileira eu estou no play da reabertura econômica. Empresas que se dariam bem com a reabertura econômica posterior às medidas de isolamento social. Isso porque na Europa foram essas companhias que viram suas ações se valorizarem. A vacinação em massa finalmente chegou ao Brasil e a economia vai se reabrir a qualquer momento.

Como você enxerga essas sinalizações mais hawkish do Copom? O aumento da inflação preocupa?

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A inflação aqui é temporária, ela vai voltar para dentro da meta. Acredito que está havendo um equívoco de alguns agentes dos mercados porque o BC não disse que vai subir mais os juros, só que vai subir mais rápido. Uma coisa é levar o juro para 11%, outra é levar para 7% alguns meses antes do que se esperava.

Para a migração dos investimentos de renda fixa para a Bolsa não deve fazer muita diferença o ciclo de aperto atual. Vai continuar vindo investimento desde que os juros não voltem para patamares muito elevados como os que existiam em governos passados.

Além disso, é importante lembrar que a alta de juros não trabalha só no desaquecimento da economia e, consequentemente na contenção da inflação, mas também atrai o capital estrangeiro para cá via operações de carry trade.

Outra questão a ser analisada é que o planeta decidiu investir em infraestrutura. Isso fez com que os preços das commodities disparassem. As commodities em alta pressionam o dólar para baixo, porque os estrangeiros vão pagando para as nossas exportadoras em dólar e enchendo o país de moeda estrangeira, que fica mais barata pela Lei da Oferta e Demanda.

No mais, acredito que o nosso BC tenha um esplêndido corpo técnico, estamos em boas mãos.

Em relação à China, como você vê essas tentativas de frear a disparada nos preços das commodities?

A China ainda tem a cabeça de que é só ela que compra commodities, mas são vários países que fazem isso. Os EUA estão com um plano bilionário de infraestrutura. Se os chineses não intervissem no mercado, o minério poderia estar em um patamar de preço até maior que o atual [acima dos US$ 150 a tonelada].

A China está brigando contra o mundo, mas a realidade mudou. Conforme o mundo reabre, o petróleo sobe e não há nada que o governo chinês possa fazer para impedir isso. No primeiro superciclo das commodities aí sim a China mandava, mas hoje não é assim.

Nós temos visto uma queda forte do dólar em meio ao BC mais hawkish e o Fed mais moderado, você enxerga uma continuidade nesse movimento?

No cenário atual as pressões são no sentido de dólar mais baixo. As commodities são importantes para isso porque os termos de troca estão favoráveis à exportação de produtos de baixo valor agregado. A alta de juros também cumprirá seu papel, pois houve uma saída bruta de capital do Brasil quando a Selic saiu de 14% para 2%.

Nessas condições de juro mais alto atraindo o capital estrangeiro e commodities aquecidas por um mundo investindo em infraestrutura está tudo favorável para o dólar cair. Porém, não podemos nos esquecer de que o câmbio é exposto a muitas variáveis. Não dá para cravar o patamar da moeda no fim do ano.

Em relação à condução macroeconômica do País, acha que estamos indo no caminho certo? Como enxerga a velocidade da vacinação e o encaminhamento da agenda de reformas?

Eu sou otimista. Aconteceu a reforma da Previdência, que era a mãe de todas as reformas do ajuste fiscal. O governo também aprovou a Lei do Saneamento, a Lei das Falências e o marco regulatório do gás.

Acho que estamos fazendo uma lição de casa muito importante. O Brasil está mudando e a condução do Guedes é boa. Demora para que as pessoas percebam, e por pessoas digo mesmo os investidores, o quanto mudamos como país.

Você já disse temer uma mudança na política monetária dos EUA. Disse que os mercados podem virar se ocorrer. Mas do lado doméstico, quais são os principais riscos para a renda variável no curto e médio prazo?

No lado doméstico eu temo uma nova onda mais forte da pandemia, com mais isolamento social, e ânimos mais acirrados na disputa eleitoral. Riscos sempre existem. Temos que ficar de olho nas eleições e na evolução de casos de Covid.

Conte um pouco da sua carreira e por que decidiu ir para a XP.

Sou formado na Florida International University e tenho MBA em mercado de capitais na USP. Eu comecei a trabalhar lá na Ativa Investimentos em 1994, 27 anos atrás. Aí, rapidamente eu já entrei para a mesa de operações e atendia a clientes como o Pactual, então me levavam para o Rio de Janeiro. Já tinha fechado a Bolsa do Rio, mas ainda era forte o mercado financeiro no Leblon.

Depois, voltei para São Paulo e existiam poucos brokers no mercado, então fui contratado pela LAECO. Cheguei a trabalhar no pregão viva-voz, mas como assistente, não como corretor.

Depois disso fui morar fora e montei uma gestora nos EUA. Em 2006, eu tinha o certificado CGA, para ser gestor. Saí da gestora para montar uma corretora em NY, uma full broker dealer. Tirei até o certificado series 24, que é a certificação de principal, para ser diretor estatutário de corretora. Eu era sócio do Guti Vidigal e do Alexandre Hartman. Fiquei cinco anos lá, montei uma asset management e então a corretora coreana Mirae me contratou para trabalhar aqui em São Paulo.

Passei dez anos na Mirae, onde ajudei a estruturar as operações em Bovespa, lançamento da plataforma de home-broker, mesas, segmento BM&F, câmbio e aí resolvi vir para a XP.

Eu sempre fui muito apaixonado pelo mercado financeiro. Eu pedia para meu pai me levar no pregão da B3, enquanto meus amigos iam no PlayCenter. Desde que eu comecei a pensar eu já gostava de Bolsa. Tanto que sempre estudei isso.

De onde veio a ideia de criar o “Touro de Ouro” e o bordão que veio com ele?

Pelo cacoete de Nova York, eu sempre chegava 6h da manhã no escritório na Mirae. Nós tínhamos clientes mais institucionais, então eu vi a oportunidade de fazer algo que agregasse valor. Como sempre fui fã do Jim Cramer, e meu pai [Marcos Wilson] foi um jornalista importante do SBT, que inventou o “Aqui Agora”, resolvi criar um programa de um minuto que fosse um mix do Jim Cramer com o “Aqui Agora”. Quando eu quis montar eu falei com o meu pai para pedir dicas.

Eu, durante cinco fins de semana, assisti a um monte de fitas cassete do programa do SBT e meu pai me ensinou vários segredos, como a câmera nervosa. Os jornais daquela época dos anos 1990 tentavam passar a sensação do ao vivo. E é essa sensação que eu tento passar.

Hoje em dia meu pai comenta os “Minutos do Touro”, ele me dirige. Está envolvido nesse projeto e é fundamental para o sucesso do negócio. Eu não sou um cara do jornalismo, ele é. Ele me deu o “CBS Standards” de padrões jornalísticos para me guiar.

Você esperava a repercussão que teve o seu “minuto do touro”?

Nem sonhava. O que acontece comigo hoje é um sonho de vida. Eu imaginava, quando era criança que eu era apresentador do SBT, mas acabei me tornando operador de Bolsa.

Foi surpreendente porque todo mundo que recebeu o primeiro “Minuto do Touro” no WhatsApp quis receber todo dia. O programa começou a crescer, viralizando primeiro naquela rede social e depois indo para outras mídias, como o Twitter. Bombou no Twitter e aí comecei a postar no LinkedIn e depois no Instagram. Onde eu criava explodia.

Você acha que o sucesso tem a ver com o brasileiro estar mais interessado por finanças hoje? Devido à proliferação de influencers de investimentos e finanças pessoais?

Sem dúvida nenhuma o brasileiro está se interessando mais pelo mercado. E o estilo do Minuto do Touro fez com que as pessoas se interessem mais ainda, ele faz sucesso com os jovens, porque é a tradução de um conteúdo sofisticado de maneira acessível.

Passo a informação sem complicar. O tempo ser curto também ajuda. Eu podia fazer um programa de duas horas, mas existem milhares de morning calls. A maior dificuldade que eu tenho é escolher do que não falar para poder manter o programa curto.

Por isso não faço live, porque a pessoa pode se cansar de mim. Os diretores de TV sempre falam que overexposure (superexposição) é um problema. Quem aparece por muito tempo na mídia todo dia acaba cansando.

O que falta para mais brasileiros investirem mais na Bolsa?

Eu acho que falta é apenas tempo, os investidores estão vindo. A queda da taxa básica de juros foi uma mudança estrutural no país. Não importa que hoje estejamos em um ciclo de alta, foi muito transformadora aquela trajetória da Selic dos 14,25% ao ano para 2% ao ano.

A história da inicialização do investidor brasileiro, para mim, começou com a fundação da XP, que tem um DNA de educação e é uma das maiores responsáveis pelo Brasil ter 4 milhões de CPFs cadastrados na Bolsa hoje. A XP ajudou a mudar essa cultura do brasileiro de só investir na Poupança. Há outros investimentos seguros que rendem mais do que a Poupança.

O que faltava antigamente eram pessoas que falavam a linguagem da população geral. O médico tem plenas condições de saber que se ele comprou a ação e está subindo ele ganha dinheiro. A nossa missão vai ser trazer o conhecimento um pouco mais abrangente e necessário paras as pessoas. O tempo está correndo e mais investidores vêm pelo juro mais baixo.

Mesmo com a Selic a 6%, 7% ou 8%, com uma boa educação financeira, as pessoas vão diversificar seus investimentos.

Hoje, a XP Inc. tem o objetivo de educar financeiramente 50 milhões de brasileiros. Lançamos a Touro Inc., empresa de educação financeira na qual eu tenho metade do capital e a XP a outra metade, para contribuir nessa mudança estrutural do Brasil. A XP revolucionou o mercado na última década e os investidores são gratos. Entendi que só aqui eu conseguiria maximizar o meu sonho.

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.