“Too big to fail” ou “too big”? A tese de que crise estava no tamanho das instituições

Cresce visão de que gigantes como Citigroup e BofA deveriam ser fragmentados; mas o que será do setor após reformulação?

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SÃO PAULO – Mais que prejuízos, o colapso do sistema financeiro norte-americano deixou importantes lições a investidores, analistas e governantes. Uma delas, a de que esforços não devem ser poupados para salvar instituições muito grandes da falência: as que são “too big to fail”, na expressão em inglês usada por lá.

De fato, esforços não foram poupados – e nem recursos. O governo norte-americano atuou de forma incisiva no auge da crise para salvar instituições como Bank of America, Citigroup e Wells Fargo de um revés como o do Lehman Brothers.

A importância de tal prontidão por parte do governo é consenso. Sem a ajuda prestada, a crise teria tomado proporções ainda mais desastrosas. Mas passado o auge das turbulências, a grande questão é como conduzir a reforma no sistema financeiro do país.

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Simplesmente muito grandes

Em entrevista concedida em outubro passado, Alan Greenspan foi um dos primeiros a abordar o tema do “too big to fail”. “Se as instituições eram muito grandes para falirem, então elas eram simplesmente muito grandes”, afirmou. O argumento do ex-presidente do Fed – e de muitos outros – é simples: nunca se deveria ter deixado que as instituições financeiras tomassem a escala que tomaram.

Os números impressionam. Em 1990, estima-se que as dez maiores instituições financeiras dos EUA controlavam 10% do total de ativos do país. Em 2008, a porcentagem era de mais de 60%. Em setembro deste ano, o Goldman Sachs detinha quase US$ 900 bilhões em ativos. Dez anos atrás, o montante era de US$ 200 bilhões. O Lehman Brothers trilhou trajetória semelhante: em 1998, seus ativos somavam US$ 191 bilhões. Em maio do ano passado, meses antes de quebrar, a firma detinha US$ 640 bilhões.

O ditado “é melhor prevenir do que remediar” parece feito sob medida. Nenhum analista defende que o governo dos EUA deveria ter assistido imóvel ao colapso dos bancos, mas o ideal teria sido impedir que estas instituições tivessem crescido a tais proporções; proporções estas que colocaram todo o setor em risco.

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A fragmentação do Citi

Tarde demais? Talvez para esta crise, mas não para uma eventual próxima. Embora seja “filosoficamente contra”, Alan Greenspan defendeu a fragmentação das instituições financeiras muito grandes, “porque algo deve ser feito para lidar com a situação”. Algo neste sentido já vem sendo feito com o Citigroup, uma espécie de experimento em laboratório para o que pode vir a ser feito com outros bancos.

Em setembro de 2007, a companhia detinha ativos em um impressionante valor total de US$ 2,4 trilhões. No mesmo mês deste ano, o montante havia caído para US$ 1,9 trilhão. Controlado em cerca de 30% pelo governo norte-americano, o banco vem aos poucos se desfazendo de diversas unidades e segmentos de operação.

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Na última quinta-feira, o Citigroup anunciou planos de um IPO (Initial Public Offering) de uma de suas muitas unidades de seguros, a Primerica. Pequenos bancos na Alemanha e em Porto Rico foram vendidos pela instituição, além de diversos outros negócios no Japão, Índia e Brasil. No entanto, o caminho é longo.

Simon Johnson, ex-economista chefe do FMI (Fundo Monetário Internacional) defende que nenhuma instituição financeira deveria controlar mais de US$ 100 bilhões em ativos, um montante ínfimo comparado ao ainda detido pelo Citigroup, de forma que medidas alternativas também vêm sendo estudadas por analistas e economistas.

Atividades comerciais x corretagem

Recentemente, ganha força a possibilidade de que o Congresso norte-americano estude a aprovação do “Ato Glass-Steagall”. Formulada na época da Crise de 1929, a lei proibia que bancos comerciais atuem também com corretagem e investimentos.

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A medida afetaria diversas instituições do país, como o Bank of America, tido como o próximo candidato a passar por uma intensa fragmentação como a que vem sendo implementada no Citigroup. Isto porque a firma adquiriu no auge da crise a Merrill Lynch, conhecida justamente por suas atividades de risco no mercado de capitais.

O JPMorgan Chase é outro banco que pode vir a ser afetado pelo retorno da lei, uma vez que mantém diversos bancos regionais de perfil comercial ao redor do mundo concomitantemente a uma grande atuação no mercado de derivativos.

No Reino Unido, o debate se concentra em torno da concessão de recursos por parte do governo a instituições que atuam como players em segmentos de alto risco. “Qualquer um que propusesse a concessão de recursos do governo a instituições ameaçadas pela crise e depois sugerisse que tais recursos devessem ser aplicados em atividades especulativas seria hostilizado. Mas é exatamente isso que estamos fazendo”, afirmou Mervyn King, presidente do Bank of England.

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O outro lado da moeda

Outra medida citada seria limitar, ou até mesmo proibir, que instituições financeiras investissem seu próprio capital em aplicações diversas, além da imposição de limites também quanto a participação de tais firmas no mercado de derivativos.

Seja qual for o rumo a ser tomado nos próximos meses pelas autoridades nos EUA e na Europa, parece altamente improvável que o setor financeiro permaneça o mesmo. Isto pode significar menos e menores crises no futuro. Mas no mercado, nada é tão simples e consensual.

Se por um lado a reformulação do sistema trará mais segurança e estabilidade, por outro reduzirá as exorbitantes taxas de rentabilidade e lucro com que o setor estava acostumado a contabilizar ano após ano. Não à toa, analistas já começam a chamar o setor financeiro norte-americano de “o próximo setor de energia”: mais previsível, mas com baixo potencial de crescimento.